O tenente-coronel Mauro Cesar Barbosa Cid, que foi chefe da Ajudância de Ordens do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), carregava em seu celular pessoal teses “acadêmicas” e vídeos do jurista de extrema direita Ives Gandra Martins, nas quais ele defende o papel de “poder moderador” das Forças Armadas, que poderiam intervir no regime democrático brasileiro por meio de uma interpretação esdrúxula do artigo 142 da Constituição Federal, o que é ampla e irrestritamente refutado pelo mundo jurídico.
Um dos arquivos presentes no aparelho telefônico de Cid é uma espécie de “entrevista” por escrito submetida pelo major Fabiano da Silva Carvalho, do Exército, a Ives Gandra Martins, com nove perguntas sobre a possibilidade de as Forças Armadas serem empregadas “na garantia dos poderes constitucionais em situação de normalidade”. O documento seria da época que o major cursava o 2º ano do curso de Comando e Estado Maior do Exército.
As questões formuladas são claramente voltadas a conseguir uma declaração de que os militares poderiam intervir na democracia brasileira a seu bel prazer. Gandra responde com atenção, procura dar um ar sofisticado às explicações, e em muitos trechos dá sua opinião ultraconservadora de que generais podem atuar como uma espécie de “poder moderador” no país.
Já um outro arquivo, datado de 25 de outubro de 2022, cinco dias antes da derrota de Bolsonaro no segundo turno das eleições, que também estava no celular de Cid, leva o título “Forças Armadas como Poder Moderador”. O teor do documento está relacionado, mais uma vez, às teses reacionárias do jurista octogenário de extrema direita, falando de “ideias” e “fundamentos” de Ives Gandra em relação ao tema.
Ainda foram encontrados dois vídeos no celular do tenente-coronel, que era o mais próximo auxiliar do ex-presidente, nos quais Ives Gandra fala sobre sua interpretação “peculiar” do artigo 142 da Constituição Federal, que segundo ele permitiria a intervenção de militares sobre os poderes da República.
Ives Gandra da Silva Martins, de 88 anos, é um jurista de orientações reacionárias e membro integrante da prelazia católica ultraconservadora Opus Dei. Ele assinou um parecer “técnico”, em 2015, no qual defendia a existência de motivos para o “impeachment” da então presidenta Dilma Rousseff (PT), a pedido de um advogado que trabalhava para o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), numa clara manobra política golpista que resultou na remoção do poder da primeira mulher que chegou à chefia do Estado brasileiro.