POLITICALHA

Taxação das blusinhas: Bolsonaro implode grupo de Lira para se vingar de Lula e antecipa 2026

Em fúria com a viralização do "Bolsonaro taxou você", clã costurou estratégia revelada por Flávio Bolsonaro após reunião de líderes; para se vingar de Lula, ex-presidente se juntou a JHC e implodiu grupo de Lira em Alagoas

Bolsonaro com JHC e Arthur Lira.Créditos: Divulgação / Mário Agra Câmara dos Deputados
Escrito en OPINIÃO el

"Bolsonaro taxou você." A frase que viralizou na rede X após o ex-presidente articular o apoio de seu partido, o PL, para aprovação do "jabuti" da "taxação das blusinhas" no Projeto de Lei 914/2024, que institui o Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), provocou a ira de Jair Bolsonaro (PL), dos filhos e do núcleo duro de aliados.

Adepto por ocasião do neoliberalismo, quando aceitou Paulo Guedes como avalista do mercado e da mídia liberal em sua candidatura de 2018, Bolsonaro tem como uma das principais bandeiras o extermínio de impostos – o que resultou na dinamite das contas públicas, que explodiu no colo de Lula.

A adesão às pautas neoliberais, no entanto, fez com que parte da burguesia brasileira se alinhasse ao ideário neofascista do ex-presidente. 

Desde sempre é assim: o apoio da burguesia se compra com benesses. E foram essas benesses, especialmente na questão tributária, que fizeram com que Bolsonaro cooptasse essa pequena parcela de endinheirados do Brasil, sempre dispostos a extrair sangue para aumentar os lucros.

Na mensagem enviada aos 95 deputados do PL, lida pelo líder Altineu Côrtes (PL-RJ), Bolsonaro falou em nome dessa burguesia, atendendo a um pedido direto de Luciano Hang, o véio da Havan – que montou um império que destrói pequenos comércios pelo Brasil afora, mas não tem fôlego para competir com as bugigangas vendidas em sites chineses como Shein e Shopee.

Ignorante confesso em economia, o "capitão" sabe como ninguém fazer politicalha e age com o fígado, como demonstrou com o fiscal do Ibama que o multou por pesca irregular e como "comandante em chefe" das mesmas Forças Armadas que o escorraçaram em 1988, entre outros tantos casos.

E, agindo com o fígado, Bolsonaro provocou a implosão do grupo de Arthur Lira (PL-AL) em Alagoas na estratégia do clã para se vingar de Lula e do campo progressista, que o responsabilizou pela aprovação da "taxação das blusinhas" na Câmara.

"Bolsonaro taxou você"

Tão logo explodiu nas redes sociais – um território dominado pela extrema direita – a responsabilização por taxar as compras nos sites chineses, Bolsonaro foi ao X tentar se justificar.
 
"Informo que o meu governo sempre foi contra qualquer taxação, majoração ou criação de novos impostos. Portanto, somos contrários a qualquer projeto que onere ainda mais o cidadão brasileiro", escreveu, em mensagem sucinta que não surtiu efeito.

Especialista do clã nas redes, Carlos Bolsonaro (PL-RJ) criou a primeira estratégia de lançar a "campanha veta Lula", desafiando o presidente a vetar o imposto aprovado pelo Congresso sob articulação de seu pai.

A estratégia, no entanto, naufragou, já que Lula havia sinalizado que poderia realmente vetar o imposto. Além disso, a ação de Carlos caiu como uma bomba entre os aliados empresários, que continuariam com o ônus da concorrência com os sites.

Ação de Flávio Bolsonaro

Após o fracasso de reverter a situação nas redes, o que aumentou a ira do presidente, o projeto de lei com o "jabuti" foi colocado em regime de urgência para votação no Senado a pedido de líderes partidários.

Há um consenso entre os partidos sobre a necessidade da "taxação das blusinhas", devido à concorrência desleal com a indústria nacional. E tudo se encaminhava para que o projeto fosse aprovado com facilidade no Senado.

No entanto, ainda havia a vingança do clã Bolsonaro na trilha.

Pegando até mesmo o "aliado" Arthur Lira de surpresa, o relator Rodrigo Cunha (Podemos-AL) anunciou nesta terça-feira (4), antes da votação no Plenário do Senado, que havia retirado o "jabuti" da taxação do PL 914/2024.

Sem entender, Lira ligou para reclamar com o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que informou que o presidente da Câmara havia batido em porta errada. Não partiu do governo o rompimento do acordo costurado no Congresso que estipulou os 20% nas compras até 50 dólares nos sites chineses.

