Dias antes do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) impor uma derrota ao Brasil, no 7 a 0 que livrou Sergio Moro (União-PR) da cassação do mandato, o ex-juiz da Lava Jato, que se tornou "super" ministro da Justiça de Jair Bolsonaro (PL) em 2019 após a prisão de Lula na continuidade do golpe contra Dilma Rousseff (PT) três anos antes, propagou pelo submundo político de Brasília um "grande acordo", com Alexandre de Moraes e com tudo, que preservaria seu mandato no Senado.
A informação foi tornada pública pelo ex-deputado e empresário Antônio Celso Garcia, o Tony Garcia, que conhece como poucos aquele a quem diz ter servido como "agente infiltrado na Lava Jato".
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O que era especulação tornou-se realidade diante do resultado do julgamento pela corte eleitoral na noite desta terça-feira (21).
Em um voto envergonhado diante dos fatos, o relator Floriano de Azevedo Marques chegou a citar o R$ 1 milhão recebido pelo advogado e suplente de Moro, Luis Felipe Cunha, do União Brasil para "consultoria jurídica".
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O montante começou a ser pago, com recursos do fundo partidário, um mês após Moro romper com o Podemos, jogando a toalha da disputa à Presidência, para se filiar ao União e sair candidato ao cargo que hoje ocupa no Senado Federal. Cunha foi quem fez o lobby para o troca-troca partidário de Moro.
Em seu voto, Azevedo Marques chega a falar em "crime ou de ato de improbidade" no caso. Mas, ressalta que o caso "transcende o âmbito" de atuação da Justiça Eleitoral.
O relator, portanto, passa pano para um possível crime cometido em meio à pré-campanha eleitoral, que levou ao caso que estava sendo julgado. Os demais ministros, incluindo Moraes e Carmén Lucia, do STF, seguiram o voto, sem contestar o crime ali descrito.
Moro celebrou a absolvição e o "julgamento técnico" do TSE e contou com a mídia liberal para ecoar a versão, que já domina as opiniões de "colonistas" - como diria o lendário PHA - e juristas que, dias atrás, ainda falavam das provas contundentes de abuso de poder econômico e caixa 2 durante a pré-campanha de 2022.
Com Moraes e com tudo
Em maio de 2016, às vésperas da votação do "impeachment", Dilma Rousseff (PT) denunciou o "consórcio golpista" escancarado pelo vazamento de um áudio em que o então Ministro do Planejamento Romero Jucá (MDB) diz a Sergio Machado, ex-presidente da Transpetro - subsidiária da Petrobrás -, diz que "tem que resolver essa porra. Tem que mudar o Governo para estancar essa sangria”.
Em seguida, Jucá fala da construção de um grande acordo nacional “com o Supremo, com tudo”. A gravação foi vazada 11 dias após o afastamento de Dilma pelo Congresso, quando Michel Temer assumiu o governo interino até o golpe.
Dois anos depois, Temer passaria a faixa presidencial para Jair Bolsonaro (PL), que venceu a eleição contra Fernando Haddad - enquanto Lula estava preso na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba.
Há uma semana do primeiro turno das eleições, Moro levantou o sigilo da delação em que Antonio Palocci, sem provas, acusava Lula de corrupção. Em recompensa à artilharia fornecida à horda bolsonarista, Moro deixou a magistratura para assumir o "super" Ministério da Justiça, com a promessa de Bolsonaro - negociada por Paulo Guedes - de indicá-lo a uma cadeira no Supremo Tribunal Federal (STF).
Com Guedes como avalista da mídia liberal e do sistema financeiro, Bolsonaro deu continuidade ao golpe. Mas, não calçou o sapatênis e foi limado, por pouco, na tentativa de reeleição na derrota para Lula, o maior expoente progressista da História do país.
Para vencer o fascismo, Lula teve que colocar parte da escumalha golpista na chamada Frente Ampla, que volta a se aglutinar em torno dos interesses dos endinheirados.
