POSSE NA PGR

Lula dá "preste atenção" em Gonet em posse na PGR: não se guie por "manchetes de jornais"

Presidente pediu seriedade a Gonet ao lembrar do conluio entre Lava Jato e mídia liberal. Novo PGR já escalou ao menos dois remanescentes do lavajatismo na nova estrutura do Ministério Público Federal. Veja o discurso.

Lula conversa com Paulo Gonet durante a posse do novo PGR.Créditos: Reprodução/Youtube
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Em discurso na cerimônia de posse de Paulo Gonet na Procuradoria-Geral da República (PGR) nesta segunda-feira (18), Lula deu um "presta atenção" ao novo PGR, remetendo ao processo de lawfare conduzido contra ele pela Lava Jato, que fabricava manchetes para atacá-lo em conluio com a mídia neoliberal.

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Após fala insossa de Gonet, que disse que o Ministério Público é "corresponsável" pela preservação da democracia no país, Lula lembrou o novo PGR das perseguições da Lava Jato e das "acusações levianas" feitas por Deltan Dallagnol, Sergio Moro e a trupe da chamada "República de Curitiba".

"A única coisa que eu peço a você, em nome do que você representará daqui pra frente na história do país, é que você só tenha uma preocupação: fazer com que a verdade, e somente a verdade, prevaleça acima de quaisquer outros interesses. Trabalhe com aquilo que o povo espera do MP. As acusações levianas não fortalecem a democracia, não fortalecem as instituições", afirmou,

O presidente, então, lembrou do conluio dos lavajatistas com a mídia liberal em "denúncias" que foram "publicizadas antes de se saber se é verdade, porque senão as pessoas serão condenadas previamente".

"E, quando as pessoas são provadas inocentes, essas pessoas não são reconhecidas publicamente. Então, é importante que o MP recupere aquilo que foi razão pela qual os constituintes enalteceram o MP: garantir a liberdade, democracia, a verdade", afirmou.

Em seguida, o presidente ressaltou que  "qualquer denúncia contra qualquer político já parte do pressuposto de que é verdadeira. E nem sempre é".

"Eu prezo muito por isso. Houve um momento em que aqui neste país as denúncias das manchetes de jornais falaram mais alto do que os autos dos processos. Muitas vezes. E, quando isso acontece, se negando a política, o que vem depois é sempre pior do que a política. Não existe a possibilidade de o MP achar que todo político é corrupto", disse Lula, em um "presta atenção" a Gonet.

"E se a gente quiser evitar aventuras neste país como a que aconteceu dia 8 de janeiro deste ano, se a gente quiser consagrar o processo democrático como o regime político mais extraordinário que o ser humano conseguiu inventar, o MP precisa jogar o jogo de verdade. E aí, na tua pessoa, que eu, depois de conversar com muitos procuradores, cheguei à conclusão de que deveria depositar a confiança do povo brasileiro", emendou o presidente.

Lula seguiu dando o recado, dizendo a Gonet que "nenhum procurador tem direito de brincar" com a PGR.

"Não pode se submeter a um presidente da República, ao presidente da Câmara, ao presidente do Senado, não pode se submeter aos presidentes de outros poderes, não pode se submeter à manchete de nenhum jornal ou de um canal de televisão", afirmou.

Lula ainda ressaltou que, diferentemente de Jair Bolsonaro (PL), não vai influenciar no trabalho de Gonet frente à PGR.

"Da minha parte, eu quero te dizer publicamente: nunca lhe pedirei um favor pessoal, nunca exercerei sobre o Ministério Público qualquer pressão pessoal para que alguma coisa não seja investigada. A única coisa que te peço: não faça o Ministério Público se diminuir diante da expectativa de 200 milhões de brasileiros que acreditam nesta instituição. Seja o mais sério possível, o mais honesto possível, o mais duro possível, mas, ao mesmo tempo, o mais justo possível com a sociedade brasileira", concluiu - veja vídeo ao final da reportagem.

