Outro dia, recebi a indicação no YouTube de um vídeo, intitulado “Conselhos Para Lidar Com Os Estúpidos (Eles são muitos)”, disponível no canal “Superleituras”. No vídeo em questão, é abordado o pensamento do teólogo, pastor luterano e professor universitário alemão, Dietrich Bonhoeffer, autor da “Teoria da Estupidez”, desenvolvida em uma prisão nazista.
Ao refletir sobre o regime liderado por Adolf Hitler, Bonhoeffer apontou que toda forte ascensão de poder na esfera pública – seja de natureza política ou religiosa – infecta grande parte das pessoas com a estupidez. Logo, o poder do Führer precisava, inexoravelmente, da estupidez do cidadão alemão médio.
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Isso significa que podemos demonstrar claramente a um estúpido, os erros, corrupção e incompetência do líder político que ele idolatra, mas, mesmo assim, ele jamais se convencerá. Pelo contrário, ele se satisfaz consigo mesmo e com os slogans de sua patota – determinadas bolhas que servem para alimentar falácias e valores deturpados. Ou seja, só é visto um lado das coisas, são consumidos somente os mesmos discursos e visões distorcidas do mundo.
Para Bonhoeffer, a estupidez é um problema mais sociológico do que psicológico. Sozinhos, boa parte dos estúpidos não agem dessa forma. No entanto, em grupo, a situação é bem diferente. A mesma pessoa que passa despercebida nas ruas e não quer ser notada, muda quando se junta a um grupo com um líder e discurso ideológico. Dito de outro modo, aquele sujeito, aparentemente pacífico, em grupo e motivado por um discurso perigoso, pode até mesmo cometer atos violentos. E, o que é pior, o estúpido é incapaz de reconhecer-se mau ou de reconhecer maldade em seus atos.
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Por fim, conclui o teólogo alemão, não adianta contra-argumentar racionalmente com um estúpido. Simplesmente ele vai atacar a reputação de quem apresentou os fatos e argumentos ou utilizar frases de efeito, slogans e chavões.
Terminado o vídeo do canal “Superleituras”, pensei que, se considerarmos o ex-presidente Jair Bolsonaro como o “líder” e os bolsonaristas como os “estúpidos”, podemos perfeitamente aplicar ao Brasil atual a teoria proposta por Bonhoeffer oito décadas atrás.
Indivíduos que rezam para pneus e pensam que extraterrestres ajudariam o exército em um provável golpe de Estado, certamente, estão acometidos por estupidez severa. Mas não é só isso! Parafraseando Shakespeare, há mais semelhanças entre bolsonaristas e os estúpidos estudados por Bonhoeffer do que a nossa vã analogia possa imaginar.
De fato, a força de Bolsonaro depende da estupidez dos bolsonaristas, também conhecidos por “bolsominions” ou “gado”. Podemos demonstrar claramente a um bolsonarista os erros, corrupção e incompetência do “mito” – o caso das joias, conduta inadequada na pandemia da Covid-19, flerte com o golpismo etc. – e, mesmo assim, ele jamais se convencerá ou vai duvidar da infalibilidade de Jair Messias.
Todas as acusações contra o “mito” são intrigas dos comunistas, da Globo Lixo, da Foice de São Paulo, da extrema imprensa, da esquerda, do sistema globalista, da esquerda fabiana, do marxismo cultural, do PT e por aí vai. Nesse sentido, o bolsonarista vai recorrer aos mantras de sua bolha (também conhecida como “grupo do zap”): “mi-mi-mi”, “ditadura gayzista”, “ideologia de gênero”, “doutrinação comunista”, “o mundo está muito chato” e, é claro, o maior de todos os chavões: “E o Lula, hein? E o PT?
Como bem pontou Bonhoeffer, o estúpido – ou, atualizando o conceito, o bolsonarista –, em uma discussão, sempre vai atacar a reputação de quem apresentou fatos e argumentos. Se for de alguma minoria social, então, melhor ainda. É o esquerdopata, a feminazi, o maconheiro e o afeminado.
O bolsonarismo também pode ser um problema mais sociológico do que psicológico. Sozinhos, boa parte dos bolsonaristas não agem dessa forma. Mas, nas redes sociais, em bando, como uma espécie de milícia digital, se transformam. Passam a ter orgulho de sua ignorância. É o empoderamento da estupidez. São haters de todos os tipos, prontos para linchamentos virtuais.
Senhores e senhoras bolsonaristas, que passam despercebidos nas ruas, mudam radicalmente quando se juntam a um grupo, podendo promover atos como o “8 de janeiro” ou participar de linchamentos (físicos mesmo) Brasil afora. E, o que é pior, o “bolsonarista praticante” é incapaz de reconhecer-se mau ou de reconhecer maldade em seus atos; se considera da “família tradicional”, “cristão exemplar” e “cidadão de bem”.
Para finalizar este texto, é importante lembrar que, diferentemente da Alemanha de quase um século atrás, os estúpidos daqui até conseguiram chegar ao poder máximo da nação; porém, felizmente, não tiveram a devida competência para dar um golpe e implantar uma ditadura. Enfim, em se tratado de eficiência, os bolsonaristas são mais estúpidos do que os “estúpidos originais”.