O relatório final da Polícia Federal sobre a tentativa de golpe de Estado em 2022 expõe como a organização criminosa tentou romper a hierarquia nas Forças Armadas para viabilizar sua empreitada. A investigação detalha que, embora os comandantes do Exército, general Freire Gomes, e da Aeronáutica, tenente-brigadeiro Baptista Júnior, tenham resistido ao plano golpista, ambos permaneceram em silêncio, não denunciando as movimentações mesmo após tomarem ciência das articulações.
De acordo com o relatório, as ações para subverter o Alto Comando incluíram reuniões clandestinas e campanhas de desinformação direcionadas a enfraquecer os líderes que rejeitavam o plano. No entanto, os detalhes mais reveladores estão associados ao documento chamado “Punhal verde-amarelo”, elaborado no Palácio do Planalto, que apresentava estratégias de coação e até operações extremas, como a prisão e execução de figuras públicas. Esse planejamento foi apresentado a Jair Bolsonaro e ao general Braga Netto, figura central na articulação do golpe.
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Entre as ações descritas, destaca-se o uso de oficiais subordinados para pressionar diretamente o general Freire Gomes. Reuniões organizadas em Brasília, como a de 28 de novembro de 2022, tinham como foco alinhar oficiais das Forças Especiais para influenciar e cooptar o comando do Exército. Mensagens analisadas mostram que oficiais consideravam necessário “estabelecer uma relação de confiança entre Freire Gomes e Jair Bolsonaro” para que o Exército adotasse uma postura alinhada ao golpe.
“Reunir alguns FE [Forças Especiais] em funções chaves para termos uma conversa sobre como podemos influenciar nossos chefes. Para isso vamos fazer uma reunião em BSB [Brasília]”, escreveu um dos oficiais, segundo o relatório. Essa reunião ocorreu em 28 de novembro de 2022, e tinha como objetivo pressionar o alto comando a aceitar o plano golpista.
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Outro ponto destacado no documento é o uso de desinformação para enfraquecer a posição de comandantes contrários ao golpe. Redes de apoio digital ligadas à organização criminosa foram mobilizadas para atacar Freire Gomes e o tenente-brigadeiro Baptista Júnior, comandante da Aeronáutica, tachando-os de "traidores da pátria" e "alinhados ao comunismo". Em contraste, o almirante Garnier, comandante da Marinha, foi exaltado publicamente, já que teria demonstrado apoio ao plano.
O relatório ainda menciona a elaboração de um manifesto, chamado "Carta ao Comandante do Exército", assinado por oficiais superiores, que buscava persuadir Freire Gomes a adotar uma postura favorável à intervenção. O texto foi amplamente divulgado, tanto nas Forças Armadas quanto em redes digitais, como parte de uma campanha para criar a falsa percepção de apoio institucional ao golpe.
Apesar de resistirem às pressões, tanto Freire Gomes quanto Baptista Júnior permaneceram omissos em relação ao que presenciaram. Documentos da investigação apontam que ambos tinham conhecimento do planejamento golpista, mas escolheram não relatar as movimentações às autoridades competentes. Essa postura contrasta com a atuação de outros militares que se alinharam ao golpe, como o almirante Garnier, comandante da Marinha, que aderiu abertamente à tentativa de ruptura.
O silêncio dos comandantes do Exército e da Aeronáutica foi estratégico, mas colocou em evidência uma fragilidade institucional: a ausência de uma denúncia formal permitiu que o núcleo golpista seguisse articulando seus planos, intensificando campanhas de desinformação e mobilizações em frente a quartéis.
O relatório conclui que, embora a resistência de Freire Gomes e Baptista Júnior tenha sido crucial para o fracasso do golpe, a ausência de uma denúncia pública ou formalização da intentona impediu que o movimento fosse desarticulado de forma mais eficiente. Esse comportamento levanta questionamentos sobre o papel das lideranças militares no enfrentamento de ameaças à democracia.