PODER JUDICIÁRIO

Cristiano Zanin: o novo ministro do Supremo Tribunal Federal

Conheça a trajetória do advogado, indicado por Lula, que foi aprovado pelo Senado e ocupará a vaga do ministro Ricardo Lewandowski no STF; juristas aprovam novidade

Cristiano Zanin, novo ministro do STF.Créditos: Lula Marques/Agência Brasil
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O advogado Cristiano Zanin (47), indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para ocupar a vaga de Ricardo Lewandowski, será o novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF). Muito elogiado e praticamente aclamado pelos senadores, sua indicação foi aprovada nesta quarta-feira (21) no Plenário do Senado Federal por 58 votos a favor e 18 contrários.

“A comunidade jurídica recebe com festa e alegria a indicação do Cristiano Zanin, que reúne os predicados necessários, reputação ilibada e sólida formação jurídica para ser um grande ministro, do qual todos nós vamos nos orgulhar”, comentou o advogado constitucionalista Marco Aurélio de Carvalho, do Grupo Prerrogativas, à Revista Fórum.

O jurista Pedro Serrano também avaliou positivamente a aprovação do novo ministro para a reportagem. “Creio que foi uma boa escolha do presidente. Sem dúvida alguma será um grande ministro”, afirmou.

Horas antes, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, onde foi sabatinado, também obteve votação expressiva: 21 a 5. Mas não é apenas entre os senadores, os juristas consultados e o presidente da República que o novo ministro do STF é bem avaliado. Entre seus pares, tanto a sua indicação como a recente aprovação do seu nome foram alvos de elogios.

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O ministro Gilmar Mendes, por exemplo, declarou em 1º de junho ser “alvissareira a notícia de que o nome do brilhante advogado foi encaminhado ao Senado. O doutor Zanin sempre demonstrou elevado tirocínio jurídico em sua trajetória profissional”. Meses antes, em março, a ministra Cármen Lúcia deu entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, onde afirmou que também aprovava a indicação.

Dessa vez, o ministro Alexandre de Moraes foi o primeiro colega de Zanin na Suprema Corte a comentar sua chegada. “Parabéns ao ministro Cristiano Zanin pela merecida aprovação no Senado Federal. Tenho absoluta certeza de que o Brasil ganhará com sua atuação competente e corajosa em nossa Suprema Corte”, escreveu o magistrado, que além de compor o Supremo é, atualmente, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

A sabatina

Durante a tarde desta quarta-feira (21), Zanin foi sabatinado pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, que, mais tarde, aprovou sua indicação e a enviou ao Plenário. A sessão foi considerada morna e demarcou as diferenças entre o campo democrático e o bolsonarismo. As intervenções de senadores da esquerda e do chamado "Centrão" foram simpáticas ao novo ministro, enquanto quadros ligados ao ex-presidente de extrema direita fizeram ataques e críticas.

Primeiro senador a chegar à CCJ para a sabatina de Zanin, Sergio Moro (União-PR) passou vergonha ao usar uma fake news em uma das perguntas feitas ao advogado. Moro, que já havia recebido um recado de Zanin quando o indicado de Lula falou sobre a importância da atuação imparcial como ministro do STF, perguntou sobre a relação do advogado com Lula para além da questão profissional e usou uma fake news propagada por apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) de que ele seria padrinho de casamento do presidente.

"Nós sabemos do seu trabalho como advogado particular, mas para além disso eu gostaria de ouvi-lo sobre seu relacionamento pessoal, tanto de Vossa Excelência quanto de seus parentes, com o presidente Lula e seus parentes (…). Eu li, por exemplo, eu vi na internet, não sei se era procedente ou não essa afirmação, que Vossa Excelência teria sido padrinho do recente casamento do presidente. Não sei se é verdade ou não, e se não for eu peço até minhas escusas, mas é importante para nós, do Senado, essa relação, se vai além da atuação como advogado", indagou, entre gaguejos, Moro, o grande perdedor da jornada, como veremos a seguir.

Na resposta, Zanin foi sucinto, humilhando o ex-ministro de Bolsonaro e ex-juiz, que foi considerado parcial pelo STF na condenação a Lula, justamente em um processo movido pelo advogado.