Lavajatistas

Antes mesmo da posse de Gonet, a troca no comando mostra cizânia dentro da PGR e coloca o antigo grupo de procuradores ligados à Lava Jato em evidência após serem substituídos por integrantes do Ministério Público Federal mais alinhados às ideias de Jair Bolsonaro (PL) durante a gestão Augusto Aras.

Entre os lavajatistas, dois nomes se destacam. Um deles é o de Raquel Branquinho, que vai coordenar a Escola Superior do Ministério Público, órgão que dá as diretrizes aos membros do MPF.

Paulista de Franca, Branquinho atuou em casos emblemáticos no Ministério Público, como o Marka-FonteCindam, que levou para a cadeia o banqueiro Salvatore Cacciola e do chamado "mensalão". A procuradora estreitou os laços com a "República de Curitiba" durante a investigação do Banestado - em que Sergio Moro também atuou -, antes de coordenar a área criminal e as investigações da Lava Jato na PGR.

Além dela, Gonet deve levar para a Secretaria de Relações Institucionais da PGR o procurador Silvio Amorim, que atuou na Lava Jato e aparece em mensagens extraídas da Operação Spoofing em diálogo com Deltan Dallagnol.

"Silvio, você fará falta, mas tenho consciência de que uma importantíssima missão o aguarda! Parabéns pela indicação e conte com nossa admiração e apoio. Grande abraço, meu amigo”, escreveu Dallagnol em 2016, quando Amorim foi indicado para compor o  Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP).

“Pessoal, em poucos dias assumirei outras funções no CNMP. É chegada a hora de me despedir e dizer muito obrigado a todos vocês! Continuem esse trabalho maravilhoso! Muito obrigado pela honra que me proporcionaram de compartilhar esse momento histórico, tão de perto. Inesquecível! Contem comigo, sempre! Até a próxima, pessoal! Vão pra cima!”, respondeu Amorim no grupo Filhos de Januário.

No CNMP, o procurador votou a favor de Dallagnol em processos que chegaram ao órgão. Amorim também votou contra a publição ao procurador Diogo Castor, também da Lava Jato.

Gonet ainda terá como vice-procurador-geral, uma espécie de número 2 da PGR, Hindemburo Chateaubriand, que vem de uma longa linhagem no MPF e atutou como corregedor-geral durante o caso Alstom, entre outros.

Chefe de Gabinete de Aras, Alexandre Espinosa atuará como vice-procurador-geral eleitoral. A secretária-geral do Ministério Público da União (MPU) continuará sendo a subprocuradora Eliana Péres Torelly de Carvalho. O procurador Carlos Fernando Mazzoco será chefe de gabinete de Gonet. A Corregedoria-Geral deve seguir com Célia Regina Delgado.

Exoneração

A movimentação na PGR começou na sexta-feira (15), quando o coordenador do Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos, o subprocurador Carlos Frederico Santos entregou o cargo à procuradora-geral da República interina, Elizeta Ramos.

Santos ainda criticou o acordo de delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), que foi homologado a pedido da Polícia Federal.

Crítico à delação, que foram usadas por bolsonaristas, o subprocurador considerou "fraca" as denúncias feitas por Cid.

“Havendo essa delação do Mauro Cid, e o Ministério Público não participou (das tratativas do acordo), tudo bem, não vou jogar provas fora e dizer que a prova não presta. Vou tentar fazer com que essa prova fique forte. Esse é o nosso objetivo. Agora não posso garantir – estou tentando”, disse em entrevista em novembro ao jornal O Globo.

Esposa de Santos, Ana Borges Coêlho também colocou o cargo de vice-procuradora à disposição.

Santos e Ana Borges são casados há 34 anos e teriam confrontado a versão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), sobre a agressão no aeroporto de Roma por um bolsonarista. O casal também nutrem antipatia por Gilmar Mendes, que apadrinhou a candidatura do PGR junto a Lula.

Defensora da legalização do aborto, Ana Borges deixa também o cargo de suplente do Conselho Nacional de Direitos Humanos. O tema é combatido ferozmente por Gonet, que se alinha aos conservadores na pauta de "costumes".

Assista ao discurso de Lula na posse de Gonet na PGR