A designer brasileira Tania Bulhões enfrenta uma grave crise de imagem após consumidores descobrirem que porcelanas vendidas como itens de luxo no Brasil são encontradas no exterior por valores muito menores.
O caso teve início quando a influenciadora Izadora Palmeira publicou um vídeo no TikTok, no dia 14 de janeiro, mostrando uma xícara idêntica à da coleção Marquesa, da marca Tania Bulhões, sendo usada para servir um café em um local simples e por apenas R$ 5 na Tailândia. No Brasil, o mesmo item custa R$ 210. O vídeo viralizou e gerou grande repercussão nas redes sociais.
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No dia 16 de janeiro, a Revista Fórum entrou em contato por email com a empresa Tania Bulhões e pediu um posicionamento sobre o conteúdo do vídeo que viralizou nas redes sociais.
Em resposta, no dia 17 de janeiro, a gerente de experiência do cliente Simone Nunes respondeu por email:
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“Todos os nossos produtos são desenvolvidos pelo nosso time de desenvolvimento de produtos, liderado por Tania Bulhões. Nossas porcelanas não são produzidas na Tailândia.”
A reportagem da Fórum insistiu em buscar mais informações e questionou como a empresa avalia a semelhança entre as peças como mostrado no vídeo. Perguntou também onde e por qual empresa são produzidas as peças da marca? É uma empresa brasileira? A Tania Bulhões não importa produtos?
Como resposta, a gerente encerrou o diálogo:
“Isso é tudo o que temos a dizer sobre o assunto."
Mas a versão de Tania Bulhões mudou quando foi acionada pela coluna Monica Bergamo, da Folha de S.Paulo do dia 4 de fevereiro.
A marca afirmou à Folha que um parceiro comercial vendeu, sem autorização, sobras defeituosas da coleção de xícaras Marquesa em mercados externos.
"Um de nossos parceiros, sem nossa autorização, vendeu no mercado local sobras de produção com defeito, algo que nunca esteve alinhado com os padrões da marca", disse à coluna.
Raspando o verniz: xícara revela mais um segrego
A polêmica ganhou novos contornos quando a influenciadora Isa Rangel divulgou um vídeo no Instagram no qual sua amiga, a nutricionista Juliana Scorsi, raspou a parte inferior de um pires da coleção Camomila e encontrou um logotipo indicando fabricação na Turquia. Rangel ironizou a situação ao comparar os preços praticados pela marca:
"Você prefere comprar na Tania Bulhões pagando R$ 210 por uma única xícara que vem numa caixa bonita? Ou prefere pagar passagem, estadia, a xícara e o conjunto inteiro na Turquia, voltar para casa e ainda sair mais barato?", provocou.
Em entrevista à Folha Juliana Scorsi afirmou que comprou o pires diretamente no site oficial da Tania Bulhões.
"A parte de baixo era muito pintada, parecia que escondia algo. Eu não teria coragem de raspar, mas meu marido quebrou o pires, então, resolvi olhar", disse.
O vai e vem de Tania Bulhões
No dia 5 de fevereiro, a empresa veiculou um comunicado nas redes sociais com a mesma mensagem da resposta dada à Fórum atestando que todas as coleções, inclusive a que está no centro da polêmica, foram criadas por Tania e pelo time de design e fabricada por um parceiro.
Três dias depois, no dia 8 de fevereiro, voltou a se manifestar, reconhecendo problemas e anunciando a descontinuação de algumas coleções, incluindo a Marquesa.
O vai e vem da marca de luxo não para por aí. No dia 4 de fevereiro, a empresa enviou uma notificação extrajudicial à influenciadora Isa Rangel após a publicação do vídeo que revelou que na parte inferior de um pires da coleção Camomila foi encontrado um logotipo indicando fabricação na Turquia.
A empresa exigiu a remoção do vídeo e a publicação de um comunicado oficial, alegando que as informações divulgadas eram caluniosas. No entanto, Rangel se recusou a apagar a publicação, afirmando que apenas repercutiu um conteúdo já viralizado e que sua abordagem teve tom humorístico e teatral.
