FRONTEIRA PERU-BRASIL

FOTOS: O que a mídia corporativa esconde sobre os indígenas “mais isolados” da Amazônia

Meios engajam público com fotografias exuberantes do povo Mashco Piro, mas deixam para os rodapés a informação de que esse povo está ameaçado por madeireiros

Imagens inéditas dos Mashco Piro.Créditos: Divulgação/Survival International
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Na última terça-feira (16), a ONG Survival International divulgou fotos inéditas do povo indígena Mashco Piro, que vive numa das áreas mais isoladas da Amazônia, na fronteira entre o Brasil e o Peru. As imagens são exuberantes, mostram um grupo de poucas dezenas de pessoas desse povo às margens de um rio amazônico e, ao fundo, a floresta verde escura, aparentemente intocada.

Nesta quinta-feira (18), a novidade chegou aos meios de comunicação, que engajam o seu público com as belas fotos do lugar paradisíaco e seu povo, que desperta a curiosidade justamente por viver isolado em área remota. Explorando algumas características do povo e da paisagem idílica, a mídia corporativa deixa para seus rodapés a principal questão acerca da divulgação das imagens: os Mashco Piro estão ameaçados por empreendimentos extrativistas, nomeadamente a exploração de madeira na região.

As próprias imagens dos indígenas foram feitas próximas a uma das áreas utilizadas para extração de madeira. Chama a atenção esse registro uma vez que os povos isolados, na maioria dos casos, escolhem viver nessa condição. Vê-los próximos de alguma área utilizada por tais atividades é sempre um mau sinal, geralmente o de que esses setores estão avançando sobre a floresta e, consequentemente, os territórios dos povos.

E foram alguns avistamentos. No das imagens, foram 50 Mashco Piro que apareceram próximos a uma aldeia do povo indígena (não isolado) Yine de Monte Salvador. Uma segunda aparição dos isolados, com cerca de 17 pessoas, ocorreu em outra aldeia Yine, em Puerto Nuevo.

Imagens inéditas dos Mashco Piro. Créditos: Divulgação/Survival International

Os Mashco Piro anunciam sua chegada com assovios e as visitas tinham como objetivo basicamente pedir um pouco de bananas e mandioca. Os idiomas falados pelos Mashco Piro e pelos Yine são parecidos e o segundo grupo revelou aos ativistas da região que a causa dos encontros era a presença constante de madeireiros nas suas terras, onde diversas empresas têm concessões para extração de madeira.

Uma dessas empresas é a Canales Tahuamanu, que construiu mais de 200 km de estradas na região, colocando em risco o próprio status de “isolado” do povo. A empresa alardeia possuir o certificado FSC (Forest Stewardship Council), que supostamente atestaria suas práticas éticas e sustentáveis.

Imagens inéditas dos Mashco Piro. Créditos: Divulgação/Survival International

“Muitos Mashco Piro vivem nesta área que o governo, além de não conseguir proteger, vendeu para empresas madeireiras. Os trabalhadores podem trazer novas doenças que seriam mortais aos Mashco Piro, e também há risco de violência de ambos os lados. Por isso, é muito importante que os direitos territoriais dos Mashco Piro sejam reconhecidos e protegidos por lei”, declarou Alfredo Vargas Pio, presidente da Federação Nativa do Rio de Madre de Dios e Afluentes.

Segundo a organização que fez a denúncia, é preciso revogar todas as licenças de exploração de madeira da região, destacar a fiscalização contra os madeireiros ilegais e demarcar o território dos Mashco Piro.

“Está se formando o cenário de uma verdadeira crise humanitária – é absolutamente necessário que os madeireiros sejam removidos, e que o território dos Mashco Piro seja devidamente protegido. A FSC deve cancelar imediatamente a certificação da Canales Tahuamanu – se não, ficará claro que todo o sistema de certificação é uma farsa”, diz Caroline Pearce, a diretora da organização.

Os Mashco Piro são cerca de 750 pessoas e seu território começou a ser invadido no final do século XIX pela extração de látex.

O território Mashco Piro. Créditos: Reprodução/Google Maps