Mudanças climáticas ameaçam os morcegos. E isso pode afetar sua alimentação

Essenciais para manter ecossistemas saudáveis, os mamíferos alados já têm seus hábitos afetados pela ação humana; entenda os riscos e consequências

Créditos: NPS, Domínio Público, via Wikimedia Commons
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Embora para muitos eles possam parecer animais assustadores, os morcegos são essenciais para manter ecossistemas saudáveis. Afinal, ele são responsáveis por controlar insetos nocivos, polinizar plantas e dispersar sementes em diversas regiões do planeta. Mas uma de suas principais estratégias de sobrevivência está em risco por conta das mudanças climáticas.

"Assim como os ursos e os esquilos, os morcegos ao redor do mundo se fortalecem para superar momentos difíceis, mesmo em lugares onde você menos espera", explica o professor de Ecologia de Vida Selvagem da Universidade Murdoch, na Austrália, Nicolau Wu, em artigo publicado no The Conversation.

Em um artigo publicado na Ecology Letters, ele e seu grupo de pesquisadores analisam dados de estudos com morcegos ao redor do mundo para entender como eles usam a gordura corporal para sobreviver aos desafios sazonais, seja um inverno congelante ou um período de seca.

Embora a lógica possa levar a crer que a engorda sazonal seja uma estratégia utilizada em climas frios, isso acontece também com os animais que vivem nas regiões tropicais. 

Engorda sazonal

"Descobrimos que morcegos em regiões mais frias previsivelmente ganham mais peso antes do inverno", conta Wu. "Mas em regiões mais quentes com chuvas sazonais intensas, como savanas tropicais ou florestas de monções, os morcegos também engordam. Em áreas tropicais, o inimigo não é o frio, mas a estação seca, quando as flores murcham, os insetos desaparecem e a energia é escassa."

Ele pontua que a extensão da engorda é impressionante. "Algumas espécies aumentaram seu peso corporal em mais de 50%, o que representa um fardo enorme para animais voadores que já consomem muita energia para se locomover. Isso destaca o delicado equilíbrio que os morcegos realizam entre armazenar energia e se manterem ágeis no ar."

Contudo, o estudo aponta para uma tendência preocupante. Morcegos em regiões quentes parecem estar aumentando suas reservas de gordura ao longo do tempo e isso pode ser um sinal precoce de como as mudanças climáticas estão afetando sua sobrevivência.

"As mudanças climáticas não se limitam ao aumento das temperaturas. Elas também tornam as estações do ano mais imprevisíveis", diz o pesquisador. "Os morcegos podem estar armazenando mais energia antes das estações secas, que estão se tornando mais longas ou mais difíceis de prever. Isso é arriscado, pois significa mais forrageamento, mais exposição a predadores e potencialmente maior mortalidade."

Cadeias alimentares ameaçadas

A pesquisa mostra que os morcegos não são apenas vítimas passivas das mudanças ambientais, mas também estrategistas ativos, perfeitamente sintonizados com os ritmos sazonais. "No entanto, sua capacidade de adaptação tem limites, e esses limites estão sendo testados por um mundo em rápida transformação", pontua Wu.

As implicações de uma redução no número de morcegos podem se espalhar. Eles ajudam a regular populações de insetos e fertilizam plantações. Se suas estratégias de sobrevivência falharem, cadeias alimentares inteiras poderão sentir os efeitos.

Em 2021, um estudo inédito de pesquisadores brasileiros estimou que morcegos urbanos geram uma economia por hectare de US$ 94 dólares ao comerem lagartas que atacam milharais no Distrito Federal e que são combatidas com agrotóxicos. O montante poupado a cada safra, conforme a pesquisa seria de US$ 3,19 milhões, ou quase R$ 18 milhões.

“Nossa estimativa é conservadora, pois olha apenas para o milho. Se morcegos abrigados nas cidades consomem tantas pestes de cultivos com grande importância econômica, imagine o papel de espécies que vivem ainda mais perto das áreas rurais”, destacou a pesquisadora da Universidade Federal de Brasília (UnB), Ludmila Aguiar, na revista PLOS One.

Nos EUA, devido ao fato de as pragas de insetos serem eliminadas pela predação de morcegos, o valor estimado dos mamíferos alados como resultado da redução dos custos de aplicações de pesticidas está na faixa de US$ 3,7 a US$ 53 bilhões por ano.

Em suma, a ausência de morcegos pode causar explosão de pragas, com aumento no número de insetos, deixando plantações agrícolas mais vulneráveis e elevando o uso de pesticidas e agrotóxicos, além de causarem desequilíbrio em coberturas florestais pela redução da polinização. 

 

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