O novo governo do prefeito Ricardo Nunes mal começou, mas os 45 dias iniciais, entre novembro e dezembro, já foram tumultuados para o atual mandatário da capital paulista. Com uma média de uma medida barrada por semana, somada a recuos estratégicos e propostas amplamente criticadas pela população, o cenário revela uma administração desarticulada e alheia às demandas da sociedade paulistana.
Derrotas judiciais
Entre as derrotas judiciais, a de maior destaque é a suspensão das obras de um túnel na Rua Sena Madureira. O projeto, absolutamente equivocado e ultrapassado, foi interrompido por três liminares judiciais — duas movidas pelo Ministério Público, nas áreas de meio ambiente e urbanismo, e outra pela vereadora Luna Zarattini (PT) e pelo deputado Eduardo Suplicy (PT). As ações apontaram impactos ambientais significativos, remoções negligenciadas das comunidades Souza Ramos e Luis Alves e erros na justificativa do projeto, que tende a agravar o trânsito da região em vez de melhorá-lo.
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Outra derrota de Ricardo Nunes foi a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de exigir que a concessionária dos cemitérios municipais voltasse a cobrar os valores praticados antes da concessão. A ação, movida pelo PCdoB, questionou a terceirização dos cemitérios, realizada em 2023, que gerou uma alta exponencial nas tarifas, com alguns serviços chegando a triplicar de preço.
O impedimento do projeto de construir um incinerador de lixo em São Mateus foi a derrota mais recente de Nunes. Além de ser inacreditável que um prefeito queira construir um incinerador de lixo em pleno 2024, a ideia ainda previa o corte de mais de 10 mil árvores. A suspensão foi resultado de uma ação movida pelos vereadores Helio Rodrigues e Nabil Bonduki, do PT. A proposta, no entanto, ainda demanda atenção, pois envolve um projeto de lei que está tramitando na Câmara, então o prefeito precisará convencer sua base se quiser que essa atrocidade seja aprovada.
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O Programa Reencontro, bastante citado pelo prefeito em sua campanha eleitoral e destinado a pessoas em situação de rua ou vulnerabilidade, também foi paralisado pela justiça. O Tribunal de Justiça de São Paulo considerou ilegal a forma como o projeto foi aprovado: mais uma vez com uma manobra antidemocrática na Câmara, em que um “jabuti” foi aprovado sem nenhuma discussão pública, semelhante ao ocorrido com o corte de gratuidade dos idosos em 2020.
Recuos e desistências
Além das derrotas judiciais, a pressão popular fez o governo Nunes recuar em propostas que sequer chegaram aos tribunais. O caso que ficou mais famoso foi a tentativa estapafúrdia de conceder o Largo da Batata à marca de salgadinhos Ruffles, que, ao explorar comercialmente o espaço público, associaria o nome da marca ao largo em suas páginas. A proposta foi muito criticada nas redes sociais e na imprensa, o vereador eleito Nabil Bonduki (PT) também identificou irregularidades no processo, e a repercussão levou a prefeitura a recuar em menos de dois dias.
Outro recuo relâmpago foi a tentativa de adiar o prazo para a eletrificação da frota de ônibus. Apesar de o prefeito se vangloriar dos 200 ônibus elétricos em circulação, esse número é menos de 10% do necessário para atingir as metas da legislação em vigor. O governo tentou aprovar discretamente o Projeto de Lei 825/24 para adiar esse prazo em mais 16 anos! Outra vez, diante da repercussão negativa, após a descoberta da manobra o governo recuou em menos de dois dias.
O debate sobre o PL 825 na Câmara foi bastante discreto. O prefeito Ricardo Nunes fez vista grossa, deixando o Vereador Milton Leite (União), presidente da casa, com todo o ônus da discussão. O projeto de lei ainda está ruim, pois flexibiliza o prazo para os próximos anos, liberando o prefeito Ricardo Nunes de qualquer risco judicial, mas o prazo final de 20 anos foi mantido. Nunes adotou postura semelhante em relação ao projeto de emenda que liberaria prédios nas zonas residenciais. Este projeto se alinha muito a ideologia de desregulamentação do seu governo, mas foi tocado apenas pelo vereador Isaac Felix (PL), da base do governo, que também recuou da proposta.
Outras propostas criticadas
A quantidade de propostas paralisadas em tão pouco tempo mostra a incapacidade de Ricardo Nunes em definir bons projetos para a cidade, bem como em debater com a população e respeitar os espaços de participação e os ritos democráticos, inclusive na Câmara. Outras ideias do prefeito têm os mesmos problemas, mas ainda não chegaram a ser publicadas ou ainda estão no início, portando ainda não foram combatidas devidamente.
A mais grave talvez seja a ideia de extinguir a SPTrans. Não faz sentido deixar de ter um órgão dedicado ao controle do transporte coletivo, peço planejamento de corredores de ônibus e pela operação do Bilhete Único. Dividir suas funções entre a SP Regula e a Secretaria de Transportes enfraquecerá o controle público e dará mais força para os empresários – o que, no atual momento, enfraquece o combate ao PCC.
Ainda na área da mobilidade, nas próximas semanas deve se concretizar uma proposta de aumento abusivo de tarifa. Afinal, Nunes se recusa a organizar o subsídio dos ônibus ou considerar o impacto da tarifa na vida da população. A proposta de privatização das ciclovias é outra medida que, além de prejudicar o acesso das pessoas às ciclovias, não demonstra viabilidade prática. O projeto já começa a receber críticas e mobilizar a oposição de vereadores como Toninho Vespoli (Psol) e Renata Falzoni (PSB). A suspensão constante dos programas ‘Ruas Abertas’ e ‘Ciclofaixa de Lazer’ também receberam muitas críticas e tem gerado confusão pela falta de informação e organização das mudanças nas linhas de ônibus.
O balanço das últimas semanas é alarmante! A lista de projetos mal elaborados e políticas ultrapassadas crescem, sem mencionar as suspeitas de corrupção como a investigação sobre a Máfia das Creches e as denúncias de aluguel pago por ex-diretor em apartamento de empreiteiro. Esse cenário antecipa o que se pode esperar dos próximos anos do governo Nunes: projetos mal feitos, falta de preocupação social e ambiental, atropelos nos debates e suspeitas de irregularidades.
A Sociedade Civil precisará estar mobilizada e organizada para enfrentar esses e outros ataques. A esquerda, principalmente na Câmara Municipal, deve inovar em sua atuação para barrar esses erros e propor uma nova visão de cidade para São Paulo. Serão anos de muito trabalho.
*Este artigo não reflete necessariamente a opinião da Fórum