Citado pelo ex-comandante do Exército, general Marco Antonio Freire Gomes, como autor da interpretação do Artigo 142 da Constituição que deu álibi para Jair Bolsonaro (PL) arquitetar um golpe de Estado, o jurista Ives Gandra Martins desconstruiu a tese usada para pressionar militares da cúpula das Forças Armadas.
Na oitiva, Freire Gomes afirmou que nas reuniões que teve com o ex-presidente "eram expostas as interpretações do jurista Ives Gandra Martins de utilização das Forças Armadas como Poder Moderador, com base no art. 142 da Constituição Federal".
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Ao expor nessas reuniões que "não havia possibilidade de utilização do referido art. 142 da CF para emprego das Forças Armadas", Freire Gomes diz que "passou a receber ataques à sua honra e à de sua família".
Gandra também foi citado no diálogo do coronel reformado Laercio Vergílio com Ailton Barros, capitão expulso do Exército.
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Ao esclarecer a troca de mensagens à PF, o coronel "esclarece que a chamada operação especial seria uma fase posterior e que tudo deveria ser realizado dentro da lei e da ordem embasado juridicamente com base na Constituição Federal, principalmente com os argumentos apresentados pelo jurista Ives Gandra Martins".
Em entrevista à Folha de S.Paulo, publicada na edição deste sábado (16) Gandra Martins disse que a interpretação usada por Bolsonaro e aliados é de 1997 e que não prega qualquer "ruptura institucional".
"Minha interpretação é que, se um dia houver um conflito entre Poderes e um Poder pedir às Forças Armadas, nesse caso poderia, para aquele ponto concreto, específico, exclusivo, jamais para desconstituir Poderes, decidir. E eu dizia que era hipótese que nunca aconteceria", explicou o jurista, que atuou como professor emérito da Escola de Comando do Estado-Maior do Exército por mais de 30 anos.
"A minha interpretação está claríssima, onde eu sempre disse que não poderia desconstituir Poderes. Claramente jamais numa Constituição democrática se admitiria a ruptura institucional", emendou, colocando um ponto final no álibi bolsonarista para o golpe.
Ruptura institucional
Em seu depoimento, o ex-comandante da Força Aérea Brasileira (FAB), Carlos Almeida Baptista Junior, disse à PF que havia alertado Bolsonaro de que não houve fraude nas eleições, segundo relatório feito pelos próprios militares.
Em seguida, o ex-comandante da Aeronáutica disse ainda que deixou claro ao ex-presidente que não apoiaria, em qualquer hipótese, uma "ruptura institucional", termo usado pelos golpistas baseado na interpretação torta de Gandra Martins.
Em outra reunião dos comandantes das Forças com o então Presidente da República, o depoente deixou evidente a Jair Bolsonaro que não haveria qualquer hipótese do então presidente permanecer no poder após o término do seu mandato. Que deixou claro ao então presidente Jair Bolsonaro que não aceitaria qualquer tentativa de ruptura institucional para mantê-lo no poder", afirmou.
A declaração foi confirmada por Freire Gomes em oitiva à PF dias após o depoimento do colega da FAB.
"Que confirma que o conteúdo da minuta de decreto apresentada foi exposto ao declarante nas referidas reuniões. Que ressalta que deixou evidenciado a Bolsonaro e ao ministro da Defesa [general Paulo Sérgio Nogueira] que o Exército não aceitaria qualquer ato de ruptura institucional", disse o general.
À PF, Baptista Júnior também relatou a reação de Bolsonaro diante da posição dos dois comandantes, contrários ao golpe. "O ex-presidente ficava assustado", disse.