PAULO CÉSAR PEREIO

Paulo César Pereio: “já fui expulso de surubas por mau comportamento”

Brasil perde um de seus atores mais geniais, rebelde incorrigível, fez mais de 60 filmes, peças de teatro, comerciais e foi o locutor da campanha da legalidade

Paulo César Pereio.Créditos: Lucas Lima/Divulgação
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Minha avó é que sempre gostava de repetir um velho ditado italiano: “se non è vero, è ben trovato”. Em bom português, “se não é verdade, é bem provável”. O fato mesmo é que, até onde se sabe, o ator Paulo César Pereio inventou a frase: “já fui expulso de surubas por mau comportamento”, com o objetivo de ilustrar melhor a sua personalidade diante de um incrédulo Jô Soares, que, é óbvio, morreu de rir.

Jô insistia em tentar arrancar do ator a sua propalada personalidade rebelde e controversa. Conseguiu. Ganhou de bandeja a célebre frase que nunca teve a sua veracidade comprovada. Mas, como diz o velho ditado, é muito provável que algo parecido tenha acontecido em sua vida.

Pereio era incorrigível e ingovernável. Bebia à cântaros, se drogava, tinha o espírito irrequieto e zero paciência para com quem quer que fosse. Brigava com diretores, colegas atores, arranjava encrenca e era, enfim, amado e odiado por onde passava. Tanto é que um documentário sobre ele dirigido em 2023, por Tasso Dourado e Allan Sieber, ganhou o precioso título de “Pereio, eu te odeio”.

A própria atriz Cissa Guimarães, que foi casada e teve dois filhos com ele, o colocou em cana por não pagar pensão alimentícia. No momento de sua morte, no entanto, publicou em suas redes uma longa mensagem afirmando que o ator foi o grande amor de sua vida.

E Pereio era isso mesmo. Apesar de chato, arrogante, mal-humorado, irascível era também talentoso, amoroso, divertido, inteligente. No mesmo Jô Soares, ele contou que foi com o carro da então esposa, a própria Cissa, comprar maconha em um morro do Rio de Janeiro. Desceu para falar com o seu “camaradinha”. Só que deixou, inadvertidamente, o carro com o breque destravado. Dia seguinte, um grande jornal do Rio de Janeiro colocou em manchete que o carro de Cissa Guimarães havia despencado morro abaixo.

Assim que foi anunciada sua morte, um sem fim de histórias e estórias sobre ele explodiram nas redes. Uma delas, divertidíssima – pra variar – foi contada pelo colega Zé de Abreu: “Causos do Pereio: um dia, uns 15 anos atrás, estou almoçando no Rodeio e ele chega. Chiquérrimo, de calças de vinco, camisa de linho e paletó! Pediu uma bebida, sentou e mandou, de prima, diante do meu espanto ao vê-lo naqueles trajes: "casei, to morando aqui em São Paulo na casa "dela". Essa roupa é do ex-marido, ele me empresta. Aliás, ele mora lá com a gente."

O melhor de tudo mesmo, no entanto, é que, a despeito de seu comportamento despudorado, Pereio foi um ator genial. Participou de mais de 60 filmes, peças e comerciais de TV e rádio. Foi um locutor espetacular. Sua voz inconfundível narrou inúmeras propagandas. Foi também, e curiosamente, um dos locutores da Rádio da Legalidade, organizada por Leonel Brizola para garantir a posse de João Goulart.

A despeito de tudo isso, ainda foi candidato derrotadíssimo a vereador pelo Rio de Janeiro e fez, pasmem, uma campanha para demolirem na cidade a estátua do Cristo Redentor.

No final de sua vida, foi morar no Retiro dos Artistas. Dizia que não estava na pindaíba, mas que morava lá por opção, por se sentir bem e seguro. Como sempre, em praticamente tudo o que dizia e fazia, era difícil saber exatamente, assim como no caso da suruba, o que era ou não verdade.