O ano era 1982. O Brasil ainda vivia em plena ditadura militar, que só terminaria três anos depois, em 1985.
Eram as primeiras eleições após a anistia. As primeiras diretas para governador no período da ditadura. No Rio de Janeiro o ex-deputado e ex-governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola lançou sua candidatura ao governo do estado.
Brizola foi um dos maiores alvos da ditadura. Chegou a tentar uma reação a ela, como tentara com sucesso anos antes, quando da renúncia de Jânio Quadros.
E agora, como a ditadura iria engolir a candidatura Brizola?
Como o ditador João Figueiredo, do "eu prendo e arrebento", que declarou preferir o cheiro dos cavalos ao do povo, reagiria a Brizola?
O Brasil ainda respirava ares poluídos. A revogação do AI-5 havia acontecido apenas quatro anos antes.
Muitos aconselhavam Brizola a maneirar, jogar na retranca. Não politizar. Logo ele.
O cenário no estado do Rio em 1982
Brizola tinha como adversários o ex-governador do antigo estado do Rio, Moreira Franco, o candidato do governador Chagas Freitas, Miro Teixeira, e a deputada lacerdista Sandra Cavalcanti, além do petista Lisâneas Maciel, mais para marcar presença do PT, nascido dois anos antes.
Pois no primeiro dia de debates na TV, Brizola chutou a moderação para o alto, chamou Moreira, Miro e Sandra de candidatos da ditadura e do chaguismo (do governador emedebista Chagas Freitas, de uma esquerda que a direita gosta), anunciou um a um todos os candidatos e fulminou:
— São cinco contra o Brizola e o povo contra os cinco.
Brizola sabia que o que estava em jogo não era quem era o melhor técnico, o melhor gestor para o estado do Rio. A luta era política. Quem estava do lado da ditadura versus quem estava do lado da democracia.
E delimitou o terreno. Brizola e o povo do lado de cá e os adversários do lado de lá, o lado da ditadura, dos mais comprometidos aos omissos.
O mesmo acontece agora no Brasil, em especial em São Paulo, onde vai ser travada a grande disputa entre as forças populares e o governo Lula, representados por Guilherme Boulos com Marta de vice, e o bolsonarismo, que tem Ricardo Nunes, apoiado por Bolsonaro, Tarcísio (o Bolsonaro de sapatênis e candidato da mídia para 2026), Temer, Kassab e toda a turma da direita à extrema direita a seu lado.
No 1º de maio, Lula chamou a eleição de Boulos para si. Pediu a todos que votam nele desde 1994 que votassem agora em Boulos.
Boulos deve fazer o mesmo e riscar o terreno: a eleição é política.
Só para lembrar: nas últimas eleições presidenciais Lula venceu Bolsonaro na cidade de São Paulo por 47 a 38.
Tem que dizer pra quem vai governar e pra quem Ricardo Nunes governa. Marcar diferença. Criticar privatizações, que é coisa de quem não precisa do estado: os ricos.
O povo precisa de escola, saúde, habitação, segurança. Governo. E é pra ele que Boulos vai governar.
Se tentar amaciar, edulcorar a candidatura, vai servir à direita e inflar a candidatura de Tabata Amaral.
Se for pra votar num perfil tucano, o povo vai preferir votar nela, mesmo que não seja filiada ao PSDB.
Tem que riscar o chão como Brizola em 1982.
Ah, só para registrar: em 1982 Brizola se elegeu, mesmo com os adversários, a ditadura e a Globo contra ele, barrando até uma fraude eleitoral, o famoso escândalo Proconsult.