A China nega veementemente acusações feitas por um think tank estadunidense de que estaria utilizando quatro locais em Cuba para coletar inteligência sobre os Estados Unidos e países vizinhos.
A declaração foi feita durante coletiva regular de imprensa do Ministério das Relações Exteriores da China desta quarta-feira (11). A porta-voz Mao Ning classificou as alegações como infundadas.
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“A cooperação da China com Cuba é realizada de forma transparente e não tem como alvo qualquer terceiro. Certamente, não aceitaremos qualquer tentativa deliberada de difamação ou calúnia por parte de terceiros”, afirmou Mao.
Ela recordou ainda que é amplamente conhecido que as agências de inteligência dos EUA têm um histórico vergonhoso na América Latina e no Caribe.
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“Os EUA ocuparam ilegalmente a Baía de Guantánamo como base militar e impuseram um bloqueio e sanções contra Cuba por mais de seis décadas, o que foi catastrófico para o povo cubano”, ressaltou.
A porta-voz afirmou que a China reitera seu apelo para que os EUA sigam o clamor justo da comunidade internacional, levantem o bloqueio e as sanções contra Cuba o mais rápido possível, removam Cuba da lista de “patrocinadores estatais do terrorismo” e parem de criar barreiras que dificultem o desenvolvimento socioeconômico de Cuba.
Vice-chanceler cubano refuta acusações
Mao também citou uma fala do vice-ministro das Relações Exteriores de Cuba, Carlos Fernández de Cossío, de que as acusações do instituto de pesquisa dos EUA sobre supostas bases militares chinesas em Cuba são apenas histórias inventadas, que não existem e que ninguém jamais viu.
Pelas redes sociais, no último dia 6 de dezembro, Cossío comentou o relatório da organização estadunidense.
“Lendas sobre supostas bases militares chinesas em #Cuba, que a mídia dos EUA frequentemente ressuscita, são ‘notícias’ encomendadas pelos inimigos de Cuba nesse país como uma forma de justificar a política criminosa de agressão econômica. Isso é absolutamente falso”, escreveu.
Entenda a acusação
O Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais (Center for Strategic and International Studies - CSIS), com sede nos Estados Unidos, publicou no dia 6 de dezembro um relatório intitulado “China’s Intelligence Footprint in Cuba: New Evidence and Implications for US Security” (“A Presença da Inteligência Chinesa em Cuba: Novas Evidências e Implicações para a Segurança dos EUA”).
O relatório detalha alegações de que a China utiliza quatro instalações em Cuba para coletar inteligência sobre os EUA e países vizinhos. A proximidade de Cuba com o sul dos EUA, região estratégica repleta de bases militares e centros de lançamento espacial, torna o país uma posição privilegiada para espionagem.
Com base em imagens de satélite e dados abertos, o estudo identifica bases como Bejucal, Calabazar, Wajay e El Salao, onde antenas avançadas e outras infraestruturas estariam sendo usadas para interceptar comunicações.
Algumas dessas instalações foram modernizadas recentemente, levantando suspeitas sobre seu papel na coleta de sinais de inteligência (SIGINT), prática essencial para a espionagem moderna.
O relatório também destaca o fortalecimento dos laços entre China e Cuba. A ajuda financeira chinesa ao país, incluindo projetos de infraestrutura como o Porto de Santiago, e a colaboração em tecnologia, reforçam a influência de Pequim na ilha.
O CSIS sugere que a China poderia usar a inteligência coletada por Cuba para expandir seu alcance estratégico.
Leia aqui o relatório completo em inglês
Laços sino-cubanos
As relações entre a República Popular da China e Cuba são marcadas por uma longa história de cooperação política, econômica e cultural. Desde o estabelecimento de laços diplomáticos em 1960, ambos os países têm fortalecido seus vínculos em diversas áreas.
Cooperação política e diplomática: Cuba foi o primeiro país da América Latina a estabelecer relações diplomáticas com a China, em 28 de setembro de 1960. Desde então, as duas nações mantêm um diálogo contínuo e apoio mútuo em questões internacionais. Líderes de ambos os países realizam visitas regulares, reforçando a amizade e a colaboração bilateral.
Relações econômicas e comerciais: A China é um dos principais parceiros comerciais de Cuba. Em 2022, a China doou cerca de 100 milhões de dólares a Cuba, demonstrando o compromisso com o desenvolvimento econômico da ilha. Além disso, empresas chinesas têm investido em setores-chave da economia cubana, como transporte, biotecnologia e energia.
