De Baku, Azerbaijão -- A bizarra decisão do presidente da Argentina Javier Milei, de retirar seus negociadores da COP29 quando eles já estavam em Baku, foi detonada por integrantes da delegação brasileira.
A ministra Marina Silva disse que a decisão de Buenos Aires, apesar de "simbólica", vai na contramão do mundo: "Todas as sociedades estão pagando um preço muito alto pela mudança do clima e cada país que se recusa a fazer o dever de casa está contribuindo para o agravamento dessa situação, que prejudica a vida das pessoas, os sistemas agrícolas, os sistemas de produção industrial em todos os níveis".
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O presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho, recém-chegado a Baku, foi na mesma linha: "É um erro, porque a Argentina é dependente de produtos agrícolas e as previsões são muito ruins, a previsão é de que a gente pode ter quebras de safra, isso vale para a Argentina, vale para o Brasil. A economia da Argentina depende muito das questões climáticas".
Vidrado na IA
Javier Milei, no entanto, está crente de que a Argentina está a caminho de se tornar "uma das quatro grandes potências mundiais da Inteligência Artificial" -- o que em tese reduziria a dependência do país do agronegócio e da agroindústria.
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Recentemente, ele afirmou:
Para que funcionem os data centers onde os algoritmos aprendem, você precisa de energia e de frio. No sul [da Argentina] podemos fazer algo fenomenal: grandes áreas de terra, frio (para que as máquinas consumam menos) e capital humano.
Prover os data centers de energia está se tornando um desafio cada vez maior, com as Big Techs recorrendo cada vez mais a reatores nucleares de pequeno porte, já em uso pelo Google e pela Amazon.
Demissão e guinada
Depois de ter demitido a chanceler Diana Mondino, sob a alegação de que ela votou contra o bloqueio dos Estados Unidos a Cuba nas Nações Unidas, Milei parece ter assumido comando completo das Relações Exteriores.
Foi depois de uma conversa com Donald Trump, por telefone, na qual o futuro ocupante da Casa Branca teria dito que Milei é seu "presidente favorito", que o Ministério das Relações Exteriores puxou o plug da negociadora da Argentina que estava em Baku, no Azerbaijão, tratando da emergência climática.
Tudo indica que Trump vai sacar os EUA, mais uma vez, do Acordo de Paris.
Milei, por sua vez, desembarcou na Flórida nesta quinta-feira depois de ter dito em uma entrevista de rádio que está aberto a um tratado de livre comércio com os EUA, sem abandonar a aprofundada relação com a China.
Ele deve se encontrar com Trump e Elon Musk nos próximos dias.
O Musk local
O presidente da Argentina indicou o empresário Alejandro Oxenford, uma espécie de Musk argentino, para embaixador em Washington durante o governo Trump.
Ele é fundador da OLX, da empresa de e-commerce e leilões DeRemate e de uma plataforma de compra e venda nos Estados Unidos.
Assim que foi indicado, Oxenford reuniu-se com o embaixador dos Estados Unidos em Buenos Aires para declarar:
A aliança entre Argentina, Estados Unidos e Israel é uma força especial que une valores e objetivos comuns até um futuro de paz e prosperidade.
Com a tradicional grandiloquência dos hermanos, o futuro embaixador foi às redes sociais:
Hoje acordei pensando no poder das ideias. A Argentina não é uma potência militar, mas pode ser uma potência cultural global. Você tem uma oportunidade extraordinária de se posicionar como um farol cultural e usar este “soft power”, nos termos de Joseph Nye, para influenciar positivamente o mundo. A Argentina de Milei, Borges e Messi pode causar mais impacto do que qualquer conquista militar ou econômica imaginável.
Relação carnal
Donald Trump, que não é dado a platitudes, deve estar mais interessado nas vantagens extraordinárias já oferecidas por Milei aos EUA, ainda no governo Biden: acesso a um porto antártico, monitoramento da hidrovia Paraná-Prata, presença militar no Cone Sul e as fartas reservas de lítio -- que, por coincidência, podem ser matéria prima para os carros elétricos de Elon Musk.
Com Musk todo poderoso no governo Trump, o tradicional site Infobae explicou a nova guinada de Milei:
As relações entre a Casa Branca e a Casa Rosada terão, além de uma faceta geopolítica, uma forte marca nos laços econômicos, principalmente ao nível das tecnologias de informação e dos desenvolvimentos baseados na Inteligência Artificial.
Além disso, já pendurada em U$ 44 bilhões no FMI, a Argentina pode precisar de novos empréstimos do Fundo, no qual Washington apita como ninguém.
O que Trump pretende arrancar a mais de Milei, ao convidá-lo para ser o primeiro presidente da América Latina a visitá-lo na Flórida, só o futuro dirá. Donald Trump, como escrito acima, não é dado a platitudes.