Uma missão hercúlea e importantíssima diante da maior tragédia climática do Brasil. Foi com esse cenário em mente que o então ministro-chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência (Secom), Paulo Pimenta, disse "sim" à missão dada por Lula na última terça-feira (14) para reconstruir 461 dos 497 municípios do Rio Grande do Sul e grande parte da infraestrutura do estado.
Deputado mais votado do PT pelos gaúchos nas últimas quatro eleições, Pimenta sabe, no entanto, que o desafio dado por Lula vai muito além de devolver a dignidade às mais de 2,2 milhões de pessoas afetadas pela tragédia - cerca de 20% da população do estado.
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Para reconstruir estradas, cidades inteiras e fazer com que o auxílio de R$ 5,1 mil chegue às milhares de famílias afetadas pelas inundações, o agora ministro-chefe da Secretaria Extraordinária da Presidência para Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul terá que superar a fúria do governador Eduardo Leite (PSDB), a desinformação propagada pela horda comandada por Jair Bolsonaro (PL) e o rancor da mídia liberal, que nutre aversão por ele desde os tempos da Lava Jato.
Adepto da cartilha neoliberal e negacionista climático, Eduardo Leite emergiu na política gaúcha com a bandeira de derrubada do Muro da Mauá, construção de 2,6 quilômetros de comprimento erguida nos anos 1970 que faz parte do sistema antienchente que protege Porto Alegre das cheias do rio Guaíba. A estrutura ainda agrega diques, comportas e bombas d'água, sucateadas nos últimos anos.
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"O governador se tornou propagandista da queda do muro. Tem vídeos circulando lembrando essa atitude dele. A palavra do governador tem influência na conduta das pessoas, da máquina pública e da própria especulação imobiliária, que é muita intensa e sempre olhou o muro de forma antipática", disse à Fórum Tarso Genro, ex-governador e ex-prefeito de Porto Alegre por dois mandatos.
Ministro da Justiça, de Relações Institucionais e da Educação nos dois primeiros mandatos de Lula, Genro ressalta que o neoliberalismo radical de Leite e de seu antecessor, o também tucano Nelson Marchezan Júnior, é amparado por grandes empresários com interesses imobiliários na capital gaúcha, entre eles membros da família Sirotsky, dona do grupo Rede Brasil Sul, a RBS, maior conglomerado regional de mídia do Brasil e afiliada da Globo.
"[Leite] é um neoliberal radical. E ele aparece fazendo a campanha pela queda do muro. E ele vem com o apoio das grandes redes de comunicação da cidade", disse o ex-governador petista.
Desespero
O negacionismo e o radicalismo neoliberal de Leite fez com que ele entrasse em desespero quando a tragédia climática atingiu o estado.
Na segunda viagem ao Estado após o início das inundações, que começaram no fim de abril, Lula teve que acalmar Leite. Desnorteado, dias antes o governador implorava nas redes sociais por apoio do governo federal.
Ao se desculpar pelas postagens, o tucano foi acolhido pelo presidente. “Aí o Lula pegou no rosto dele e disse assim: ‘Você não precisa me explicar. Não se preocupe. Se tem uma coisa que eu sei fazer é ler as pessoas’. E o Leite se emocionou e ficou com os olhos cheios de lágrimas", contou a jornalista da Globo, Natuza Nery.
Diante de um Eduardo Leite praticamente inerte diante da tragédia e da avalanche de fake news da horda de bolsonaristas - atrapalhando inclusive as ações de resgate -, Lula decidiu que teria que montar uma estrutura federal no Rio Grande do Sul com uma pessoa de extrema confiança à frente.
Paulo Pimenta foi o escolhido por uma série de motivos. Além da amizade de décadas, o ministro mantém uma convivência diária com Lula, dentro do Palácio do Planalto desde o início do terceiro mandato.
Gaúcho de Santa Maria, o ministro conhece como poucos o estado e tem, agora, a oportunidade de se aproximar de prefeitos, de autoridades e da população.
Além da vitrine para uma candidatura ao governo do estado em 2026 - algo já conhecido antes da tragédia -, Pimenta é jornalista e foi incumbido de estruturar ações de comunicação para minimizar a rede de fake news comandada por Eduardo Bolsonaro (PL) e Pablo Marçal.
O ministro ainda tem como desafio enfrentar o conluio da Globo e mídia corporativa em torno da narrativa neoliberal de Eduardo Leite, que chegou a reclamar do volume de doações causando, segundo ele, "impacto no comércio local".