Golpistas unidos
Um mês antes de livrar Moro da cassação com seus pares, Moraes - que deixa a presidência do TSE em junho, abrindo espaço para o "terrivelmente evangélico" como um dos representantes do STF na corte eleitoral - rasgou elogios a Temer em homenagem ao golpista na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF).
"Foi um grande presidente. Presidente sério, trabalhador, um presidente que transitava, como presidente, e continua transitando pelos três poderes. Na história, não temos nenhum presidente que se igual ao presidente Michel Temer nas relações com os Três Poderes", disse Moraes, em ato servil de agradecimento a quem o alçou ao Supremo, no dia 3 de abril.
Um mês depois, no último dia 9, Temer aparece em uma foto simbólica, que escancara a reaglutinação golpista, que se encontrou, em parte, em um jantar na casa do milionário Luiz Pastore (MDB-ES), suplente itinerante no Senado.
Aqui cabe parênteses. Pastore declarou patrimônio de R$ 453 milhões à Justiça Eleitoral em 2022, sendo o terceiro mais rico postulante ao Senado. Atuando no submundo político, Pastore ganhou notoriedade em 2013 ao pagar US$50 mil para beijar a modelo inglesa Kate Moss, em leilão beneficente que reuniu milionários e celebridades em São Paulo. Uma das excentricidades da burguesia brasileira.
Voltando ao jantar oferecido na mansão nos Jardins em apoio à candidatura à reeleição de Ricardo Nunes (MDB) à prefeitura paulista, estavam presentes além de Temer e Pastore, nomes como Tarcísio Gomes de Freitas e o presidente do Republicanos, o pastor licenciado da Universal e deputado Marcos Pereira; Valdemar da Costa Neto, presidente do PL; Fabio Wajngarten, ex-Secom e advogado de Bolsonaro; Gilberto Kassab, presidente do PSD; Renata Abreu, que comanda o Podemos; Paulinho da Força, do Solidariedade; e o ex-comunista Aldo Rebelo, secretário de Nunes e agora no MDB.
E a Globo, hein?
Após negociar a Sabesp em seminários promovidos pelo Itaú e BTG Pactual em Nova York, Tarcísio Gomes de Freitas aterrissou no Brasil e caiu direto nos braços de Luciano Huck, que ofereceu um jantar para 15 amigos em sua mansão, entre eles o governador paulista e o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto.
Huck, que recebeu as bençãos de Paulo Guedes como presidenciável em 2016, não pretende largar a fortuna bilionária e os rendimentos da Globo e da publicidade para sujar seus sapatênis na disputa eleitoral em 2026. Mas, sinaliza que pode emprestá-los a Tarcísio, caso o capitão da reserva - outro! - deixe definitivamente o coturno, que matou 57 pessoas na operação da PM na Baixada Santista, para ser o candidato da terceira via liberal, o anti-Lula, buscado pela Globo e o sistema financeiro.
Moro, que já esteve na lista da terceira via da Globo, deve agora diversos favores pela absolvição no TSE.
Para manter o mandato, o ex-juiz contou com o apoio imprescindível de Rodrigo Pacheco (PSD), presidente do Senado, e do governador paulista, que teriam pedido a Moraes que não levasse adiante a cassação de Moro e do bolsonarista Jorge Seif Júnior, eleito com a máquina privada de Luciano Hang, o véio da Havan, e próximo a ser inocentado pela corte.
No acordo, Tarcísio conversou com Moraes e nomeou para Procuradoria-Geral de Justiça do Estado Paulo Sérgio de Oliveira e Costa. Ligado ao ministro do STF e a Temer, o procurador ficou em terceiro na lista tríplice, com 731 votos na eleição interna do Ministério Público de São Paulo (MP-SP).
Para honrar o pacto, Moro deve deixar a pecha de pato manco e mergulhar de vez na politicalha golpista - agora de forma partidária.
