Desde que apareceu no cenário político brasileiro, ao liderar as históricas greves dos metalúrgicos no ABC paulista, no final dos anos 70, Luiz Inácio Lula da Silva (ou simplesmente Lula), maior líder popular do país, tem sido alvo privilegiado do ódio da elite econômica e, consequentemente, de sua tropa de choque: a classe média.
Como Lula não pôde completar o antigo primário (equivalente ao atual ensino fundamental I) e não falava o chamado “português correto”, a primeira alternativa discursiva para deslegitimar o então líder sindical foi rotulá-lo como "ignorante".
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Décadas depois, nas eleições presidenciais de 1994 e 1998, esse discurso elitista foi resgatado: o “ignorante” Lula era o antagonista ao “intelectual” Fernando Henrique Cardoso (FHC). Assim, elite e classe média poderiam se orgulhar de ter um doutor como político favorito.
No entanto, após o reconhecimento de Lula no principal ambiente legitimador do saber (a universidade) e seus mais de trinta títulos Doutor Honoris Causa, tornou-se difícil sustentar o discurso “Lula ignorante”.
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Na impossibilidade de tachar Lula como “ignorante”, farsas jurídico-midiáticas, como a Ação Penal 470 (o “Mensalão”) e a Operação Lava Jato, ofereceram os subsídios necessários para colar uma nova alcunha ao atual presidente: “ladrão”. Tratou-se de uma narrativa que contou com ampla adesão dos integrantes da classe média (autointitulados “guardiões da moralidade”).
Conforme é do conhecimento de todos, as condenações de Lula na Lava Jato foram deslegitimadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Desse modo, exceto para aqueles indivíduos mais aloprados (que passam o dia compartilhando fake news em grupos de WhatsApp), atualmente pega mal chamar Lula de “ladrão” (e não apresentar provas que corroborem tal afirmação).
Já o último grande adversário político de Lula não é “intelectual” como FHC, mas (o inculto) Bolsonaro (apoiado por elite e classe média na última eleição presidencial). Nesse sentido, chamar Lula de ignorante significava expor as próprias debilidades cognitivas do principal nome da extrema direita brasileira.
Diante desse cenário, com o intuito de criar uma falsa simetria entre Lula e Bolsonaro, foram requentados os discursos do Lula “comunista” e “radical” (mesma estratégia utilizada por Collor, na eleição presidencial de 1989).
De acordo com essa linha analítica, se Bolsonaro é um político com ideias de extrema direita, com aspirações ditatoriais e golpistas; Lula, por sua vez, representaria a mesma ameaça aos preceitos democráticos, porém do lado oposto do espectro ideológico: à “extrema esquerda”. Consequentemente, tentou-se abrir espaço para a chamada “terceira via”: não radical, moderada e supostamente democrática. Como vimos, tal estratégia fracassou.
Fato é que, em mais de quatro décadas de atividade política, Lula não foi aceito por elite e classe média; no máximo, “tolerado” em determinados períodos. Sua origem pobre desperta o ódio de classes. Sua fala simples é motivo de preconceito linguístico. Ser nordestino o faz alvo de xenofobia regional.
Entretanto, o grande “erro” de Lula (e de sua sucessora, Dilma Rousseff) foi ter promovido a maior ascensão social coletiva que o Brasil já conheceu. Para as (escravocratas) elite e classe média, foi muito difícil ver pobres em aeroportos, pretos em universidades públicas, empregadas domésticas com direitos trabalhistas e médicos cubanos atendendo, gratuitamente, populações periféricas e do campo. Lula jamais será perdoado por tamanha ousadia.