CHINA EM FOCO

China e EUA expõem visões opostas sobre a ordem global na Conferência de Munique

Enquanto Wang Yi defende um mundo multipolar baseado no multilateralismo e na cooperação internacional, JD Vance critica políticas internas da Europa e sugere que as maiores ameaças ao continente vêm de dentro

China e EUA expõem visões opostas sobre a ordem global na Conferência de Munique.Enquanto Wang Yi defende um mundo multipolar baseado no multilateralismo e na cooperação internacional, JD Vance critica políticas internas da Europa e sugere que as maiores ameaças ao continente vêm de dentro.Créditos: Conferência de Segurança de Munique (divulgação)
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O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, defendeu um mundo multipolar, igualitário e ordenado durante seu discurso na 61ª Conferência de Segurança de Munique, na sexta-feira (14).

Em um evento marcado por debates sobre tensões globais e rivalidade entre potências, Wang apresentou a visão da China para uma nova ordem internacional, enfatizando a necessidade de um sistema baseado na igualdade entre nações, respeito ao direito internacional, multilateralismo e abertura econômica.

O chanceler chinês argumentou que a multipolaridade não deve significar caos, conflitos ou dominação das grandes potências. Pelo contrário, ele defendeu uma transição estável para um mundo multipolar, rejeitando hegemonismo e políticas de poder.

"A multipolaridade é uma inevitabilidade histórica e já se tornou uma realidade. No entanto, não pode ser um estado de desordem. Precisamos garantir um sistema no qual todas as nações, independentemente de seu tamanho, tenham direitos, oportunidades e regras iguais."

A declaração ocorre em meio ao agravamento da polarização geopolítica, com as relações entre China e EUA deterioradas por disputas comerciais, tensões no Estreito de Taiwan e o fortalecimento de alianças militares lideradas por Washington no Indo-Pacífico.

China se posiciona como força estabilizadora na nova ordem global

Wang Yi apresentou quatro princípios fundamentais que, segundo Pequim, devem guiar a nova era da multipolaridade:

  1. Tratamento igualitário entre países – O chanceler criticou modelos passados de dominação, como o colonialismo e a ordem centro-periferia, e defendeu maior representação das nações em desenvolvimento em organismos internacionais.
     
  2. Respeito ao direito internacional – Wang afirmou que o sistema global deve ser regido pelo Estado de Direito, e não pela imposição de regras por países mais poderosos. Segundo ele, a China se opõe a padrões duplos e defende a soberania e integridade territorial de todas as nações.
     
  3. Multilateralismo genuíno – O chanceler criticou abordagens unilaterais e defendeu o papel da ONU como pilar da governança global, com decisões tomadas de forma coletiva e inclusiva.
     
  4. Abertura econômica e benefício mútuo – Wang condenou protecionismo e guerras comerciais, destacando que a China continuará promovendo o comércio aberto e a cooperação internacional, especialmente por meio de iniciativas como a Nova Rota da Seda.

Críticas veladas aos EUA e crescente tensão global

Sem citar diretamente os Estados Unidos, Wang Yi criticou o que chamou de mentalidade da Guerra Fria e alertou para o risco de confrontos entre blocos. Segundo ele, algumas nações estão fomentando a desordem global ao adotar políticas de pressão econômica e interferência externa.

"O mundo precisa de cooperação, e não de divisão. Nenhum país pode resolver sozinho os desafios globais. Criar alianças fechadas e alimentar tensões não é o caminho para a segurança e a estabilidade."

O discurso ocorre no momento em que EUA, Japão e Coreia do Sul fortalecem sua cooperação militar e econômica para conter a influência da China no Indo-Pacífico. A recente declaração conjunta dos três países apoiando Taiwan em fóruns internacionais gerou forte reação de Pequim, que vê a ilha como parte de seu território.

Além disso, Wang destacou que a China já é um fator de estabilidade no mundo multipolar e prometeu ampliar sua atuação global por meio de investimentos, desenvolvimento sustentável e projetos de infraestrutura.

Relação com a Europa e a importância do multilateralismo

O chanceler chinês também enviou um recado direto à União Europeia, afirmando que a China vê a Europa como um polo essencial da multipolaridade. Ele ressaltou que os dois lados não são rivais, mas parceiros, e que a cooperação sino-europeia é fundamental para garantir estabilidade global.

"Este ano marca os 50 anos das relações China-UE. Nossa intenção é aprofundar a comunicação estratégica e fortalecer a cooperação mútua para promover um futuro de paz, segurança, prosperidade e progresso."

A declaração sugere que Pequim busca fortalecer laços com a Europa como um contraponto à influência norte-americana, evitando que o continente se alinhe completamente a Washington em uma nova bipolaridade global.

China projeta liderança na era multipolar

O discurso de Wang Yi em Munique reforça a estratégia da China de se posicionar como um ator central na nova ordem mundial, rejeitando o domínio unilateral de qualquer potência e promovendo um modelo de governança global mais inclusivo e baseado no multilateralismo.

A mensagem, no entanto, também carrega um forte tom de contestação às políticas dos EUA, evidenciando que as tensões geopolíticas continuarão moldando as relações internacionais nos próximos anos. Como Europa, países emergentes e organismos internacionais responderão a essa disputa será determinante para o futuro do equilíbrio global.

Leia aqui o discurso de Wang Yi na íntegra (em inglês)

Wang Yi faz contraponto a JD Vance

Na Conferência de Segurança de Munique, realizada na semana passada, dois discursos se destacaram por suas abordagens contrastantes: o do vice-presidente dos Estados Unidos, JD Vance, e o do ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi.

Enquanto Vance criticou duramente as políticas internas europeias, Wang Yi enfatizou a importância do multilateralismo e da cooperação global.

JD Vance: críticas às políticas internas europeias

Em seu discurso, JD Vance afirmou que a maior ameaça à Europa não vem de adversários externos, como Rússia ou China, mas de dentro do próprio continente. Ele levantou preocupações sobre censura à liberdade de expressão e religiosa, citando casos no Reino Unido e na Suécia.

Vance também criticou políticas migratórias europeias, associando-as a desafios de segurança interna. Além disso, sugeriu que a Europa deveria reconsiderar sua postura em relação a movimentos populistas, alertando para o risco de erosão democrática caso vozes dissidentes continuem sendo reprimidas.

Wang Yi: defesa do multilateralismo e da cooperação

Por outro lado, Wang Yi apresentou uma visão focada na promoção de um mundo multipolar baseado na igualdade e na ordem. Ele defendeu que todas as nações, independentemente de seu tamanho, devem ter direitos e oportunidades iguais no cenário internacional.

Wang Yi enfatizou a necessidade de respeitar o Estado de Direito internacional, praticar o multilateralismo e buscar benefícios mútuos por meio da cooperação aberta. A China, segundo ele, compromete-se a ser uma força construtiva e estável em um mundo em transformação, apoiando iniciativas como a Belt and Road e promovendo o desenvolvimento global.

Contraste entre os discursos

Enquanto Vance focou em críticas às políticas internas europeias, sugerindo que as maiores ameaças à democracia vêm de dentro do próprio continente, Wang Yi concentrou-se na importância da cooperação internacional e do respeito mútuo entre as nações.

A postura de Vance indica uma possível mudança na política externa dos EUA, com ênfase em questões ideológicas e políticas internas da Europa, enquanto Wang Yi reforça o compromisso da China com um sistema internacional baseado no multilateralismo e na igualdade soberana.

Os discursos refletem as diferentes prioridades e perspectivas das duas potências globais sobre a ordem mundial e as dinâmicas políticas internas dos países europeus.

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