EXTREMA DIREITA

Moro e Bolsonaro juntos de novo para enfrentar a tempestade e buscar oxigênio com os liberais - por Mauro Lopes

Depois de muitas aproximações e rompimentos, Bolsonaro e Moro ensaiam união para criar uma “mini frente ampla” da extrema direita e atrair segmentos liberais contra Lula e a ofensiva do STF e TSE

Moro e Bolsonaro juntos de novo em meio à tempestade.Créditos: Marcos Côrrea | PR
Escrito en OPINIÃO el

Quando Sergio Moro estava no auge com o sucesso da Lava Jato, desprezava Jair Bolsonaro. Uma cena que ficou famosa (agora se diz que “viralizou”) aconteceu em 2017 no aeroporto de Brasília. O então juiz, todo poderoso e prestigiado pela elite liberal do país, ignorou o deputado de extrema direita ainda longe de ser candidato a presidente. A mão estendida de Bolsonaro ficou parada no ar e Moro passou reto.

Ficou o ressentimento daquele que seria, pouco mais de um ano depois, eleito presidente. Mas não foi suficiente para Bolsonaro desistir de convidá-lo para ministro da Justiça. A  relação entre eles foi sempre conturbada. Moro sonhou ser candidato à sucessão de Bolsonaro, sonhou com o STF e, se não acabou na rua da amargura, teve que se virar sozinho para, em 2022, chegar com dificuldades ao Senado pelo Paraná. 

No segundo turno, naquele ano, Moro acompanhou Bolsonaro nos debates da Band e Globo, para supostamente fornecer artilharia contra Lula. Depois, afastaram-se de novo, logo no início de 2023, quando o PL entrou com uma ação no TRE do Paraná contra Moro. Os efusivos cumprimentos de Moro a Flávio Dino na sabatina do então ministro da Justiça para a vaga no STF em dezembro passado arruinaram o prestígio de Moro na base bolsonarista, que considerou o gesto uma traição. 

Agora, os dois estão fumando cachimbo da paz mais uma vez, num momento de grande dificuldade para ambos. Um deve ir para a cadeia, o outro pode perder o mandato. 

O primeiro gesto foi de Bolsonaro, que pressiona o PL a desistir da ação contra Moro no TRE do Paraná. Além disso, o ex-presidente informou a Moro que sua esposa, Michelle, não tem interesse numa eventual eleição suplementar ao Senado no Paraná. 

Michelle não quer ser candidata ao Senado pelo Paraná. Está decidida a se candidatar ao Senado em 2026 por Brasília, com apoio de Bolsonaro. Ela e o marido consideram que a eleição é praticamente certa, com duas vagas em disputa. Eleita, fará dupla com Damares Alves, tornando-se as duas um polo irradiador da luta ideológica da extrema direita. Além disso, Michelle, que nasceu em Brasília, não quer trocar a cidade por Curitiba -nem Bolsonaro. Desejam manter-se próximos do centro do poder.

Pode ser um abraço de afogados. Mas o cálculo de Bolsonaro é que, ao trazer Moro para perto, unifica toda a extrema direita, apropria-se do discurso contra corrupção e pode articular uma “mini frente ampla” contra o governo Lula. A intenção é romper o isolamento e voltar a aproximar-se de segmentos liberais (ou da direita tradicional) que o apoiaram em 2018 e ao longo de quase todo seu mandato. 

Nos últimos dias, de fato, os editoriais de O Globo e do Estadão e alguns de seus colunistas levantaram-se em defesa de Moro no processo em curso em Curitiba. Se a frente Bolsonaro-Moro conseguir rachar minimamente a frente ampla que Lula costurou para eleger-se, podem aumentar seu poder de fogo e acumular forças para sair da situação crítica em que se encontram. 

Vale lembrar que até recentemente, a direita (ou os liberais) estava ferrenhamente alinhados com Lula. O Globo, especialmente, tornou-se uma espécie de porta-voz extraoficial do governo, com uma evidente ordem unida de todo seu corpo jornalístico e editorial. Em troca, recebeu do governo Lula verbas e preferência absoluta nas entrevistas, informações exclusivas e furos de reportagem. Entretanto, desde o início do governo, em que pese o apoio ao governo, a mídia liberal (e não apenas o Globo) nunca deixou de apresentar, de maneira até afrontosa, suas posições ao governo e exigir do governo Lula compromisso, por exemplo, com o déficit zero nas contas públicas. Nunca renunciaram a disputar a hegemonia no interior da frente ampla, mas estavam solidamente atadas ao projeto político-institucional lulista. Há sinais de que segmentos desta mídia -e seus correspondentes econômicos e políticos- podem ir desgarrando-se aos poucos. 

A aposta da unidade Bolsonaro-Moro é que a reunificação dos dois pode acelerar esse processo, capturar segmentos liberais para seu projeto e ganhar oxigênio. O discurso “contra a corrupção”, um clássico da direita, já começa a sair das gavetas. O alvo inicial é o chefe da Casa Civil, Rui Costa; a campanha está apenas começando.

A primeira indicação desta reaproximação Bolsonaro-Moro apareceu na manhã desta quarta-feira (3) numa reportagem da jornalista Bela Megale em O Globo. Nela, registrou o movimento de Bolsonaro para fazer o PL desistir da ação contra Moro. Fiquei intrigado com a informação. Uma fonte no grupo de Moro confirmou a reaproximação. Ao longo do dia, conversei com uma raposa política de Brasília, com mandato no Congresso, que observa atentamente cada movimento. Ele não é de extrema direita, está num campo que pode-se chamar genericamente de democrático. E observou: “eles estão se unindo de novo, meio no desespero, mas estão. Quando estavam no auge do poder, puderam dispensar um ao outro em momentos diferentes, mas agora não podem dar-se a esse luxo”.

A ver se o movimento terá efeitos no cenário político brasileiro.