CHINA EM FOCO

Como a China está revolucionando o futebol de base – e o Brasil faz parte disso

Superliga de Vilarejos, torneio que joga luz sobre minorias étnicas, tem impacto econômico e cultural nas áreas rurais do país asiático e é exemplo de como o esporte mais popular do planeta pode ser ferramenta para erradicação da pobreza

Como a China está revolucionando o futebol de base – e o Brasil faz parte disso.Cerimônia de abertura da Superliga de Vilarejos 2025. Créditos: Xinhua
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A Superliga de Vilarejos da China (Village Super League ou Cun Chao) tem ganhado destaque internacional ao combinar futebol de base com cultura e turismo. O torneio, realizado em Rongjiang, na província de Guizhou, sudoeste do país, reflete uma estratégia do governo chinês para promover o esporte, revitalizar o interior do país e fortalecer o intercâmbio global.

Uma Liga em expansão

Xinhua - Apresentação de dança no intervalo do jogo de abertura da Superliga de Vilarejos 2025.

A nova temporada da Superliga de Vilarejos, iniciada em 4 de janeiro de 2025, conta com mais de três mil jogadores distribuídos em 108 equipes, um crescimento expressivo em relação à edição anterior, que reuniu 62 times. Durante o feriado do Festival da Primavera Chinês, de 1º a 4 de fevereiro, o evento atraiu milhares de turistas, consolidando-se como uma atração cultural e esportiva.

Desde sua criação em 2023, a liga não apenas promove o futebol local, mas também se tornou um palco para expressões culturais étnicas. Com 28 grupos étnicos presentes na região, incluindo Dong, Miao, Shui, Yao e Bouyei, a competição é acompanhada por danças, músicas e trajes tradicionais.

O impacto vai além dos gramados: em 2024, o vilarejo de Dali Dong recebeu quase 100 mil turistas, impulsionando a economia local e gerando renda para moradores.

Conexão com o Brasil

Xinhua - O brasileiro Kaká participa do torneio em 2024
Xinhua - O brasileiro Kaká participa do torneio em 2024

A participação de Kaká na Superliga de Vilarejos é exemplo dos laços entre Brasil e China no futebol. Em 27 de maio de 2024, o ex-meio-campista da Seleção Brasileira visitou Rongjiang e interagiu com jogadores locais durante o intervalo de uma partida. O evento atraiu uma multidão, refletindo o entusiasmo da população chinesa pelo futebol e sua admiração por ídolos brasileiros.

A China tem investido pesadamente no desenvolvimento do futebol, com o objetivo de se tornar uma potência mundial no esporte até 2050. Pequim tem incentivado parcerias internacionais, e o Brasil, com sua tradição futebolística, é um parceiro estratégico nesse processo.

Jogadores brasileiros têm sido cada vez mais procurados para atuar em clubes chineses, e a cooperação entre as federações de ambos os países está em expansão.

  • Oscar (2017 - presente) - Meia ex-Chelsea, contratado pelo Shanghai SIPG (atual Shanghai Port) por uma das maiores transferências do futebol chinês.
     
  • Hulk (2016 - 2020) - Atacante que atuou no Shanghai SIPG, formando dupla de destaque com Oscar.
     
  • Paulinho (2015 - 2017 e 2018 - 2021) - Volante ex-Barcelona, jogou no Guangzhou Evergrande, onde foi peça-chave nas conquistas do time.
     
  • Renato Augusto (2016 - 2021) - Meia ex-Corinthians, jogou no Beijing Guoan e foi um dos principais estrangeiros da Superliga Chinesa.
     
  • Elkeson (2013 - 2020 e 2022 - 2023) - Atacante atuou no Guangzhou Evergrande (2013-2015), no Shanghai SIPG (2016-2020) e retornou ao Guangzhou (2022-2023). Naturalizado chinês, jogou pela seleção chinesa.
     
  • Anderson Talisca (2018 - 2021) - Meia-atacante ex-Bahia e Benfica, atuou pelo Guangzhou Evergrande.
     