Modelos de governo
Com Paulo Pimenta à frente do ministério, Lula vai priorizar as ações que causam impacto na vida das pessoas - como a construção gratuita de casas para quem perdeu tudo.
Ao apontar em entrevista a negligência de "pessoas" com as comportas - que fazem parte do sistema antienchente da capital gaúcha -, o presidente sinalizou ainda que vai confrontar os modelos de gestão pública.
Lula quer mostrar a diferença de um governo mais voltado às ações e projetos sociais, com foco nas pessoas, que atua com embasamento científico, com o modelo neoliberal defendido por Leite, Bolsonaro e a mídia liberal, que prioriza os interesses do sistema financeiro e propaga - ou disfarça - o negacionismo climático em prol dos interesses dos endinheirados.
Eduardo Leite, que tentava driblar a "politização" da tragédia com o apoio da mídia liberal, não disfarçou o descontentamento durante o ato de anúncio do novo ministério com Paulo Pimenta e com o discurso de Lula que, na ocasião, lembrou o governador que a prevenção sairia mais barato do que a reconstrução de tudo o que foi causado pela tragédia.
O incômodo se estendeu à mídia liberal. Na GloboNews, as jornalistas Daniela Lima e Ana Flor gastaram um bloco inteiro para "analisar" a cor da jaqueta, vermelha, que Pimenta utilizou na cerimônia.
"Poderia ter usado um tom neutro, um tom que remetesse à Defesa Civil, como faz o governador Eduardo Leite, que está com uma cara de poucos amigos e em nenhum momento aplaude [...] estava lá [Paulo Pimenta] com a partidária, com a cor do PT", disse Daniela Lima.
Antes disso, por volta das 8h, quando Lula e a comitiva embarcavam para o sul, Leite vazou para a Folha seu descontentamento, reclamando que foi avisado "pela imprensa" sobre o ministério em solo gaúcho.
A informação, no entanto, já era conhecida na noite anterior, quando Lauro Jardim divulgou uma coluna no jornal O Globo em que diz que "Lula usa tragédia gaúcha para se livrar de Pimenta na Secom".
O texto canalha, sem fontes, diz de forma baixa, vil, que Lula "inventou um cargo para Pimenta e o tirou da Secom" em meio à maior tragédia climática que já atingiu o país.
Em editorial na quinta-feira (16), a Folha diz que Lula "contaminou a tarefa de lidar com a tragédia climática do Rio Grande do Sul, já complexa ao extremo, com um lance de oportunismo político rasteiro" e condenou o "ato político", referindo-se ao anúncio de Pimenta, em que o presidente disse que "ainda pretende disputar 'umas dez eleições'".
No mesmo texto, o jornal da família Frias ainda afirma que "para dizer a que veio, a nova pasta do primeiro escalão brasiliense deveria projetos da reconstrução — vale dizer, diretrizes e normas que deem conta de recuperar o Rio Grande do Sul em bases que mitiguem riscos de desastres naturais e que repensem partes da economia e do território".
Ou seja, que Lula deve fazer urgentemente tudo o que Leite e os governos neoliberais não fizeram — ou destruíram — nos últimos anos com o apoio da mídia liberal.
A tragédia é política
Perdido em meio à tragédia após se gabar por anos de querer derrubar o muro de contenção das águas do Guaíba para privatizar a região das docas, Leite sabe que Pimenta representa uma ameaça real ao projeto neoliberal levado a cabo pelo PSDB no estado desde 2015.
Nesta sexta-feira (17), Leite anunciou a criação de uma secretaria específica para reconstrução do estado - aos moldes do ministério de Lula - e, pasme, de um comitê estadual para mudanças climáticas.
O anúncio acontece cinco anos após o governador "passar a boiada" e modificar 480 normas ambientais, permitindo uso de áreas de preservação e afrouxando a fiscalização sobre atividades com alto poder de degradação.
Como braço de Lula, Pimenta terá contato direto com as prefeituras e a população gaúcha, além de acompanhar de perto toda destinação ao montante bilionário para reconstruir toda a infraestrutura do estado.
Caso seja bem sucedido e "apareça" mais que Leite, Pimenta pode levar novamente o projeto do PT ao Palácio do Piratini, dando continuidade ao trabalho de Tarso Genro e Olívio Dutra.
Globo e Folha sabem disso. E por isso voltarão suas artilharias contra ele, mesmo em meio à maior tragédia climática já vivida no Brasil.
Leite entendeu que a tragédia é política. E será tratada como tal por Lula e Paulo Pimenta.
Basta saber até onde o governador gaúcho contará com o conluio e a falta de escrúpulos de Globo, Folha e da horda bolsonarista na guerra da informação.
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