CORRUPÇÃO

Lava Jato: Gabriela Hardt, substituta de Moro, é julgada no CNJ por aval a Fundação Dallagnol

Apresentada por Gleisi Hoffmann, a reclamação disciplinar aponta conluio entre MPF e Petrobras; fundo privado receberia dinheiro público

Dallagnol era procurador-chefe da Lava Jato quando Gabriela Hardt era juíza na 13ª Vara de Curitiba.
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O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) retoma, nesta terça-feira (5), o julgamento de uma reclamação disciplinar contra a juíza Gabriela Hardt, substituta de Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba, responsável pelos processos da Operação Lava Jato. Segundo a ação, houve suposto conluio na homologação do chamado "fundo da Lava Jato" – ou Fundação Dallagnol.

A análise da questão de ordem da reclamação teve início em 20 de fevereiro. Contudo, um pedido de vista do conselheiro Caputo Bastos acabou por suspender a sessão. De relatoria do ministro Luis Felipe Salomão, a apuração deve ser pauta da 2ª Sessão Ordinária do CNJ no ano, nesta terça-feira.

No ano passado, Gabriela Hardt foi transferida para a 3ª Turma Recursal do Paraná e, assim, deixou a 13ª Vara Federal de Curitiba, onde atuou desde 2018 como substituta do ex-juiz e senador Sergio Moro (União Brasil-PR). 

Entenda o caso

O caso foca no documento assinado pelo Ministério Público Federal (MPF) de Curitiba, pela Petrobras e pelo Departamento de Justiça estadunidense, em janeiro de 2019. Gabriela Hardt homologou acordos de que previa a criação do fundo, administrado pelos procuradores da Lava Jato, chefiados por Deltan Dallagnol, com dinheiro da estatal.

A proposta estipulava o depósito de R$ 2,5 bilhões, referentes à acordos de leniência e delação premiada firmadas pela Petrobras com autoridades do Estados Unidos, no fundo. Na época, a então juíza substituta, da força-tarefa da Lava Jato em Curitiba, decidiu pela suspensão do acordo após repercussão negativa sobre o fundo.

Em março daquele ano, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu o acordo, determinou o bloqueio dos valores depositados na conta da 13ª Vara Federal de Curitiba e intimou os envolvidos para prestarem esclarecimentos.

Para o magistrado, a execução e fiscalização do cumprimento de obrigações assumidas pela Petrobras no exterior não correspondem às obrigações estabelecidas aos membros do MPF.

"Importante destacar, ainda, que os termos do acordo realizado entre a Petrobras e o governo norte-americano, além de não indicarem os órgãos do MPF/PR como sendo as ‘autoridades brasileiras’ destinatárias do pagamento da multa, igualmente jamais indicaram a obrigatoriedade ou mesmo a necessidade do depósito dos valores ser realizado perante a 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba", apontou.

Em 2019, a deputada federal Gleisi Hoffmann (PT-PR) apresentou a reclamação contra Gabriela Hardt, alegando que a juíza cometeu infração disciplinar ao atuar fora de sua competência com a homologação de um acordo cível

A presidente do PT, junto de outros parlamentares, pede ao CNJ pela "declaração de ilegalidade da conduta da magistrada", bem como a aplicação de sanções como advertência, censura e aposentadoria compulsória.

Na época, a reclamação foi arquivada pelo ministro Humberto Martins, com a formação de maioria no CNJ pela manutenção da decisão. No entanto, o corregedor nacional de Justiça, Luis Felipe Salomão, levantou questão de ordem pedindo que o caso não fosse arquivado até a divulgação dos resultados da correição extraordinária feita na 13ª Vara de Curitiba. 

Segundo ele, há novos elementos na homologação do acordo, porém, o resultado ainda não foi divulgado e disponibilizado aos demais integrantes do conselho. Embora não tenha esmiuçado a correição, Salomão sugeriu que há evidências de "irregularidades" na homologação do acordo entre o MPF e a Petrobras.

"Os tópicos apresentados até aqui indicam uma proatividade do juízo no direcionamento de valores antes mesmo do trânsito em julgado. As circunstâncias que explicam essa celeridade foram expostas pela própria magistrada durante uma audiência para a tomada de seu depoimento", relatou.

Salomão indicou que, dias antes da assinatura da homologação, Gabriela Hardt foi procurada por integrantes da força-tarefa da Lava Jato do Paraná para discutir informalmente detalhes do acordo, recebido com antecedência.

De acordo com o corregedor, o caso é relevante porque envolve a destinação de verba pública para a criação de uma fundação privada. "Não parece razoável que, a pretexto de combater a corrupção, se pratique a corrupção. Não parece razoável que, sem uma apuração adequada, possamos dizer com tranquilidade: isso aqui (a reclamação) está sendo arquivado porque não tem nada", manifestou.

Outro julgamento

Gabriela Hardt também é acusada por outra conduta fora de suas competências legais enquanto conduzia os processos originados na Operação Lava Jato, isto é, uma irregularidade no exercício de sua função pública.

A denúncia partiu do empresário Tony Garcia, que diz ter avisado Gabriela sobre ações ilegais levadas a cabo por Sergio Moro e pelos integrantes da força-tarefa da Lava Jato do MPF, chefiada no período pelo então procurador Deltan Dallagnol. Segundo Garcia, a juíza simplesmente ignorou a acusação e não fez nada em relação aos crimes levados ao conhecimento dela por ele.

A denúncia aponta que Gabriela “manteve-se inerte no depoimento de março de 2021, no qual Tony Garcia relatou supostos fatos potencialmente criminosos” praticados por Moro e pelo pessoal da MPF. No ano seguinte, a juíza se declarou suspeita e pediu para sair de todos os casos envolvendo o empresário paranaense pelo fato de ter protocolado contra ele, no MPF, uma queixa de crimes contra a honra.

Ainda não há qualquer decisão do CNJ com relação ao processo de Gabriela Hardt e, em caso de condenação, as penas podem ir de simples advertências até a aposentadoria compulsória, que obriga o magistrado a deixar a função imediatamente, embora mantenha seus vencimentos na íntegra.