  • Alex Teixeira (2016 - 2021) - Atacante ex-Shakhtar Donetsk, defendeu o Jiangsu Suning, sendo peça fundamental na conquista do título de 2020.
     
  • Ramires (2016 - 2019) - Volante ex-Chelsea e seleção brasileira, jogou no Jiangsu Suning.
     
  • Ricardo Goulart (2015 - 2018, 2019 - 2021) - Atacante e ídolo do Guangzhou Evergrande, eleito melhor jogador da liga em suas temporadas iniciais. Passou um período emprestado ao Palmeiras em 2019 antes de retornar à China.
     
  • Alan Carvalho (2015 - 2020 e 2021 - 2022) - Jogou pelo Guangzhou Evergrande e depois pelo Beijing Guoan. Também se naturalizou chinês e foi convocado para a seleção da China.

Outros brasileiros que atuaram no futebol chinês

  • Diego Tardelli (2015 - 2018) – Shandong Luneng
     
  • Jô (2017 - 2018) – Chongqing Dangdai Lifan
     
  • Vágner Love (2013 - 2015) – Shandong Luneng
     
  • Eder (2018 - 2021) – Jiangsu Suning
     
  • Fernandinho (2018 - 2021) – Chongqing Lifan
     
  • Moisés (2019 - 2021) – Shandong Luneng

Nos últimos anos, o futebol chinês passou por mudanças regulatórias, reduzindo a contratação de estrangeiros devido a novas regras salariais e limitações no número de jogadores não chineses por equipe. Mesmo assim, o Brasil continua sendo um dos países com maior número de jogadores exportados para a Superliga Chinesa ao longo da última década.

Diplomacia e desenvolvimento

Xinhua - Torcedoras na Superliga de Vilarejos 2025.

O sucesso da Superliga de Vilarejos está alinhado às estratégias do Partido Comunista Chinês (PCCh) para o desenvolvimento rural e fortalecimento da coesão social.

A política de revitalização rural, lançada em 2017, busca reduzir desigualdades entre zonas urbanas e rurais, promovendo o turismo e incentivando a prática esportiva. O futebol se torna, assim, uma ferramenta de inclusão social e desenvolvimento econômico, criando oportunidades para jovens talentos e estimulando a permanência de moradores no interior do país.

Além disso, a Superliga de Vilarejos se tornou um importante vetor de soft power para a China, promovendo sua cultura e expandindo laços diplomáticos. Desde 2023, o torneio atraiu mais de 1.100 jogadores de mais de 50 países, incluindo França, Libéria e Estados Unidos. Em 2024, um grupo de jovens jogadores etíopes participou do evento, destacando o futebol como um idioma universal que conecta diferentes povos.

O futuro da Superliga de Vilarejos

Xinhua - Cerimônia de abertura da Superliga de Vilarejos 2025.

O crescimento rápido do torneio levou a planos ambiciosos. Xu Bo, chefe do condado de Rongjiang, anunciou a intenção de realizar uma Copa do Mundo da Superliga de Vilarejos em 2028, reunindo equipes de base de todo o mundo para celebrar o esporte e a cultura.

"A Superliga de Vilarejos não apenas colocou Rongjiang no mapa global do futebol, mas também ajudou no desenvolvimento social e econômico da região. O evento incentiva o intercâmbio entre os povos e fortalece a visão de um mundo mais conectado e harmonioso", disse Xu à Xinhua.

Suporte de Pequim à Superliga dos Vilarejos

A Superliga de Vilarejos da China (Village Super League ou Cun Chao) está inserida em uma estratégia mais ampla de Pequim voltada para o desenvolvimento rural, fortalecimento da identidade cultural e promoção do esporte de base.

Essa política faz parte de várias diretrizes estabelecidas pelo governo central, que buscam equilibrar o crescimento entre áreas urbanas e rurais e reforçar a cultura chinesa em diferentes níveis da sociedade.