Agora, depois que a polêmica tomou enormes proporções, a empresa resolveu agradecer à exposição do problema que quis varrer para debaixo do tapete.
“Gostaríamos de expressar nosso profundo agradecimento aos clientes que trouxeram essa questão à tona, em especial à cliente que inicialmente compartilhou o tema no TikTok. A visibilidade desse episódio foi essencial para que pudéssemos tomar as ações necessárias”, escreveu a marca, sem deixar claro se o "agradecimento" é para Izadora Palmeira ou Isa Rangel.
Marca queridinha de Michelle Bolsonaro
Em julho de 2021, enquanto acompanhava o então presidente Jair Bolsonaro durante uma internação hospitalar, a ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro compartilhou em suas redes sociais um presente que havia recebido do amigo e maquiador Agustin Fernandez: um conjunto de xícaras da marca de luxo Tania Bulhões.
As peças, pertencentes à coleção Mediterrâneo, eram compostas por xícaras verdes com detalhes em ouro, cada uma avaliada em R$ 145. Michelle expressou sua satisfação ao comentar: "A cara da riqueza".
Tania Bulhões já foi condenada por fraude
Em novembro de 2010, a empresária Tania Bulhões foi alvo da Operação Porto Europa, conduzida pela Polícia Federal. A investigação revelou um esquema de fraude em importações, no qual a empresária utilizava empresas de fachada para subfaturar mercadorias e reduzir o pagamento de impostos.
A empresária foi condenada pela Justiça Federal a quatro anos de reclusão, pena convertida em restrições de direitos e pagamento de R$ 1,7 milhão a instituições de caridade.
A decisão foi proferida pelo juiz Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Federal Criminal de São Paulo, em razão de crimes de falsidade ideológica, descaminho, formação de quadrilha e crimes contra o sistema financeiro nacional.
Além da multa, Tânia ficou proibida de viajar ao exterior por mais de dez dias sem autorização judicial e foi determinado que ela prestasse serviços comunitários na Fundação Dorina Nowill para Cegos, cumprindo oito horas semanais.
A condenação decorreu de um esquema de fraude em importações de artigos de luxo entre 2004 e 2006. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), a empresária utilizava empresas intermediárias para ocultar o verdadeiro comprador das mercadorias, reduzindo a tributação. O esquema incluía subfaturamento de importações e fraude cambial, levando à evasão de divisas.
Diante das acusações, Tania fez um acordo de delação premiada, confessando sua participação e fornecendo informações sobre o esquema. Com isso, o processo contra ela foi extinto, mas outros 12 réus continuam sendo investigados.
Em nota divulgada à época da condenação, a defesa de Tania Bulhões afirmou que recebeu a sentença com serenidade e classificou o caso como um episódio pontual, alegando que envolveu apenas uma das empresas do grupo.
Crise ameaça reputação da Tania Bulhões
A recente polêmica envolvendo a marca Tania Bulhões representa um golpe na credibilidade da empresa, que atua em um segmento onde exclusividade, autenticidade e transparência são essenciais. O escândalo sobre a origem das porcelanas e os preços praticados levanta questionamentos sobre o valor real dos produtos, impactando diretamente a disposição dos consumidores em pagar pelos itens da grife.
A descoberta de que xícaras vendidas no Brasil por R$ 210 podem ser encontradas no exterior por valores irrisórios compromete a percepção de raridade e sofisticação da marca. A crise se intensifica com o vai e vem nos comunicados oficiais, que sugerem falta de controle sobre a produção e alimentam a desconfiança do público.
O dano pode ir além da perda de vendas imediatas. Consumidores fiéis podem abandonar a marca, enquanto lojas multimarcas e distribuidores podem rever parcerias temendo prejuízos à própria reputação. Caso a polêmica continue, a empresa pode enfrentar ações judiciais por propaganda enganosa e investigações de órgãos de defesa do consumidor.
A recuperação da Tania Bulhões dependerá da forma como a empresa gerencia a crise. Apenas comunicados institucionais não serão suficientes para conter o impacto negativo. Se não adotar medidas eficazes de transparência e reposicionamento, a marca pode ver seu status no mercado de luxo ruir de vez.