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Crise climática causou a morte de mais de 3.800 pessoas de 23 países em 4 meses de 2024

Levantamento exclusivo da Fórum mostra que de janeiro a abril deste ano foram 90 eventos climáticos extremos em 48 países dos cinco continentes; principal vítima é o povo pobre do Sul Global

Créditos: Fotomontagem: Induncação do Rio Grande do Sul, enchentes na África do Sul e nevasca no Afeganistão.
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Os efeitos da crise climática afetaram com toda a força o Rio Grande do Sul, que há duas semanas vivencia uma tragédia sem precedentes. Para além do Brasil, os impactos do aquecimento global se alastram por todos os continentes. Apenas nos quatro primeiros meses desse ano, entre janeiro e abril, foram 90 eventos climáticos extremos com a morte de 3.867 pessoas.

A fúria da Natureza atingiu 48 países de cinco continentes: África, 13 países; Américas, 9; Ásia, 18; Europa, 5; e Oceania, 3. O número de mortes tem Ásia com 67,47% das vítimas; África: 24,02%; Américas, 6,80%; Oceania, 0,94%; e Europa 0,77%. O Sul Global, formado por países em desenvolvimento, é onde são mais sentidos os impactos da emergência climática.

Dos 48 países que registraram eventos climáticos extremos de janeiro a abril de 2024, 25 não tiveram mortes.

Em um levantamento exclusivo, a Fórum tabulou informações do Banco de Dados de Eventos de Emergência, o EM-DAT (sigla para Emergency Events Database), um banco de dados internacional de desastres mantido pelo Centro de Pesquisa sobre a Epidemiologia de Desastres (CRED, da sigla em inglês), vinculado à Universidade Católica de Louvain, na Bélgica.

Os números do EM-DAT mostram a gravidade da situação do planeta. As tragédias climáticas e ambientais agravam as desigualdades e criam uma sensação de ansiedade, com doses apocalípticas, diante de um cenário preocupante.

Impacto maior em países pobres

Agência Brasil - Seca no Amazonas, 2023

Os efeitos das mudanças climáticas em países em desenvolvimento, o Sul Global, são vastos e muitas vezes extrapolam vulnerabilidades que já existem. As tragédias climáticas afetam desproporcionalmente essas nações em razão de fatores como o neoliberalismo, desigualdades socioeconômicas, de infraestrutura e de governança.

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A crise climática impacta a agricultura e segurança alimentar das populações. Mudanças no regime de chuvas e aumento de temperaturas podem reduzir a produtividade agrícola, especialmente em países dependentes de agricultura de chuva.

Mudanças nos padrões climáticos podem levar à escassez de água, afetando não apenas a agricultura, mas também a disponibilidade de água potável.

Com os desastres naturais aumentados, os países pobres muitas vezes enfrentam o aumento na frequência e intensidade de eventos extremos, como tempestades, furacões, inundações e secas. Esses eventos não só causam perdas imediatas de vidas e infraestruturas, mas também têm efeitos de longo prazo na recuperação econômica e no desenvolvimento.

Há ainda os problemas de saúde pública, com aumento de doenças transmitidas pela água e por vetores, como malária e dengue, devido às alterações nas condições climáticas que favorecem a proliferação de vetores. Ondas de calor podem causar um aumento nas taxas de morbidade e mortalidade, especialmente entre os mais vulneráveis, como idosos e crianças.

Economia e migração

Acnur - As consequências do ciclone Mocha na aldeia de Dar Paing, no estado de Rakhine, em Mianmar, junho de 2023

Os impactos econômicos estão nos danos à infraestruturas críticas, como estradas, aeroportos, hospitais e escolas; e também no dia a dia da pessoas, moradia, trabalho, comércio. Os custos de recuperação de desastres precisam entrar no orçamento de todos os países. Com equidade e justiça social, pois os mais ricos, do Norte Global, são os principais emissores de gases de efeito estufa, e os do Sul Global pagam o preço.

Outro desafio são os deslocamento e migrações em razão das mudanças climáticas, que podem levar ao deslocamento de populações, especialmente de áreas costeiras vulneráveis a inundações ou erosão, e em regiões áridas ou semiáridas afetadas pela desertificação. Isso pode resultar em migrações internas ou transfronteiriças, criando tensões sociais e desafios para a governança.