1. Revitalização Rural e Desenvolvimento Econômico

A revitalização rural é uma das principais políticas do PCCh para reduzir desigualdades entre áreas urbanas e rurais. Iniciada formalmente em 2017 como parte do Plano Nacional de Revitalização Rural, essa estratégia incentiva:

  • Investimentos em infraestrutura e turismo rural: Pequim promove eventos esportivos como forma de estimular a economia de pequenas cidades e vilarejos. A Superliga de Vilarejos atrai turistas e fomenta setores como hospedagem, alimentação e transporte.
     
  • Fixação da população jovem nas áreas rurais: A liga ajuda a criar oportunidades de lazer e trabalho para jovens que, sem alternativas, poderiam migrar para as grandes cidades.
     
  • Desenvolvimento sustentável: Eventos culturais e esportivos impulsionam modelos de economia local baseados em turismo e preservação de tradições étnicas.

2. Promoção do Esporte de Base

A China tem um plano ambicioso para se tornar uma potência global no futebol até 2050. O governo tem incentivado o desenvolvimento do futebol em escolas, clubes locais e competições comunitárias. A Superliga de Vilarejos se encaixa nesse plano ao:

  • Criar um ambiente para o desenvolvimento de novos talentos: Pequim busca popularizar o futebol como um esporte acessível a todas as camadas da sociedade, não apenas nas grandes cidades.
     
  • Reforçar a ideia de “esporte para todos”: O PCCh tem promovido a prática esportiva como um pilar da saúde pública e do bem-estar social, incentivando atividades comunitárias como a Cun Chao.
     
  • Internacionalização do futebol chinês: A participação de jogadores estrangeiros e a cobertura internacional do evento contribuem para a visibilidade do futebol chinês fora das grandes ligas tradicionais.

3. Fortalecimento da identidade cultural e coesão social

O governo chinês tem reforçado políticas para proteger e valorizar a cultura tradicional, especialmente entre as minorias étnicas. A Superliga de Vilarejos desempenha um papel importante ao:

  • Combinar futebol e cultura local: O evento não é apenas uma competição esportiva, mas também um festival cultural, com apresentações de dança, música e trajes típicos de etnias como Dong, Miao e Shui.
     
  • Criar um senso de pertencimento: Pequim busca fortalecer a identidade nacional por meio da valorização das culturas regionais, unindo-as a práticas esportivas populares.
     
  • Promover a estabilidade social: Eventos como esse ajudam a reforçar a harmonia entre diferentes grupos étnicos e evitam tensões sociais, algo que é uma preocupação constante do governo.

4. Diplomacia esportiva e Soft Power

A Superliga de Vilarejos também tem um papel na diplomacia esportiva da China, reforçando sua imagem global por meio do futebol e do intercâmbio cultural. Pequim tem investido no esporte como ferramenta de soft power, promovendo eventos que:

  • Atraem jogadores e torcedores estrangeiros: Desde 2023, mais de 1.100 jogadores de diversos países participaram de partidas amistosas, fortalecendo a imagem da China como um centro de intercâmbio esportivo.
     
  • Estimulam o turismo internacional: A presença de ícones globais, como Kaká, ajuda a projetar a Superliga como um evento de importância internacional.
     
  • Fortalecem laços diplomáticos: Pequim usa eventos esportivos para ampliar sua influência em países parceiros, especialmente na África e América Latina, regiões onde há grande interesse em futebol.

A Superliga de Vilarejos é mais do que um torneio de futebol, sendo parte de uma estratégia integrada do governo chinês para revitalizar áreas rurais e fomentar o turismo; fortalecer o futebol de base e impulsionar o esporte nacional; promover a identidade cultural e minorias étnicas; e expandir a diplomacia esportiva e a influência global da China.

O sucesso da liga demonstra como Pequim utiliza o esporte não apenas como entretenimento, mas como ferramenta de desenvolvimento social e projeção internacional.

A liga mostra como o futebol pode ser uma ferramenta de ponte entre o Brasil e a China, unindo paixão esportiva e cooperação cultural. Com investimentos crescentes e o reconhecimento internacional, a Superliga de Vilarejos pode se consolidar como um exemplo global de como o esporte pode transformar comunidades e fortalecer laços entre nações.

Com informações da Xinhua

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