OPINIÃO

Relações entre Alemanha e sionismo: passado e presente - Por Francisco Fernandes Ladeira

Berlim tem interesse econômico direto no êxito das atividades do exército israelense e seu constante estado de guerra contra os palestinos

Benjamin Netanyahu com soldados israelenses.Créditos: Twitter / Benajmin Netanyahu
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Quando se fala sobre as relações entre Alemanha e sionismo, a maioria das pessoas lembra do Holocausto, quando milhões de judeus foram mortos pelos nazistas, no contexto da Segunda Guerra Mundial. De fato, trata-se de um acontecimento histórico incontestável. Porém essa associação apresenta duas generalizações equivocadas. Primeiro: “Alemanha”, evidentemente, não é sinônimo de “nazismo”. Segundo erro: o movimento sionista, doutrina que está por trás da criação do Estado de Israel, não representa o povo judeu (embora se apresente como tal).

Para compreender as (complexas) relações entre Alemanha e sionismo, no passado e no presente, recorrerei às explicações do presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal), Ualid Rabah, feitas em entrevista para o programa “Do Rio Ao Mar”, do Portal Desacato. Ao contrário do que muitos ainda podem pensar, não havia antagonismos entre nazistas e sionistas; ambos apresentavam um objetivo em comum: a saída dos judeus do continente europeu.

Aliás, as ideias supremacistas de Hitler e companhia inspiraram o próprio andamento do Estado de Israel (no caso, a premissa de uma suposta superioridade dos judeus europeus, “civilizados”, sobre os árabes palestinos “selvagens”). As palavras de Theodor Herzl, fundador do sionismo político, sobre o Estado judeu representar para a Europa a sentinela avançada da civilização contra a barbárie asiática não deixam dúvidas sobre essa questão.

Mas as aproximações entre sionistas e nazistas foram além de afinidades ideológicas. Em 1933, a Confederação Sionista da Alemanha selou um acordo com o Partido Nazista para que fosse permitido a uma elite alemã de fé judaica a prerrogativa de migrar para a Palestina, com intuito de colonizar a região (a despeito dos palestinos que lá moravam há milênios). Como contrapartida, os sionistas se comprometeram a adquirir equipamentos, produtos e mercadorias alemãs. “Naquele momento, no mundo, principalmente entre judeus estadunidenses, já havia um pedido de boicote à Alemanha, já farejando o perigo que viria, e veio”, apontou Ualid Rabah. Os sionistas, por sua vez, se silenciaram sobre esse assunto.

Chegando ao presente contexto, temos observado nos noticiários que o Estado alemão tem se apresentado como um dos principais aliados de Israel, seja reprimindo qualquer tipo de manifestação popular contrária ao genocídio promovido pelos sionistas na Faixa de Gaza, seja proibindo a entrada em seu território de ativistas favoráveis à causa palestina.

Segundo Ualid, essa defesa possui pelo menos dois pontos essenciais, ligados a interesses militares e diplomáticos. Para o presidente da Fepal, o papel alemão na indústria armamentista mundial ainda é pouco conhecido; um debate praticamente invisibilizado. A Alemanha é o segundo maior fornecedor de armamentos, sistemas e munições para Israel (atrás apenas do aliado histórico Estados Unidos). Consequentemente, Berlim tem interesse econômico direto no êxito das atividades do exército israelense e seu constante estado de guerra contra os palestinos. Além disso, a própria existência do Estado de Israel significa uma espécie de “quitação” da dívida histórica alemã com o povo judeu, devido aos horrores ocorridos durante a Segunda Guerra Mundial (novamente aqui há a falsa equivalência entre sionismo e judeus).

Portanto, como conclui Ualid Rabah, essa simbiose histórica entre elites alemãs e sionismo – seja com os autoritários nazistas de outrora ou com os supostamente democratas do presente – representa uma “associação criminosa contra a humanidade”. E a principal vítima dessa nefasta aliança é o povo palestino.

*Francisco Fernandes Ladeira é doutorando em Geografia pela Unicamp.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.