Processos no STF e no CNJ
Ao que tudo indica, Moro deve ter um futuro semelhante ao que ocorreu no TSE em outras duas ações: uma no Supremo, que está sob relatoria de Dias Toffoli, e outra no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), presidido por Luís Roberto Barroso.
No inquérito no STF, que apura uma série de crimes supostamente praticados por Sergio Moro com possível envolvimento de Rosangela Moro, Carlos Zucolotto, Deltan Dallagnol, Carlos Fernando dos Santos Lima, Januário Paludo e outros expoentes da Lava Jato, o ex-juiz conta com uma ajuda, digamos, caseira.
Oriunda do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), onde atuou em processos da Lava Jato, Camila Plentz Konrath foi alçada à juíza auxiliar de Toffoli nas audiências sobre a organização criminosa da chamada República de Curitiba.
Legalmente impedida de atuar em processos administrativos que tenha interesse direto ou indireto na matéria, ou que tenha participado da ação - de acordo com o artigo 18 da lei 9.784/99 -, Camila segue à frente das diligências e, segundo fontes próximas ao processo ouvidas pela Fórum, tem agido para beneficiar o senador no processo.
Já o CNJ avalia a abertura de Processos Administrativos Disciplinares (PADs) contra Moro e sua substituta, Gabriela Hardt, na correição feita pelo ministro Luís Felipe Salomão.
Para conter a abertura do PAD, o ex-juiz conta com a ação direta de Barroso, simpatizante histórico da Lava Jato, que vê "revanchismo" nas investigações de crimes pelos membros da força-tarefa.
Em 16 de abril, quando o processo entrou na pauta, Barroso reverteu a decisão que havia afastado Gabriela Hardt e Danilo Pereira - atual titular da 13ª Vara -, classificando como “ilegítima, arbitrária e desnecessária” a decisão do corregedor.
Barroso também pediu vista ao processo, que não mais voltou à pauta. Responsável pelas ações que serão debatidas, o presidente do STF - e, por extensão, do CNJ - não devolveu o processo para apreciação na sessão de 21 de maio e, tampouco, colocou na pauta da próxima reunião do colegiado, que acontece na próxima terça-feira, dia 28.
Moro conta com Barroso para arquivar o processo, se livrando de um possível inquérito do Ministério Público Federal para apurar os indícios de crime em sua conduta quando ainda desfrutava das benesses da magistratura para fazer politicagem.
Atacante da "terceira via"
No Senado, com o selo de "absolvido", o ex-juiz deve fazer eco ao fascismo bolsonarista nos ataques ao Supremo Tribunal Federal - alô, Gilmar Mendes!
Nas eleições de outubro, assim como Bolsonaro, Moro usará a narrativa de vítima da "ditadura comunista" para impulsionar candidaturas da extrema direita.
Para 2026, deve reconquistar espaços na Globo e na mídia golpista para atacar Lula de forma baixa, vil, fazendo o serviço sujo para que a caravana do candidato da "terceira via" passe.
E, para isso, não tem escrúpulos. Como já mostrou em 2018 ao levantar sigilo da delação fantasiosa de Palocci. O ex-ministro petista nunca apresentou provas da corrupção de Lula, assim como o ex-juiz nunca apresentou provas para a condenação imposta e o "setting" de prisão do atual presidente, que o tirou da disputa em 2018, com transmissão ao vivo da mídia golpista.
Passados dez anos do amargo 7 a 1 da Alemanha no jogo disputado em Belo Horizonte pela Copa de 2014 - quando Aécio Neves (PSDB) deu início ao processo golpista ao ser derrotado por Dilma nas eleições presidenciais -, o Brasil sofre uma nova derrota, de goleada.
O placar de 7 a 0 que livrou Moro da cassação mostra que o golpismo burguês neoliberal segue ativo e operante. E já tem um atacante para entrar em campo nas eleições de 2026.
*Artigo atualizado em 23/05/2024 para inserção de novas informações