Toc toc

Um dia antes, Lira se encontrou em Brasília com o prefeito de Maceió, João Henrique Caldas (PL), o JHC, figura de seu grupo político.

A viagem de JHC a Brasília foi para comunicar Lira sobre o rompimento de um outro acordo: que não aceitaria mais a indicação do presidente da Câmara do nome do vice na chapa para a tentativa de reeleição na capital alagoana. 

O prefeito de Maceió – que em 7 de outubro de 2022 deixou o PSB, de Geraldo Alckmin, para embarcar no PL, de Bolsonaro – teria informado que seu vice será o senador Rodrigo Cunha, implodindo o grupo comandado por Lira no estado nordestino.

Ao se candidatar a vice, Cunha deixará o cargo no Senado nas mãos de Eudócia Caldas, mãe de JHC, que vai fortalecer a bancada do PL na casa.

Há cerca de um mês, no início de abril, JHC teria recebido as bênçãos de Jair Bolsonaro para ser o candidato da extrema direita nas eleições de outubro.

A articulação que implodiu o acordo com Lira, ao que tudo indica, contou com a participação do ex-presidente.

A estratégia ficou ainda mais clara após a reunião de líderes do Senado, na noite desta quarta (5), depois que Pacheco resolveu adiar a votação do projeto Mover.

Em dobradinha com Carlos Portinho (PL-RJ), líder do PL no Senado, Flávio Bolsonaro (PL-RJ) tenta encurralar o governo na "taxação das blusinhas", deixando claro que a vingança do ex-presidente passou por cima até mesmo de Lira.

Na entrevista após a reunião, Flávio afirmou que, agora, vai brigar para que produtos nacionais também tenham alíquotas reduzidas e não paguem mais do que 20% de tributos.

“A oposição entende que o melhor caminho é a emenda que foi apresentada por mim de desonerar o custo da indústria nacional como uma forma de deixá-la mais competitiva em relação à indústria chinesa. [...] Como não abrimos mão disso, queremos que haja o reequilíbrio não aumentando uma taxação dos produtos importados, mas reduzindo a taxação sobre a indústria nacional”, disse o filho de Bolsonaro.

A emenda, que tentou conturbar a votação do projeto Mover, de extremo interesse do governo, representa uma mudança de posição do clã Bolsonaro, que antes tentava simplesmente derrubar a taxação negociada pelo próprio ex-presidente junto aos deputados do PL.

Com a mudança de estratégia, Bolsonaro e seus filhos tentaram emparedar o governo. A emenda de Flávio, de baixar impostos na indústria nacional, impactaria diretamente nas contas públicas em um momento em que o governo Lula e Fernando Haddad lutam para aumentar a arrecadação.

No entanto, prevaleceu a posição do véio da Havan. Mesmo causando revolta entre bolsonaristas, o senador Jorge Seif Junior (PL-SC) atuou fortemente junto à bancada para que a taxação fosse aprovada.

Eleito com a máquina da Havan – que lhe rendeu o processo que pode cassar seu mandato no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) –, o ex-ministro da Pesca de Bolsonaro obedeceu às ordens de Hang.

Retirada do texto original, a “taxação das blusinhas” foi aprovada em emenda separada, que a incluía novamente no projeto de lei. Como o projeto foi modificado, a matéria volta para as mãos de Lira, na Câmara.

Bomba

Fora do jogo, inelegível até 2030, Bolsonaro antecipa as eleições de 2026 antes mesmo do pleito municipal de outubro ao defender a redução de impostos para uma burguesia sedenta de lucros e que já aderiu ao fascismo para isso.

A emenda apresentada por Flávio Bolsonaro no Senado lembra, em parte, as pautas-bomba instaladas por Eduardo Cunha em 2016, que culminaram no golpe contra Dilma Rousseff (PT).

Com a medida, o clã Bolsonaro tentou colocar mais uma vez uma bomba no colo de Lula, em meio a um cenário de guerra no Congresso Nacional, como visto na última quarta-feira  na Câmara, e em uma conjuntura política e midiática pouco favorável.

Bolsonaro mostra que não tem escrúpulos nem com os aliados, como Lira. E lembra o voto no golpe, quando homenageou o torturador Carlos Alberto Brilhante Ustra. Bolsonaro agora tortura não o governo, mas os mais de 215 milhões de brasileiros que não fazem parte dos beneficiados pela sua politicalha.

* Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.