O Governo Federal sofreu sua segunda derrota no Congresso Nacional nesta quinta-feira (14) após a derrubada do veto sobre a desoneração da folha de pagamento de 17 setores da economia. Por 321 votos a 137 na Câmara e por 53 votos a 19 no Senado, os parlamentares derrubaram o veto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à lei que estabelece o marco temporal para a demarcação de terras indígenas.
De acordo com a norma, que vai para promulgação após a derrubada do veto, os povos indígenas não poderão mais reivindicar territórios que não possam comprovar sua ocupação em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição Federal.
Te podría interesar
A tese é considerada por críticos da esquerda e pelos próprios indígenas como um dos principais instrumentos do agronegócio para invadir e explorar terras indígenas, e um ataque frontal aos direitos dos povos originários. De acordo com a cartilha “Marco Temporal” da Articulação dos Povos Indígenas (Apib), 1393 territórios estão sob ameaça.
Segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 226 processos que envolvem disputas de terras podem ser impactados. Para a deputada federal indígena Celia Xakriabá (Psol-MG), a derrubada dos vetos é uma “derrota da humanidade”.
Te podría interesar
“Se hoje derrubarmos esses vetos que são cruciais para o futuro dos povos indígenas será uma derrota não apenas para o Brasil, mas uma derrota para toda a humanidade. Eu tenho dito para os senhores parlamentares e encontro pessoas pelos corredores dizendo que são a favor dos povos indígenas. Mas não se pode ser a favor dos povos indígenas e continuar representando a violência histórica cometida contra nós. Votar pela derrubada do veto é premiar ladrões de terras indígenas”, declarou a ministra durante a sessão.
Derrota do Governo
A derrubada dos vetos representa mais uma derrota para o Governo Federal que tentou, nos últimos meses, articular a manutenção dos mesmos. O próprio veto parcial, quando consolidado, foi muito criticado por indígenas e ambientalistas por não ter abrangido uma série de pormenores que garantiriam os direitos originários.
Durante reunião entre Lula e ministros que determinou o veto parcial foi exposta a necessidade de não se fazer um veto total, uma vez que seria mais fácil de ser derrubado pelo Congresso. Nesse sentido, a ministra Sônia Guajajara explicou para a imprensa que foi necessário encontrar os pontos do projeto de lei que estivessem dentro da Constituição.
“O Ministério dos Povos inicialmente recomendou o veto total. Posteriormente fizemos uma análise criteriosa e conseguimos, ali, olhar os artigos que já estão garantidos na Constituição Federal, portanto poderiam ficar ali”, disse a ministra para a imprensa.
Na justificativa para o veto da tese, Lula apontou a inconstitucionalidade da tese que, na sua opinião, contraria o interesse público uma vez que permite a usurpação de terras indígenas.
STF, indígenas e contestação
O Supremo Tribunal Federal decidiu em setembro por 9 votos a 2, que a tese do marco temporal é inconstitucional, argumento seguido por Lula em seu veto parcial. Mas na semana seguinte a Câmara e o Senado se apressaram para discutir e aprovar a lei que vai no sentido oposto. Esse processo foi visto como uma provocação ao Supremo.
Dada a decisão da instância máxima do Poder Judiciário, organizações indígenas ainda podem contestar a normativa junto ao STF.
PT vai acionar o STF contra derrubada do veto ao Marco Temporal
O PT, com o apoio da sua bancada na Câmara dos Deputados, vai protocolar no Supremo Tribunal Federal uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a derrubada do veto ao Marco Temporal, aprovada nesta quinta-feira (14) em sessão do Congresso Nacional.
“É absolutamente inconstitucional a manutenção do Marco Temporal, uma investida conservadora segundo a qual poderiam ser demarcadas apenas as terras tradicionalmente ocupadas por indígenas na data da promulgação da Constituição Federal de 1988. Caso prevaleça tal pretensão, os povos indígenas estariam expostos a uma grave violação dos seus diretos constitucionais e submissos à violência histórica praticada pelo Estado e por setores dominantes da sociedade ávidos pelas terras e riquezas dos territórios dos povos originários”, diz nota do partido.
O veto firmado por Lula refutou também, na essência, a tentativa de anulação de direitos conquistados pelos povos indígenas e amplamente respaldados pela sociedade brasileira. Uma proteção para que essas terras não sejam invadidas por pastos, monoculturas, mineração e todo tipo de exploração que ameaça os povos indígenas e a natureza.
“O Partido dos Trabalhadores entende que a defesa das Terras Indígenas é ainda essencial para a árdua batalha contra as mudanças climáticas e o desmatamento criminoso, uma vez que cerca de 98% da área total delas está preservada. Elas atendem, assim, ao interesse geral da sociedade, do Estado e da economia. Os povos indígenas prestam um serviço ambiental ao Brasil e a todo o planeta, ao preservarem matas e florestas. Por sinal, ajudam a manter o regime de chuvas tão precioso às atividades agropecuárias. Em um ano marcado por fóruns globais sobre as questões ambientais, a manutenção do famigerado Marco Temporal se coloca como uma barreira à construção do Brasil como um líder global na transição ecológica e uma nação plural, solidária, justa e democrática.”, finaliza a nota do PT.