OPINIÃO

Caroline de Toni, Nikolas Ferreira e o elogio da ignorância - Por Francisco Fernandes Ladeira

Os conservadores desejam conservar hábitos e costumes de outras épocas, que qualificam como “bons tempos”. Nesse sentido, eles poderiam pleitear para que as pessoas voltassem a ter vergonha em demonstrar sua estupidez em público

Caroline de Toni (PL-SC) e Nikolas Ferreira (PL-MG).Créditos: Reprodução/X e Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
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Na última quarta-feira (6), fomos surpreendidos negativamente com as escolhas dos parlamentares bolsonaristas Caroline de Toni (PL-SC) e Nikolas Ferreira (PL-MG) para presidirem, respectivamente, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e a Comissão de Educação na Câmara dos Deputados. Na grande mídia, como o objetivo da linha editorial política predominante sempre é atacar o PT, estas escolhas foram noticiadas como “derrota do governo”, quando, de fato, trata-se de uma “derrota do país”, haja vista que falamos de duas figuras nefastas, conhecidas por seus discursos de ódio e práticas perversas.

Integrante da bancada do agronegócio e armamentista convicta, que entende de “justiçamento” mas não de “justiça”, Caroline, ao comentar sobre a decisão do STF, que tornou a tese do Marco Temporal inconstitucional, chegou a apontar que “a relativização da propriedade privada” levaria a um “banho de sangue” de indígenas.

Já Nikolas, que nunca apresentou qualquer tipo de projeto sobre o tema da comissão que irá presidir, tem em seu currículo a exposição constrangedora de uma adolescente trans em vídeo divulgado nas redes sociais.

Até aqui, nenhuma novidade, pois “extrema direita”, “discursos de ódio” e “práticas perversas”, historicamente, fazem parte do mesmo campo lexical. No entanto, o que nos chama atenção, não apenas nos dois deputados citados neste artigo, mas em toda a extrema direita bolsonarista, é a inclusão de um novo componente, que não estava tão presente nos setores conservadores de outrora: a estupidez exacerbada. Afinal de contas, nomes como Plínio Salgado e Enéas Carneiro, apesar de suas ideias controversas, pelo menos tinham certo apreço por livros e pelos estudos.

Se, no século XVI, Erasmo de Roterdã lançou seu “Elogio da Loucura”, o bolsonarismo tem o “Elogio da Ignorância” como lema. Não por caso, na obra “A filosofia explica Bolsonaro”, o professor Paulo Ghiraldelli fala em “fascismo incultural” (como contraponto ao inexistente “marxismo cultural”).

Seguindo as diretrizes do “fascismo incultural”, Nikolas Ferreira, em uma live no YouTube, afirmou não se importar se a Terra é plana, oval ou quadrada. “Nunca nem parei para estudar isso, de verdade, eu não me importo”, admitiu o parlamentar mineiro. Ou seja, um terraplanista enrustido.

Não será estranho se, em sua atuação como presidente da Comissão de Educação, ele levantar questões como o projeto “Escola sem partido” – contra a suposta “doutrinação comunista” feita por professores – e a adoção do homeschooling, para que os patriotas possam, enfim, ensinar seus filhos sobre terraplanismo e globalismo, entre outros “ismos” do “fascismo incultural”.

Por sua vez, na CPI do MST, Caroline de Toni atacou os trabalhadores rurais sem terra a partir de argumentos baseados nas fontes “vozes de minha cabeça” e “grupos de zap bolsonaristas”. Levou uma histórica invertida do professor José Geraldo de Sousa Junior. “Eu não tenho como discutir com a deputada, porque sua visão de mundo, sua percepção só lhe permite enxergar o que a senhora já tem escrito na sua cognição. A senhora vai ver não o que existe, mas o que a senhora recorta da realidade”, disse o docente.

Em outros termos, uma maneira eufêmica e elegante de chamá-la de “burra”. Como nada é tão ruim que não possa piorar, a parlamentar do PL é discípula de ninguém menos do que Olavo de Carvalho, o guru do “fascismo incultural”, segundo Paulo Ghiraldelli. Inclusive, ela já chegou a protocolar um projeto para incluir o astrólogo (que se achava filósofo) no livro dos Heróis da Pátria.

Como a própria nomenclatura sugere, os conservadores desejam conservar hábitos e costumes de outras épocas; o que qualificam como “bons tempos”. Nesse sentido, eles poderiam pleitear para que as pessoas voltassem a ter vergonha em demonstrar sua estupidez em público.

Conforme os fatos nos mostram, não farão isso: têm orgulho de sua ignorância. Assim, não se intimidam em destilar seus ressentimentos e ódios à ciência, às artes, aos professores, aos intelectuais, às escolas e às universidades. Em suma, desprezam tudo o que remeta ao conhecimento e ao pensamento crítico.

*Francisco Fernandes Ladeira é doutorando em Geografia pela Unicamp.

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Revista Fórum.