"A minha relação com o presidente Lula se estabeleceu ao longo do tempo. Na condição de advogado, tive uma relação bastante frequente com o presidente Lula, não fui padrinho de casamento do presidente Lula e prezo muito essa relação, assim como a que tenho com outras pessoas, inclusive deste Senado da República", respondeu Zanin, contando que esteve apenas uma vez com Lula depois da posse, quando foi convidado para ser indicado ao STF.

Outros dois momentos bastante desconfortáveis foram protagonizados por Magno Malta (PL-ES) e Jorge Seif (PL-SC), que fizeram declarações desequilibradas sobre aborto, drogas e questões relacionadas à sexualidade.

Durante seu discurso, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) considerou a sabatina de Zanin um momento histórico do Senado Federal, dizendo-se apenas decepcionado com “discussões estéreis” sobre a relação pessoal do advogado com o presidente Lula. Ele falou ainda da “fragilidade das críticas dos ‘poucos’ que estavam ali contrários à indicação”, dando a entender que questionamentos como os impostos por Moro seriam “um debate insignificante, quase desprezível”.

Já o senador Randolfe Rodrigues (sem partido-AP) iniciou sua intervenção com uma declaração que deixou seus colegas de parlamento impressionados, sobretudo pelo tom de suspense que deu àquilo que falaria. Ele se referia a um fato histórico amplamente reconhecido, a condução promovida por Nelson Mandela, que ocupou a Presidência da África do Sul entre 1994 e 1999, de seu advogado pessoal, Arthur Chaskalson, ao cargo de juiz da Suprema Corte Constitucional daquela nação. Mandela esteve preso injustamente por 27 anos e quase foi condenado à morte em 1963/64, no caso conhecido como "Processo de Rivônia", num julgamento que acabou por sentenciá-lo à prisão perpétua, em pleno regime do apartheid, que institucionalizava a discriminação racial na África do Sul e massacrava a população negra.

A fala de Randolfe fez uma analogia desse caso com o de Lula, que, após o violento processo de lawfare a que foi submetido pelo então juiz Sergio Moro, na Operação Lava Jato, acabou condenado e passou 580 dias atrás das grades, sendo retirado de lá e tendo a justiça sendo restabelecida muito pela atuação brilhante de Zanin.

“Doutor Zanin, eu quero trazer uma notícia a esta Casa: o presidente da República, após um longo período na prisão, nomeou seu advogado para a Suprema Corte Constitucional. Só que o presidente da República não é Luiz Inácio Lula da Silva, o presidente da República é Nelson Mandela, e o advogado não é Cristiano Zanin, o advogado é Arthur Chaskalson. Depois de 31 anos de Nelson Mandela preso, após a instituição da primeira Corte Constitucional sul-africana, o presidente Mandela nomeia o seu advogado, do processo de Rivônia, de 1963. Nesse processo, Chaskalson saiu vitorioso... Mas muitos vão dizer: 'Mandela foi condenado'. Sim, foi condenado à prisão perpétua, mas o desejo da promotoria naquele caso era condenar Mandela ao enforcamento. A prisão perpétua, naquele processo de Rivônia, foi uma vitória. 31 anos depois, em 1995, logo após a sua eleição à Presidência da República, Mandela nomeia Chaskalson juiz da Suprema Corte. E uma de suas primeiras providências em julgamento, e atuando como juiz, foi abolir a pena de morte naquele país, como parte da obra da reconciliação nacional. Sempre, nesses episódios da história, é importante destacar quando falam de ‘eventual indicação pessoal’ do presidente da República. E esse destaque histórico eu faço questão de trazer aqui à colação”, disse o senador Randolfe Rodrigues.

Quem é Zanin

Cristiano Zanin Martins nasceu há 47 anos em Piracicaba, no interior de São Paulo, e se formou em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) em 1999. Especializou-se em litígios criminais e empresariais, e atuou nas áreas de direito econômico, empresarial e societário. Também deu aulas de Direito Civil e Direito Processual Civil na Faculdade Autônoma de Direito.

