NO DISCURSO

Condenação do Brasil a Israel é retórica, mas não estamos sós

Diplomacia da jaqueta esconde a realpolitik

Mensagem.Janja mandou mensagem, mas é o petróleo brasileiro que abastece o genocídio em Gaza.Créditos: ONU
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A primeira-dama Janja vestiu uma jaqueta que fez referência à causa palestina, quando acompanhou o presidente Lula às Nações Unidas na semana que passou. 

O presidente Lula saudou a presença inédita da delegação palestina na Assembleia Geral, denunciou o genocídio em Gaza e encontrou-se com o líder da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, com o qual tirou uma foto histórica.

Abbas, porém, é um dos líderes mais impopulares no próprio território que governa.

Por força dos acordos que aceitou fazer com Israel, o aparato de segurança governado por ele é visto como colaboracionista.

A Autoridade Palestina tem como uma de suas obrigações evitar ataques terroristas a Israel, apesar da ocupação do território que supostamente governa pelo poder colonizador.

Da parte do Brasil, a condenação a Israel é retórica. 

De acordo com investigação feita pela ONG Oil Change, desde outubro de 2023 os maiores fornecedores de petróleo de Israel foram o Azerbaijão, o Casaquistão, o Gabão e o Brasil.

Acompanhando navios originários do Brasil, a ONG constatou como eles desligam o transponder antes de ancorar em portos de Israel e descarregar sua carga originária do pré-sal.

A ONG relacionou diretamente o petróleo brasileiro às refinarias que produzem o diesel e a gasolina que abastecem o Exército que promove o genocídio em Gaza.

A querosene de aviação vem dos Estados Unidos.

Não estamos sós

Diferentemente da África do Sul ou da Colômbia, o Brasil mantém relações diplomáticas e comerciais com Israel.

Mas, o Brasil não é o único país em que existe um divórcio entre o discurso e a prática.

Tanto que, ao discursar nas Nações Unidas, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu definiu Iraque, Síria e Irã como uma espécie de eixo do mal na defesa dos interesses palestinos, mas poupou a Jordânia, o Egito e a Arábia Saudita.

Pressionados por manifestações populares, os governos dos dois primeiros fazem pronunciamentos retóricos na mesma linha de Lula, mas cedem ao poder financeiro dos Estados Unidos, rejeitam o Irã e mantém relações com Israel.

A Arábia Saudita estava na fila para, dentro dos acordos de Abraão, patrocinados por Washington, normalizar relações com Tel Aviv -- e só não o fez até agora por conta da crise em Gaza.

Ao normalizar relações com o Irã e entrar para os BRICs, os sauditas caçam acordos comerciais mais vantajosos com a China, mas continuam sob tutela militar de Washington.

O Irã tateia entre seu apoio à causa palestina e compromissos internacionais que o impedem de declarar guerra a Israel.

Um dos motivos é a óbvia penetração dos serviços de inteligência de Israel tanto em Teerã quanto nos bastiões do Hezbollah no Líbano.

Já está claro que Tel Aviv dispõe de informantes e informações que poderiam causar sérios danos ao Irã em caso de guerra.

Jogando com o dissenso no mundo árabe e muçulmano, Israel tem tido sucesso em isolar de fato os palestinos de Gaza.

A eles resta o não desprezível apoio do movimento internacional dos que condenam, nas ruas, o genocídio do povo palestino.

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