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A erosão da biodiversidade com as alterações no clima, com espécies tendo que se adaptar, migrar ou enfrentar a extinção, pode comprometer ecossistemas inteiros.

Ao longo dos últimos 10 anos, houve uma tendência geral de aumento no número de eventos climáticos extremos. Esta tendência é impulsionada principalmente por ondas de calor e secas mais intensas e frequentes, além de inundações e tempestades mais severas, que estão associadas às mudanças climáticas globais.

A maior parte das mortes em 2023 ocorreu devido a ondas de calor extremas, inundações e tempestades severas. No ano passado, as estimativas apontam que mais de 3 mil pessoas morreram devido a eventos climáticos extremos. Em 2022, foram mais de 4.700 mortes.

Eventos climáticos extremos

IBGE

(entre janeiro e abril de 2024)

Por continente

  1. Américas: 31 eventos
  2. África: 22 eventos
  3. Ásia: 27 eventos
  4. Europa: 7 eventos
  5. Oceania: 3 eventos

Total: 90 eventos

Mortes causadas

  1. África: 1.230 mortes
  2. Américas: 224 mortes
  3. Ásia: 2.371 mortes
  4. Europa: 19 mortes
  5. Oceania: 23 mortes

Total de mortes: 3.867 mortes

Mortes por país

Dos 48 países que registraram eventos climáticos extremos de janeiro a abril de 2024, 25 não tiveram mortes.

1. Afeganistão: 1268 mortes
2. Quênia: 295 mortes
3. Tanzânia: 177 mortes
4. Filipinas: 150 mortes
5. Estados Unidos: 93 mortes
6. Paquistão: 99 mortes
7. África do Sul: 87 mortes
8. Brasil: 66 mortes
9. Indonésia: 75 mortes
10. China: 44 mortes
11. Papua Nova Guiné: 23 mortes
12. Madagascar: 27 mortes
13. Turquia: 10 mortes
14. França: 9 mortes
15. Omã: 7 mortes
16. Equador: 6 mortes
17. Suíça: 6 mortes
18. Índia: 4 mortes
19. Rússia: 3 mortes
20. Moçambique: 2 mortes
21. República Democrática do Congo: 2 mortes
22. Bolívia: 2 mortes
23. Itália: 1 morte

Eventos por país

Cada país enfrentou diferentes tipos de eventos climáticos extremos, como tempestades, inundações, deslizamentos de terra, incêndios florestais e outros.

África do Sul

  • Chuvas intensas. 41 mortos e 756 atingidos. (janeiro)
  • Incêndio florestal. 250 atingidos. (janeiro)
  • Inundações. 46 mortes e 7.813 atingidos. (fevereiro)
  • Tempestades. 1 morte e 13.895 atingidos (abril)

Argélia

  • Fortes chuvas e inundações. Mil atingidos (fevereiro)

Burundi

  • Tempestades, inundações e granizo. 5 feridos e 650 atingidos. (março)

Madagascar

  • Ciclone tropical 'Álvaro' e tempestades. 10 mortos e mais de 25 mil pessoas atingidas. (janeiro)
  • Ciclone 'Gamane'. 17 mortes e 89.465 atingidos

Malawi

  • Fortes chuvas e inundações. 6 mortes. 14 mil atingidos. (fevereiro)

Moçambique

  • Tempestade tropical 'Filipo' e inundações. 2 mortes e 93.240 atingidos.

Nigéria

  • Fortes chuvas. 1 morte e 500 atingidos. (abril)

Ilhas Canárias

  • Tempestade extra-tropical ''Monica'. 2 mortes (março)

Ilhas Maurício

  • Ciclone tropical 'Belal' e inundações. 2 mortes e 100 mil atingidos. (janeiro)

Ilha Reunião (França)

  • Enchente e maré alta. 4 mortes e 700 afetados. (janeiro)

Quênia

  • Fortes chuvas e inundações. 282 mortes e 205 mil atingidos (março)
  • Fortes chuvas, inundações e deslizamento de terra. 13 mortes. 15 mil atingidos (abril)

Tanzânia

  • Fortes chuvas. 22 mortes (janeiro)
  • Fortes chuvas, inundações e deslizamento de terra. 155 mortes e 200 mil atingidos. (abril)

