DEGRADAÇÃO AMBIENTAL

Pará, sede da COP-30, é o estado mais exposto a riscos climáticos entre regiões mineradoras

Estudo inédito revela como a mineração está intensificando a degradação ambiental e os conflitos sociais no estado que irá receber a maior conferência sobre clima

Ibama desativa máquinas de garimpo ilegal na Terra Indígena Munduruku, no Pará.Créditos: Vinícius Mendonça/Ibama
Escrito en MEIO AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE el

Um relatório inédito, divulgado nesta quarta-feira (23), aponta que o Pará, estado que irá sediar a COP-30, principal evento de debate sobre mudanças climáticas, é o mais exposto aos riscos climáticos cumulativos da mineração no Brasil.

Feito pelo Observatório da Mineração em parceria com o Mission Climate Project, da Inglaterra, o estudo “Riscos Climáticos Cumulativos Para Minerais de Transição no Brasil” revela que a atividade mineradora, em conjunto com a crise climática, tem aumentando a insegurança hídrica, exposto comunidades a eventos climáticos cada vez mais extremos e aumentado os riscos socioambientais nos principais estados mineradores, como Pará, Minas Gerais, Goiás e Bahia.

O documento tem como objetivo mostrar o paradoxo que se revela no fato do Pará ser o estado-sede da principal conferência sobre o clima, enquanto a extração industrial acelera o desmatamento e ameaça comunidades locais. 

“Enquanto o mundo se prepara para a COP-30 em Belém, precisamos encarar que a corrida pelos chamados minerais críticos está acelerando a crise climática na Amazônia. Precisamos agir agora para garantir um planeta habitável para as próximas gerações”, disse Gabriela Sarmet, consultora do Observatório da Mineração. “Esse relatório mostra que estamos colocando em risco a segurança climática planetária para participar dessa disputa geopolítica por minérios que, na realidade, está criando zonas de sacrifício no Brasil para atender à demanda de descarbonização do Norte”.

O Observatório da Mineração ainda destacou que o Brasil enfrenta uma pressão crescente para expandir as atividades de mineração em áreas críticas de biodiversidade. "Essa expansão tem um custo que está colocando em risco comunidades e ecossistemas inteiros. O relatório ressalta a necessidade urgente de medidas de adaptação climática, supervisão regulatória e maior proteção às comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas".

Impactos climáticos em projetos de mineração

O estudo cita os principais impactos climáticos resultantes das atividades de mineração nos estados investigados. São eles: 

  • Temperaturas extremas;
  • Calor fora de época;
  • Perda anual de chuvas;
  • Dias secos consecutivos;
  • Fortes chuvas fora de época;
  • Dias úmidos consecutivos.

A pesquisa citou algumas consequências ambientais e sociais desses impactos, como interrupção de trabalho; danos a equipamentos /infraestrutura; escassez de água; estresse térmico; disputas trabalhistas; escassez de água; escassez de energia hidrelétrica; aumento da disputa por recursos; perda de biodiversidade; compactação do solo; seca; aumento do risco de enchentes; riscos à saúde e à segurança, danos aos meios de subsistência e conflitos sociais.  

De acordo com o estudo, os fatores de risco climático mais proeminentes para os quatro estados avaliados foram temperaturas extremas e dias consecutivos úmidos ou secos. A pesquisa mostra que  a proporção de horas de trabalho perdidas por estresse térmico no Brasil poderia aumentar para 0,84% até 2030, acima da média da América do Sul (0,76%) e quase dobrando em relação aos 0,44% de 1995.

Dentre os estados analisados, o Pará é o mais exposto a temperaturas e chuvas excessivamente altas, além da perda de precipitação. Enquanto isso, todas as quatro áreas têm exposição elevada a riscos relacionados a conflitos, o que sugere que os projetos de mineração já estão gerando disputas locais.

Pará: o estado mais exposto aos riscos climáticos

O estado Pará possui algumas das reservas minerais mais ricas do mundo e sua produção mineral é a segunda maior do país, atrás apenas de Minas Gerais. Toda essa "riqueza", porém, traz resultados devastadores ao meio ambiente. Conforme aponta o estudo, o Pará é o estado mais exposto à maioria dos riscos climáticos, além de ser o que tem o maior potencial de conflitos socioambientais. 

Os pesquisadores afirmaram que o Pará possui alta probabilidade de múltiplos perigos, como temperaturas extremas, perda anual de chuvas, calor fora de época, conflitos, entre outros. Confira abaixo:

Perfil de risco climático no Pará. Foto: TMP Public
Risco de conflitos no Pará. Foto: TMP Public

As evidências encontradas no estudo sugerem que o aumento da temperatura está correlacionado com o aumento de conflitos em nível nacional e regional. Além disso, as temperaturas extremas também podem forçar a interrupção do trabalho nas minas, seja por leis trabalhistas ou condições físicas. 

A precipitação irregular, como declínio geral na precipitação anual, aumento no número de dias úmidos consecutivos e uma precipitação alta fora de época, aponta que há maior chance de inundações. 

"Chuvas altas e incomuns podem forçar a interrupção das operações de mineração para evitar o rompimento da barragem de rejeitos, lidar com a instabilidade das encostas das minas e desidratar as cavas de mineração. Além disso, consecutivos eventos chuvosos aumentam o risco de transbordamento ou vazamento de rejeitos, o que representa um risco considerável de contaminação para as comunidades e os ecossistemas vizinhos", apontou um trecho do estudo. 

Conclusão

O estudo concluiu que as operações de mineração continuam a causar impactos socioambientais irreversíveis, ao mesmo tempo em que geram lucros altíssimos, "ressaltando a necessidade crítica de estruturas regulatórias rigorosas e de responsabilidade corporativa". 

Os pesquisadores alertaram que as condições climáticas extremas não só irão interromper as atividades mineradoras, como vão aumentar a ocorrência de conflitos e tensões, além da degradação ambiental. Diante disso, o estudo pediu uma ação urgente e colaborativa para consolidar uma base de resiliência sobre a qual o país poderá se apoiar nos próximos anos. 

Por fim, o estudo destacou que é imprescindível que as pessoas que tomam as decisões compreendam a relação interconectada entre os impactos climáticos, as comunidades locais e os ecossistemas dos quais elas dependem. 

"As políticas devem incentivar ativamente medidas de adaptação climática que fortaleçam a resiliência a riscos de múltiplos perigos, priorizando transparência corporativa, justiça ambiental e reparação justa. Sólidas estruturas de consulta são fundamentais para garantir o consentimento livre, prévio e informado das comunidades locais", concluiu a pesquisa. 

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