Advogado, é sócio ao lado da esposa Valeska Teixeira do escritório Zanin Martins Advogados. Como defensor do presidente Lula travou ao menos dois embates que foram fundamentais para ganhar a total confiança do presidente.

Um deles ocorreu em 2018. O ex-ministro do STF Sepúlveda Pertence, que integrava na ocasião a equipe de advogados de Lula, defendia o pedido de prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica para o ex-presidente, que estava naquele momento na carceragem da Polícia Federal (PF) em Curitiba. Lula era contra, dizia que não era pombo pra usar tornozeleira. Além disso, dizia também que se negociasse qualquer atenuante para a sua prisão estaria assumindo uma culpa que, conforme ficou atestado posteriormente, não tinha.

Mesmo assim, Pertence apresentou a demanda ao STF. Assim que soube, Zanin e sua esposa, Valeska Teixeira, que também representava Lula, desmentiram o ex-ministro por meio de uma nota pública. Pertence deixou a defesa logo depois.

O outro episódio foi fundamental para a posterior libertação de Lula. Zanin defendia, em 2018, que se apresentasse à Justiça um habeas corpus para solicitar que o ex-juiz Sergio Moro fosse considerado suspeito no caso. O que motivou a ação foi o ex-juiz ter aceitado o cargo de ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, eleito naquele ano.

Aliados petistas discordavam da tese, achavam que Moro estava “forte demais” na época e que o pedido poderia aumentar a tensão e até elevar a pena de Lula. Zanin ameaçou deixar a defesa caso o pedido de suspeição de Moro fosse retirado. Lula bateu o pé e se posicionou para que o habeas corpus fosse mantido. Em 2021, o STF considerou Moro um juiz parcial e o presidente foi libertado.

Indicado de Lula

O presidente confirmou em 1º de junho que seu indicado para a vaga aberta no STF diante da aposentadoria de Ricardo Lewandowski seria o advogado Cristiano Zanin Martins.

"Já era esperado que eu fosse indicar o Zanin para o STF, não só pela minha defesa, mas porque eu acho que se transformará em um grande ministro da Suprema Corte. Conheço suas qualidades, formação, trajetória e competência. E acho que o Brasil irá se orgulhar", escreveu Lula em suas redes sociais naquela ocasião.

"Fiquei muito honrado com a indicação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ao longo dos últimos anos tive oportunidade de conviver com o presidente Lula, e de compreender sua visão sobre os papéis institucionais da República, inclusive sua visão do papel do magistrado. E eu estabeleci com ele uma relação e ele pôde ver meu trabalho jurídico ao longo dos anos. Eu participei intensamente de sua defesa técnica, fui até o fim e tive reconhecida a anulação de seus processos e a absolvição em outros", respondeu Zanin naquele momento.

O advogado disse, então, que acredita que foi indicado por Lula "pelo fato de ele ter conhecido meu trabalho jurídico e minha carreira na advocacia e por ter a certeza de que serei guiado apenas pela Constituição e pelas leis, sem qualquer tipo de subordinação a quem quer que seja". Zanin afirmou que é essa sua visão e também a de Lula.

Qual vai ser a próxima vaga no STF

Uma nova vaga no STF é aberta sempre que um ministro se aposenta. No caso de Zanin, ele substituirá Ricardo Lewandowski, que se aposentou no último dia 11 de abril, um mês antes de completar 75 anos, que é a idade de aposentadoria obrigatória dos ministros do Supremo.

Ao todo, o presidente Lula poderá fazer duas indicações ao longo do seu mandato atual, incluindo a de Zanin, e mais três caso seja reeleito para um quarto mandato. Em outubro deste ano, a ministra Rosa Weber, presidente do STF, irá se aposentar. Nesse momento, o presidente Lula poderá fazer uma segunda indicação.

Entre 2027 e 2030, período que compreende o próximo mandato presidencial, estão previstas as aposentadorias de mais três ministros. Luiz Fux em abril de 2028, Cármen Lúcia em abril de 2029 e Gilmar Mendes em dezembro de 2030. Já o ministro Alexandre de Moraes, para a lamentação geral dos bolsonaristas, deve permanecer no Supremo até 2043.

Colaboraram Ivan Longo, Julinho Bittencourt e Marcelo Hailer