Cooperação em ciência e tecnologia: Os dois países têm colaborado em projetos de biotecnologia, resultando em empreendimentos conjuntos como a Biotech Pharmaceutical Co. Ltd. Essa parceria tem impulsionado avanços científicos e tecnológicos, beneficiando ambos os lados.
Educação e cultura: Há um intercâmbio cultural significativo entre Cuba e China, incluindo programas educacionais e culturais que promovem a compreensão mútua e fortalecem os laços entre os povos.
Cuba na Nova Rota da Seda
Cuba aderiu à Iniciativa do Cinturão e Rota (BRI, da sigla em inglês), a Nova Rota da Seda, o mega projeto de infraestrutura liderado pela China, em 2018.
O governo da ilha caribenha assinou um memorando de entendimento para participar da iniciativa, tornando-se parte da rede global de infraestrutura, comércio e investimento promovida pelo governo chinês.
Acordo: Em setembro de 2021, durante um fórum virtual sobre a cooperação no Cinturão e Rota, Cuba assinou um plano de cooperação detalhado com a China. O acordo busca fortalecer os laços em áreas como energia, transporte, tecnologia e biotecnologia.
Áreas prioritárias: Os projetos incluem modernização de infraestrutura, telecomunicações, transporte e energia renovável, além de colaborações em biotecnologia, onde Cuba tem forte expertise.
Relações econômicas: A China é um dos principais parceiros comerciais de Cuba, e a participação na Nova Rota da Seda reforça os laços econômicos e estratégicos entre os dois países.
A adesão de Cuba reflete uma tentativa de diversificação econômica e redução da dependência do comércio com outras potências, principalmente diante do embargo econômico dos Estados Unidos.
O envolvimento na Nova Rota da Seda também reforça a cooperação política com a China, alinhada aos interesses mútuos em desafiar a influência dos EUA na região.
A lista de interferências dos EUA na América Latina e Caribe
A interferência dos Estados Unidos na América Latina e no Caribe remonta ao início do século 19, caracterizada por uma série de ações políticas, militares e econômicas destinadas a proteger e expandir seus interesses na região. Essas intervenções moldaram significativamente o panorama político e econômico dos países latino-americanos.
Doutrina Monroe (1823): Proclamada pelo presidente James Monroe, esta doutrina estabelecia que qualquer intervenção europeia nas Américas seria vista como uma ameaça aos interesses dos EUA, servindo como base para futuras intervenções no hemisfério ocidental.
Política do Big Stick e Intervenções no Caribe (Início do Século 20): Sob a liderança do presidente Theodore Roosevelt, os EUA adotaram a política do "Big Stick", que justificava intervenções militares para proteger seus interesses. Isso resultou em ocupações de países como Cuba, Nicarágua, Haiti e República Dominicana.
Guerra Fria e Apoio a Golpes de Estado (Décadas de 1950 a 1980): Durante a Guerra Fria, os EUA buscaram conter a influência comunista na América Latina, apoiando golpes militares e regimes autoritários alinhados com seus interesses. Exemplos notáveis incluem o apoio ao golpe de 1964 no Brasil e ao golpe de 1973 no Chile, que derrubou o presidente Salvador Allende.
Intervenções Militares Diretas (Décadas de 1980 e 1990): Os EUA realizaram intervenções militares diretas em países como Granada, em 1983, e Panamá, em 1989, com o objetivo de substituir governos que consideravam hostis ou ameaçadores aos seus interesses.
Influência econômica e política contemporânea: Nos anos 2000, os EUA continuaram a influenciar a política e a economia da região por meio de iniciativas como o Plano Colômbia, destinado a combater o narcotráfico e insurgências, e a promoção de tratados de livre comércio, como o NAFTA e o CAFTA-DR.
Essas ações refletem a busca dos EUA por manter sua influência na América Latina e no Caribe, moldando as dinâmicas políticas e econômicas da região ao longo dos séculos.
O embargo dos EUA contra Cuba
O embargo dos Estados Unidos contra Cuba, oficialmente chamado de "bloqueio econômico, comercial e financeiro", é uma série de sanções impostas pelo governo norte-americano contra Cuba. O embargo começou na década de 1960 e permanece em vigor, sendo uma das políticas de sanção mais prolongadas do mundo.
- 1960: Após a Revolução Cubana de 1959, liderada por Fidel Castro, o governo dos EUA impôs sanções comerciais parciais em resposta à nacionalização de propriedades e empresas norte-americanas em Cuba sem compensação adequada.
- 1962: O presidente John F. Kennedy assinou o decreto que formalizou o embargo total ao comércio entre os EUA e Cuba, incluindo a proibição de importações cubanas nos EUA e a proibição de exportações norte-americanas para a ilha (exceto alimentos e remédios em casos específicos).
