VENDE-SE UM PAÍS

Campos Neto quer privatizar reservas do Brasil, e a BlackRock quer comprar

Cobiça do megafundo de investimentos foi fortalecida com a eleição de Bolsonaro em 2018. Na Ucrânia, eles já privatizaram tudo.

Roberto Campos NetoCréditos: Raphael Ribeiro/BCB
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Nesta quinta-feira (21), uma entrevista do presidente do Banco Central do Brasil, Roberto Campos Neto, passou sob o radar do debate público: o homem da taxa de juros afirmou que pretende "terceirizar" a gestão das reservas do Brasil, atualmente sob controle do BC, para a iniciativa privada.

Os mais de R$ 380 bilhões de dólares em reservas comandados pelo governo brasileiro seriam entregues para o comando de uma empresa privada que, no caso, teria a benesse de administrar esses valores.

Campos Neto fez oferta na cara da BlackRock, que não teria problema nenhum em administrar as riquezas do Brasil

“A gente está aberto a essa terceirização, gestão externa vamos dizer… Hoje a grande parte da gestão não é terceirizada, mas a gente está aberto a fazer isso nessa área, principalmente, porque a gente está olhando agora para novas classes de ativos”, afirmou ele, em entrevista gravada à BlackRock Brasil.

Quem compra um país

Existe uma empresa no mundo que hoje administra ativos que equivalem a seis vezes o PIB do Brasil. São cerca de 10 trilhões de dólares em bens sob o comando da própria BlackRock, a maior megacorporação de todo o planeta.

Se fosse um país, a BlackRock seria o terceiro mais rico do planeta, apenas atrás do PIB da China e dos EUA. E eles estariam aptos a gastar quantidades enormes de dinheiro para se apoderar do controle de grandes quantidades de propriedade, em especial em novos mercados.

Em 2018, WIll Landers, diretor da BlackRock para mercados emergentes, concedeu entrevista ao Money Times demonstrando satisfação com a equipe de Bolsonaro, "Há tempo estamos posicionados para um Brasil que dê continuidade ao programa de reformas começado em 2016", disse ao Money Times, à época.

Durante o governo Bolsonaro, a BlackRock comprou participações na Eletrobrás, além da Cemig, Light e outras empresas de energia brasileiras. Investiu em empresas como ViaVarejo (Casas Bahia), botou dinheiro na Vale, na Rumo Logística, Iguatemi e outras empresas privadas brasileiras. 

Quem vende um país

Para tentar oferecer resistência às investidas russas no Donbass e no sul da Ucrânia, o presidente ucraniano Volodymyr Zelenskyy precisa de dinheiro e armas para o combate. Uma guerra cara vem com financiamento caro: Zelensky terá que devolver, ao menos parcialmente, os esforços de guerra gentilmente cedidos por EUA, União Europeia e Reino Unido.

Serão necessários mais de 500 bilhões de dólares para refazer a infraestrutura perdida na Ucrânia pela guerra, segundo o Banco Mundial. 

Além disso, foram outros 75 bilhões de dólares somente dos Estados Unidos para investimentos militares, apoio humanitário, etc. Uma parte deste dinheiro já está comprometido para pagamento dos esforços de guerra.

Zelensky, devendo até as calças para o Ocidente, não vai ter dinheiro para reconstruir seu país e dependerá dos investidores privados para que seu país volte a andar caso a guerra termine.

Encontro entre Zelenskyy e Larry Fink, CEO da BlackRock, em dezembro de 2022

A BlackRock foi escolhida para agir como a principal gestora de fundos da Ucrânia, isto é, ela irá administrar os valores e os preços das reservas ucranianos, prometendo garantir o investimento para a "reconstrução" e tomando posse dos principais bens que a Ucrânia tem.

Em parceria com Zelensky, em maio deste ano, a BlackRock anunciou que irá criar o Fundo de Desenvolvimento da Ucrânia. O plano da empresa é reconstruir o país inteiro de forma privatizada, e o governo Zelensky lhe deu bênção. A BlackRock terá a outorga para administrar esses bens e essas propriedades da reconstrução.

Dentro da própria Ucrânia, há uma série de críticos que enxergam a política ultraprivatista de Zelensky como um tiro no pé para um futuro de eventual vitória de Kiev.

No ano passado, a BlackRock já havia dito que a Ucrânia precisa de reformas para cortar "o gasto do governo", aumentar "a eficiência do sistema tributário" e a "desregulação" para maiores investimentos. Soa como uma ponte para o futuro...

Faz o olho brilhar...

A BlackRock, em entrevista à Money Times, já analisava o Brasil positivamente o cenário do país desde o governo de Michel Temer e sua Ponte para o Futuro, que previa cortar o "gasto do governo" - com o Teto de Gastos e Reforma da Previdência -, "aumentar a eficiência do sistema tributário" - nas tentativa de reformas tributárias malsucedidas - e "Desregulação" - com a reforma trabalhista e as desonerações.

O governo Bolsonaro deu, em certa medida, continuidade a um projeto de privatizações, das quais, inclusive, a própria BlackRock se beneificiou. E, Campos Neto, que fez campanha em favor do Bolsonaro esteve ao lado do mercado financeiro durante este período.

Com a eleição de Lula, o presidente do BC se manteve como último representante desse projeto de poder dentro do âmbito do governo federal. Em sua autarquia superpoderosa, que sangra a economia brasileira com uma taxa de juros incompatível com o resto do planeta, ele manda mesmo sob pressão.

Foi em um evento da BlackRock, no ano passado, que Neto pediu para ficar. "É muito importante que os dirigentes entendam que eles têm um mandato, têm que cumprir o mandato para exercer essa autonomia e, no caso, isso se estende a mim também. É importante que eu fique esses dois anos e que eu mostre que todo o esforço que foi feito a esse movimento de ganho institucional sirva para momentos de transição de governo", afirmou.

Agora, em conversa amistosa e franca com a mesma BlackRock, Campos Neto reforça seu desejo de entregar as reservas brasileiras para a iniciativa privada estrangeira. E, sabendo, que as privatizações vão cessar no governo Lula, oferece o que tem nas mãos. E os olhos da BlackRock (e de todos os outros capitalistas do planeta), certamente, brilham com uma pechincha...