República Democrática do Congo

  • Tempestades e ventos fortes. 2 mortes e 500 atingidos  (março)

Américas

Argentina

  • Fortes chuvas e inundações em Corrientes. 400 mil atingidos (março)
  • Fortes chuvas e inundações em La Plata e província de Buenos Aires 1 morte e 400 mil atingidos (março)

Brasil

  • Enchente repentina, tempestades e deslizamentos no Rio de Janeiro, São Paulo, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Sul. 13 mortos e 62 atingidos. (janeiro)
  • Tempestades, inundações e deslizamento de terra em São Paulo. 4 mortes e 600 atingidos. (janeiro)
  • Chuvas fortes e enchentes na Bahia. 6 mortes e 117 mil atingidos. (janeiro)
  • Fortes chuvas, inundações e deslizamentos de terra no Rio de Janeiro. 9 mortes e 550 atingidos. (fevereiro)
  • Tempestades, deslizamento de terra no Acre e em Santa Catarina mais de 28 mil atingidos. (fevereiro)
  • Inundações e fortes chuvas em Macapá. 291 atingidos (fevereiro)
  • Inundações, fortes chuvas e deslizamento de terra no Rio de Janeiro e no Espírito Santo. 34 mortes e 7.708 atingidos (março)
  • Fortes chuvas e inundações no Maranhão. 2323 atingidos. (abril)

Bolívia

  • Fortes chuvas. 2 mortes e 2.500 atingidos. (janeiro)
  • Inundações e fortes chuvas. (fevereiro)
  • Fortes chuvas e inundações 3.990 atingidos. (fevereiro)

Chile

  • Incêndios florestais na região de Valparaíso 120 atingidos (março)
  • Incêndios florestais na região de Valparaíso. 431 mortos e 27.600 atingidos. (fevereiro)

Colômbia

  • Deslizamento de terra em janeiro. 34 mortes, 19 feridos. (janeiro)

Estados Unidos

  • Enchentes e baixas temperaturas no Novo México, Colorado, Kansas, Nebraska, Dakota do Sul e Iowa; Cidade de Panamá e Condado de Jackson (Flórida), Cottonwood (Alabama), Bamberg (Carolina do Sul), Condado de Catawba (Carolina do Norte). 5 mortos e 11 feridos. (janeiro)
  • Tempestade de neve na Pennsylvania, Massachusetts, New York, Oregon, Maine, Mississippi, Tennessee Arkansas, Illinois, Wisconsin, Washington, Kentucky, New Jersey, Louisiana states em janeiro. 73 mortos. (janeiro)
  • Inundações e deslizamento de terra em Los Angeles. 9 mortos e 86 atingidos. (fevereiro)
  • Onda de calor, ventos fortes e incêndios florestais no Texas e em Oklahoma. 2 mortes e 300 atingidos. (fevereiro)
  • Tornado em Ohio, Indiana, Kentucky, Kansas, Oklahoma, Illinois e Arkansas. 3 mortes e 70 feridos. (março)
  • Fortes chuvas e inundações no Texas, Louisiana, MIssissippi, Flórida, Colorado, Nebraska e Wyoming. 1 morte e 216 atingidos (abril)

Equador

  • Inundações, fortes chuvas e deslizamento de terra. 6 mortes e mais de 173 mil atingidos. (fevereiro)

Peru

  • Tempestades e inundações. 149 pessoas afetadas. (fevereiro)
  • Tempestades e inundações. 346 atingidos (fevereiro)
  • Tempestades e inundações. 203 atingidos (março)

Uruguai

  • Fortes chuvas e deslizamento de terras. 8556 atingidos. (março)

Ásia

Afeganistão

  • Neve intensa e avalanches. 25 mortes e 150 atingidos. (fevereiro)
  • Fortes chuvas e onda de frio. 39 mortes e 2 feridos. (fevereiro)
  • Onda de frio, neve e gelo. 1197 mortes e mais de 325 mil atingidos. (março)
  • Fortes chuvas e inundações. 7 mortes e 1920 afetados. (março)

China

  • Deslizamento de terras úmidas na província de Yunnan em janeiro. 44 mortes e 500 afetados.(janeiro)
  • Incêndios florestais nas províncias de Sichuan e Yuannan. 4 mortes e 4.900 atingidos

