OPINIÃO

“Tempos Super Modernos”: o filme do capitalismo de plataforma - Por Francisco Fernandes Ladeira

Quase um século depois, o capitalismo, para sua própria sobrevivência enquanto sistema econômico e modelo civilizacional, se reinventou. Agora é flexível, financeiro e “de plataforma”

Filme Tempos Super Modernos retrata nova dinâmica do capitalismo.Créditos: Divulgação
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Quando se fala em representação cinematográfica do capitalismo industrial, dois filmes vêm à mente. Para os adeptos de produções mais alternativas, é citado o expoente do expressionismo alemão, “Metrópolis”. Já o público em geral vai se lembrar do clássico “Tempos Modernos”, de Charlie Chaplin. 

Quase um século depois, o capitalismo, para sua própria sobrevivência enquanto sistema econômico e modelo civilizacional, se reinventou. Agora é flexível, financeiro e “de plataforma”. 

Este último aspecto é abordado no filme italiano “Tempos Super Modernos”, que narra a saga de Arturo, desenvolvedor de software, inventor de um algorítmico para a empresa onde trabalha, capaz de identificar o que é “supérfluo” no ambiente profissional. 

Irônica e tragicamente, a própria criação é responsável por sua demissão. Dias antes, a noiva havia deixado Arturo. O motivo: um aplicativo demonstrou que os dois não tinham compatibilidade para casamento. 

Como nesses tempos de capitalismo de plataforma nada é tão ruim que não possa piorar, o protagonista de “Tempos Super Modernos” não consegue enviar seu currículo para outras empresas, pois os sites por ele acessados não recebem informações de candidatos com mais de quarenta anos. 

Além disso, ele é obrigado pelas circunstâncias adversas a anunciar virtualmente o aluguel de parte de seu apartamento. A vaga é preenchido por um professor universitário substituto que, para completar o orçamento, atua como hater na internet. Como diz o bordão: Não tá fácil pra ninguém!  

Eis que, como única solução, Arturo encontra um novo emprego na plataforma “Fuuber” (o nome é uma clara referência a uma conhecida empresa transnacional). A partir de então, ele começa a trabalhar como entregador de aplicativo, ocupação altamente precarizada, símbolo do capitalismo de plataforma. 

Como não consegue atingir (as inatingíveis) metas exigidas pela Fuuber (as entregas eram feitas de bicicleta), Arturo é banido da função. Desesperado, ele aceita participar (como cobaia) do “Fuuber Infinite”, experimento da empresa em que o “colaborador” exerce sua função por vinte e quatro horas diárias, com pequenos intervalos de 20 minutos a cada quatro horas. Ou seja, para o indivíduo altamente explorado, dormir é algo supérfluo. É a tão sonhada (pelos empresários) escala 7x7. 

Mas a Fuuber também oferece serviços de amigos holográficos para pessoas solitárias, como é o caso de Arturo. Trata-se do “Fuuber Amigo Ideal”, criado a partir das preferências dos usuários. Daí, por meio do “Fuuber Amigo Ideal”, ele conhece Stella, e sua vida tem mais uma reviravolta (desta vez, positiva). 

Embora tenha sido lançado há três anos, “Tempos Super Modernos” ainda não recebeu o devido reconhecimento. Talvez por seu viés crítico, é boicotado pelos “donos do poder”. Provavelmente, daqui a algumas décadas, o filme será lembrado por ser sinônimo de capitalismo de plataforma, assim como seu quase homônimo produzido por Chaplin é associado ao capitalismo industrial.

Enquanto isso, vale muito a pena assistir a essa (já) icônica produção do cinema italiano.   

PS.: O filme está disponível no Youtube e Prime Vídeo

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