FALÁCIA

Google faz campanha covarde contra o PL das Fake news, que visa combater crimes nas redes

Publicação assinada por diretor de relações governamentais e políticas públicas do Google Brasil tenta argumentar em defesa do negócio que fatura engajando com a barbárie; Dino quer apurar abusos das ‘big techs’

Celular com tela escrito "fake news".Créditos: Pedro França/Agência Senado
Escrito en POLÍTICA el

Desesperado com o Projeto de Lei 2630/2020, mais conhecido como o PL das Fakes News, que será votado amanhã (2) na Câmara dos Deputados, o Google faz uma campanha covarde contra a proposta que visa combater crimes na internet - desde espaços de conversas onde se dá a difusão de ideias e práticas odiosas e criminosas, como as descritas no aplicativo Discord, até os algorítimos de busca que muitas vezes deixam passar ao público as mais descabidas fake news ao invés de privilegiar o jornalismo profissional.

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Nesta segunda-feira (1), o Google fez uma chamada na sua página inicial: “O PL das Fake News pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”. Ao clicar na chamada, o internauta é logo direcionado a um artigo assinado por Marcelo Lacerda, diretor de relações governamentais e políticas públicas do Google Brasil.

Diz Lacerda que a criação de tal legislação, que tem “o potencial de impactar a vida de milhões de brasileiros e empresas todos os dias precisa ser feita de uma maneira colaborativa e construtiva”.

Reprodução/Google

No entanto, ao contrário do que o diretor do Google Brasil coloca – de que a legislação teria sido feita à revelia da vontade popular -, uma pesquisa da Atlas Intel publicada no último dia 25 de abril mostra que 78% dos brasileiros são a favor da nova lei e acreditam que o país precisa de uma legislação que dê conta de regular as chamadas ‘big techs’.

O debate veio tarde. Em 2018, dada a onda sem precedentes de compartilhamento de notícias falsas e outras modalidades de mentiras, o Brasil teve a infelicidade de ver Jair Bolsonaro (PL) ser eleito presidente da República para, nos anos seguintes, seguir mentindo a respeito de tudo. Até mesmo sobre as vacinas que devolveriam o país a alguma normalidade cotidiana após os horrores da pandemia de Covid-19. Recentemente – e justamente porque não se discutiu isso antes – o debate voltou à boca do povo por meio da triste e revoltante escalada de ataques e ameaças de ataques à escolas.

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Na pesquisa da Atlas Intel, 74% acreditam que chegamos a esse ponto graças à ausência de regulamentação. A pesquisa da Atlas Intel ouviu 1600 pessoas de forma virtual entre 15 e 17 de abril. De acordo com os resultados, 94% dos entrevistados acredita que o ambiente das redes é inseguro para os jovens.

Mas Lacerda não parou por aí. O texto, ainda que curto, continua. Em linhas gerais aponta que a nova legislação se aprovada como está, não cumpriria com o seu objetivo de tolher a desinformação. Segundo o diretor do Google Brasil, sentenças como “A vacina do Covid-19 irá modificar o DNA dos seres humanos” seguiriam disponíveis nas buscas do Google e do Youtube mesmo após uma aprovação da lei. Ao fim, pede que sejam feitas melhorias no texto, indica um local onde o internauta pode entrar em contato com deputados para pedir que não votem pela nova lei e termina com chamada para um outro artigo, cujo título é: “Como o PL 2630 pode piorar a sua internet”.

Bem, para muita gente a internet já piorou. Basta conversar com pais de adolescentes e professores do ensino médio para se ter uma noção. Em entrevista exclusiva à Fórum, a pedagoga e doutora em educação pela USP, Catarina de Almeida Santos, ao analisar a recente de ataques e ameaças a escolas, fez uma defesa do PL das Fake News.

“Não tenho a menor dúvida de que a gente precisa regular as redes e plataformas digitais. Essa coisa de que ‘o mercado regula as coisas’, nós já conhecemos as consequências. Os estados precisam ter uma rede de proteção das suas crianças e seus adolescentes. O Estatuto da Criança e do Adolescente, inclusive, prevê essa proteção por parte do Estado. Não é possível que se permita que as redes deixem circular livremente conteúdos que violam todos os preceitos e direitos fundamentais. Para além de todas as violações de dados, de vigilância etc., se elas são incapazes de coibir e proibir que essas violências se proliferem, precisa ter regulação e precisam ser punidas por isso. Porque veja, as redes sociais são importantes e elas podem ser utilizadas para reverter essas violências e violações. Elas precisam dar voz a debates que desnaturalizam e que combatam as violências. Tudo aquilo que fere a dignidade humana, a vida humana. Não é possível que a gente deixe que esse tipo de coisa fique circulando livremente, enquanto a foto de um nu artístico é bloqueada pela mesma rede. Não estou dizendo que é para acabar com as redes. Elas precisam ser redes sociais e não sociopatas. Espaços de construção de uma sociabilidade, não de destruição das nossas possibilidades de existência enquanto sociedade. ”, analisou.

Mas aparentemente as ditas ‘big techs’ não estão a fim de mudar seu modelo de negócio. Em publicação desta mesma segunda-feira (1), o Sleeping Giants Brasil, grupo que ganhou notoriedade nos últimos anos por realizar campanhas de desmonetização de sites e empresas que propagam mentiras, fez um alerta.

“O desespero bateu. O Google está usando a própria plataforma para atacar o PL das Fake News e o Twitter está deslogando contas de pessoas para atrapalhar [o debate]. As big techs estão com medo de perder suas fortunas ganhas em cima das vidas devastadas das nossas crianças, e estão usando de tudo para tentar barrar o PL 2630. Vocês acham certo expor seus filhos a perigos mortais só pelo lucro dessas grandes empresas?”, questionou.

Em resposta ao tuíte da Sleeping Giants, o ministro Flávio Dino, da Justiça e Segurança Pública, afirmou que encaminhou a denúncia para análise da Secretaria Nacional do Consumidor, órgão do seu Ministério. Dino quer uma apuração sobre possível configuração de práticas abusivas por parte das empresas com fins de manipular o debate público.