- 1992 – Lei Torricelli (Cuban Democracy Act): Proibiu subsidiárias de empresas americanas em outros países de negociar com Cuba, ampliando o impacto global do embargo.
- 1996 – Lei Helms-Burton: Esta lei fortaleceu ainda mais o embargo, permitindo ações legais contra empresas estrangeiras que operam em propriedades confiscadas em Cuba. Também condicionou o levantamento do embargo à transição democrática e à compensação por propriedades expropriadas.
- 2004-2006: Durante o governo de George W. Bush, as sanções foram intensificadas, restringindo ainda mais as viagens e o envio de remessas por cubano-estadunidense.
- 2014-2016: Sob o governo Obama, houve uma aproximação diplomática, e algumas restrições foram relaxadas, permitindo maior comércio, viagens e remessas. Cuba e os EUA restabeleceram relações diplomáticas.
- 2017-2021: Sob o governo Trump, as sanções foram restabelecidas e ampliadas, restringindo novamente viagens, comércio e remessas. Em 2021, o governo Biden manteve a maior parte das sanções, embora tenha prometido reavaliá-las.
Impactos do embargo
Econômicos
- Dificuldade de acesso a mercados globais e financiamento internacional, já que empresas e bancos estrangeiros temem represálias dos EUA.
- Escassez de produtos essenciais, incluindo alimentos, remédios e equipamentos médicos.
- Limitação do turismo e do comércio, que são importantes para a economia cubana.
Humanitários
- Obstáculos à importação de equipamentos médicos e remédios, especialmente durante crises de saúde, como a pandemia de Covid-19.
- Impacto direto no bem-estar do povo cubano, com restrições a bens essenciais.
Políticos
- Reforço da retórica anti-estadunidense pelo governo cubano.
- Isolamento de Cuba em relação a mercados ocidentais.
Críticas ao embargo
Internacionais
- A Assembleia Geral da ONU condena o embargo anualmente desde 1992. Em 2023, 185 países votaram a favor de sua suspensão, com apenas os EUA e Israel votando contra.
- Muitos países consideram o embargo uma violação dos direitos humanos e do direito internacional.
Domésticas
- Grupos nos EUA, incluindo organizações de direitos humanos e parte da diáspora cubana, argumentam que o embargo falhou em promover mudanças políticas em Cuba e prejudica a população civil.
O que esperar da nova era Trump
Com o início do segundo mandato do presidente Donald Trump em 2025, as relações entre os Estados Unidos e Cuba tendem a se tornar mais tensas.
A nomeação do senador Marco Rubio, filho de imigrantes cubanos e conhecido por sua postura linha-dura em relação a regimes autoritários na América Latina, como Secretário de Estado, indica uma provável intensificação das políticas de pressão sobre o governo cubano.
Perspectivas para as Relações EUA-Cuba
- Reforço do embargo econômico: É esperado que a administração Trump mantenha e possivelmente amplie as sanções econômicas contra Cuba, visando isolar ainda mais o regime cubano e pressioná-lo por reformas "democráticas”.
- Restrições a viagens e remessas: Políticas que limitam viagens de cidadãos americanos a Cuba e restringem o envio de remessas para a ilha podem ser reforçadas, buscando reduzir o fluxo de recursos que sustentam o governo cubano.
- Apoio a "Movimentos Democráticos" (revoluções coloridas): A administração pode aumentar o apoio a dissidentes e movimentos pró-democracia dentro de Cuba, intensificando esforços para promover mudanças políticas internas.
Posicionamento de Marco Rubio
Marco Rubio, ao aceitar a nomeação, afirmou: "Promoveremos a paz através da força", sinalizando uma abordagem assertiva na política externa dos EUA.
Sua trajetória política demonstra uma postura firme contra governos como o de Cuba, defendendo sanções e medidas que pressionem por mudanças democráticas.
Rubio é descrito como "o falcão da política externa", devido às suas posições decisivas e agressivas, especialmente face à China, Irã, Venezuela e Cuba.
Reações de Cuba
O presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, afirmou que "o país está preparado" para enfrentar "circunstâncias mais difíceis" sob um segundo mandato de Trump, reiterando a disposição de "dialogar" com Washington, desde que seja em termos de igualdade e respeito à soberania cubana.
A combinação da administração Trump com Marco Rubio à frente do Departamento de Estado sugere uma política externa mais rigorosa em relação a Cuba, potencialmente exacerbando as tensões bilaterais e impactando a população cubana devido ao fortalecimento das sanções e outras medidas restritivas.