Após quatro anos de ataques vindos do poder Executivo sob o comando de Jair Bolsonaro (PL), a trincheira da guerra aberta da extrema-direita contra o Supremo Tribunal Federal mudou e agora os ataques estão sendo coordenados por aliados do ex-presidente que dominam pautas conservadores e retrógradas no Congresso Nacional.
A guerra anunciada pelo ex-ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho (PL-RN) na terça-feira (26), quando o senador anunciou que parlamentares oposicionistas vão obstruir as votações na casa em protesto contra decisões recentes do Supremo foi levado a cabo nesta quarta-feira (27) com a aprovação do PL do Marco Temporal e encontrou eco na Câmara dos Deputados.
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Além da descriminalização do aborto até 12 semanas de gestação, os parlamentares citam a possível descriminalização da maconha, a inconstitucionalidade do marco temporal e contribuição sindical como motivadores para a obstrução.
"Vamos nos posicionar obstruindo a pauta de votação no âmbito do Senado, como uma demonstração da nossa insatisfação pela forma como a relação entre os poderes vem sendo abalada. Nós afirmamos que há uma interferência por parte do Judiciário em ações que são de alvitre, de competência do Legislativo e esses quatro temas importantes exemplificam isso", disse Marinho em entrevista coletiva no salão Azul do Senado na terça.
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Nesta quarta, sob a relatoria de Marcos Rogério (PL-AP), um dos soldados de Bolsonaro na antiga CPI da Covid, o PL 2903/2023, que prevê a adoção do marco temporal como parâmetro para a demarcação de terras indígenas no Brasil, foi colocada em votação à toque de caixa, passou pela Comissão de Constituição e Justiça e foi aprovada em regime de urgência no plenário, com votos de senadores da base do governo, como Renan Calheiros (MDB-AL) e Weverton (PDT-MA).
Investigado por conspiração golpista junto com Bolsonaro, o senador Marcos do Val (Podemos-ES) foi um dos muitos parlamentares que usou a votação do Marco Temporal para disparar contra o STF.
"Quem legisla, quem discute sobre qualquer projeto, sobre qualquer lei é aqui, o Congresso. E a população brasileira, independentemente de ideologia ou posicionamento político, vem se preocupando com questões sensíveis, como a preservação da Constituição, da independência dos Poderes e do papel desta Casa diante das recentes decisões do Supremo Tribunal Federal, decisões que impactam a vida em sociedade, a livre iniciativa e as funções deste Parlamento", disparou Do Val.
Presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) minimizou o levante da extrema-direita contra o STF e classificou como "natural" a votação do PL uma semana após a suprema corte definir poela inconstitucionalidade do Marco Temporal por 9 votos a 2 - os dois contrários dos bolsonaristas Kássio Nunes Marques e André Mendonça.
Ecos na Câmara
O levante no Senado encontrou, horas depois, eco na Câmara dos Deputados. Liderados pelo PL, de Bolsonaro, e pelo partido Novo, um grupo de deputados, que lideram 22 bancadas, fizeram um ato de repúdio contra a atuação do Supremo Tribunal Federal e, a exemplo dos colegas, anunciaram a obstrução de votações na maior casa legislativa.
“A obstrução pode ser feita por partido político. O PL está em obstrução, o Novo também. Os demais partidos estão no governo, mas esse movimento é suprapartidário. E vai ter que acontecer uma solução política”, anunciou o líder do PL, Altineu Cortês (PL-RJ).
A guerra dos bolsonaristas contra o judiciário ganhou força e a adesão dos ruralistas com a decisão sobre a inconstitucionalidade do marco temporal.
Coordenador da bancada ruralista, o deputado Pedro Lupion (PP-PR) fez eco ao discurso de Marinho. “Não aceitamos interferência no Poder Legislativo. Ontem não tivemos deliberação, hoje não temos e amanhã não teremos. Isso é uma obstrução. Estamos dando um basta a esse completo e indesejável desmonte do Legislativo”, disse durante o levante na Cãmara.
O movimento contra o STF na casa ainda tem como líderes o deputado Alberto Fraga (PL-DF), amigo de longa data de Bolsonaro; e Eros Biondini, que comanda a bancada Católica e um dos mais reacionários na chamada "pauta de costumes".
“A sociedade brasileira tem acompanhado indignada e estarrecida as movimentações na direção de aprovar o aborto e de aprovar as drogas", vociferou Biondini.
O levante na Câmara ganhou a adesão de 22 frentes parlamentares, que controlam boa parte das pautas polêmicas da Câmara. São elas:
- da Agropecuária;
- da Segurança Pública;
- em Defesa da Vida e da Família;
- dos CACS (caçadores, atiradores e colecionadores);
- Contra as Drogas;
- Evangélica;
- Católica;
- em Defesa de Educação Sem Doutrinação Ideológica;
- Produtores de Leite;
- pela Defesa das Prerrogativas;
- de Defesa das Pessoas com Deficiência;
- do Livre Mercado;
- do Comércio e Serviço;
- do Biodiesel;
- do Brasil Competitivo;
- do Cooperativismo;
- dos Rodeios e Vaquejadas;
- do Semiárido;
- Mista Contra o Aborto em Defesa da Vida;
- das Comunidades Terapêuticas;
- Evangélica do Senado; e
- do Empreendedorismo.