Ciprus

  • Tempestades e inundações. 468 atingidos (fevereiro)

Emirados Árabes

  • Fortes chuvas e inundações em Dubai. 346 atingidos. (fevereiro)

Indonésia

  • Inundações, deslizamento de terras. 2 mortes e 25.500 atingidos. (fevereiro)
  • Inundações. 51 mortes e 500 mil atingidos. (fevereiro)
  • Fortes chuvas, inundações e deslizamento de terra. 2 mortes e 3.130 atingidos (abril)
  • Fortes chuvas e deslizamento de terra úmida. 20 mortes e 2 feridos (abril)

Índia

  • Inundações. 4 mortes e 22.810 atingidos (março)

Irã

  • Inundações e onda de frio. Mais de 250 mil atingidos

Iraque

  • Inundações e fortes chuvas. 3 mortes de 18 mil atingidos.

Japão

  • Tempestades. 240 atingidos. (fevereiro)

Kazaquistão

  • Inundações, derretimento rápido de neve e chuvas intensas. 2 mortes e 86 mil atingidos(abril)

Líbano

  • Onda de frio. Mais de 2,9 milhões de atingidos (fevereiro)

Omã

  • Fortes chuvas. 7 mortes e 190 atingidos. (fevereiro)

Paquistão

  • Inundações e fortes chuvas. 400 mil atingidos (fevereiro)
  • Chuva, inundações e deslizamento de terra. 99 mortes e 17.500 atingidos

Síria

  • Fortes chuvas afetaram 9.700 pessoas. (janeiro)

Sri Lanka

  • Inundações, chuvas intensas e ventos fortes causa 2 mortes e 175 mil pessoas atingidas. (janeiro)

Tailândia

  • Fortes chuvas e inundações (fevereiro). 1.400 atingidos.

Turquia

  • Fortes chuvas e deslizamento de terras.10 mortes. 900 afetados.

Filipinas

  • Deslizamento de terras úmidas. 22 mortes e mais de 1 milhão e 500 mil atingidos. (janeiro)
  • Deslizamento de terras úmidas. 128 mortes e 1 milhão e 400 mil  atingidos. (fevereiro)

Europa

Espanha

  • Tempestade extra-tropical ''Monica' em Barcelona. 1 morte (março)

França

  • Tempestade extra-tropical ''Monica', avalanche e inundações. 8 mortes (março)
  • Inundações e fortes chuvas. 1 morte e 750 atingidos (março)

Itália

  • Tempestade extra-tropical ''Monica', avalanche e inundações e deslizamento de terra. 1 morte (março)

Rússia

  • Derretimento rápido da neve, fortes chuvas e inundações. 3 mortes e 38.400 atingidos. (abril)

Suíça

  • Tempestade extra-tropical ''Monica'. 6 mortes. (março)

Oceania

Austrália

  • Fortes chuvas, inundações e deslizamento de terra. 6 feridos e 200 atingidos. (abril)

Ilhas Marshall

  • Tempestades e inundações. 19.500 pessoas afetadas.

Papua Nova Guiné

  • Fortes chuvas e inundações. 23 mortos.

O que é o EM-DAT

O EM-DAT foi criado com o objetivo de fornecer uma base de dados abrangente e objetiva sobre a ocorrência e os efeitos de desastres naturais e tecnológicos em todo o mundo. Ele é usado para auxiliar na preparação e resposta a desastres, bem como para a pesquisa e política relacionada à redução de riscos de desastres.

Os principais objetivos do EM-DAT são:

  • Fornecer uma base empírica para o desenvolvimento de políticas de prevenção e redução de desastres, bem como para a preparação e resposta a emergências.
  • Facilitar a pesquisa sobre desastres globais e regionais, permitindo análises comparativas e promovendo uma compreensão mais profunda das condições e riscos associados aos desastres.
  • Aumentar a conscientização sobre a importância dos desastres como uma ameaça global à população e à economia.

O banco de dados contém informações sobre mais de 22 mil desastres ocorridos desde 1900, incluindo dados sobre o tipo de desastre, localização, número de mortes, número de pessoas afetadas e danos econômicos estimados. Essas informações são coletadas de várias fontes, incluindo governos, organizações internacionais e instituições de pesquisa.