Na última sexta-feira (19), começou a votação para primeiro-ministro na Índia. Estas são as maiores eleições de todos os tempos na história da humanidade.
São aproximadamente 970 milhões de eleitores, numa população de 1,4 bilhão de habitantes. Elas superarão em 4% ou 40 milhões de pessoas as eleições do ano passado se mantidas as proporções de participação eleitoral.
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A votação vai até o dia 1 de junho e os resultados devem ser contabilizados até o dia 4. Sim, são seis semanas de votação para garantir a participação dos quase um bilhão de eleitores.
O atual governo de Narendra Modi deve ganhar com relativa facilidade do Congresso Nacional Indiano e sua coalizão INDIA. O Congresso é o partido de centro-esquerda ligado ao laicismo, e a figuras como Mahatman Gandhi, Jawaharlal Nehru e Indira Gandhi.
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Já Modi é do Bharatiya Janata Party (BJP), rival histórico do CNI. O BJP possui uma plataforma de extrema direita anti-Islã, fundamentalista religiosa e anti-comunista.
No cenário internacional, o resultado não deve mudar a posição da Índia, que goza de dados econômicos invejáveis e de um não-alinhamento que garante boas relações com China, Rússia e EUA.
Perigo vermelho
Internamente, o governo Modi pode representar uma série de retrocessos para a população. Por ser uma gestão fundamentalista hindu, certamente reduzirá direitos para os muçulmanos e cristãos, além de impor dificuldades contra membros de castas mais baixas e as scheduled tribes, povos indígenas que habitam o interior do país.
A retórica do extremismo hindu é clara contra a centro-esquerda: "O Congresso e a aliança INDI estão agora de olho na sua renda, na sua propriedade", disse ele.
"Se eles formarem o governo, eles investigarão quem ganha quanto, possui quanta riqueza e quantas casas. Ele também diz que o governo assumirá o controle de sua propriedade e a distribuirá entre todos. O manifesto deles diz isso. Eles vão atrás de sua casa, de suas joias", completa.
Curiosamente, o estado com melhor índice de desenvolvimento humano na Índia é governado pelos comunistas. Kerala, ao sul do país, é gerida pelo Partido Comunista da Índia - Marxista, e possui IDH superior ao do Brasil, com níveis de educação altíssimos e sistema de saúde público de dar inveja nos britânicos.
É justamente o sul do país que se tornou um problema para Modi. O Congresso Nacional Indiano possui força nos principais estados do sul (Kannada, Kerala, Tamil Nadu, Andhra Pradesh e Karnataka).
Mas o BJP possui amplíssima maioria nos estados mais populosos, ao norte, nas margens do Rio Ganges, onde, curiosamente, a qualidade de vida é muito pior.
O que dizem as pesquisas
Os resultados são desencorajadores para as esquerdas indianas. O BJP pode perder o sul inteiro, mas ainda conquistar uma supermaioria que o garantiria a capacidade de fazer reformas constitucionais sem sequer uma necessidade de coalizão com partidos regionais.
A batalha não está, contudo, perdida. O The Wire, importante veículo da esquerda indiana, defende que existem cenários favoráveis para a conquista do parlamento.
"Como o BJP goza do apoio de uma classe mais vocal e socialmente vibrante, que obtém um espaço mediático muito maior, muitas vezes não conseguimos avaliar o estado de espírito de um grande número de eleitores silenciosos, que provêm maioritariamente de sectores pobres e menos influentes da sociedade. Neste ambiente político de caça às bruxas, o eleitorado médio teme partilhar abertamente os seus sentimentos e expressar os seus pontos de vista", afirma coluna de Soroor Ahmed no jornal.
A escalada retórica de Narendra Modi pode indicar algum pânico entre a cúpula do partido, indicam alguns analistas, como Fayed Souza.
Aparelhamento e censura
Enquanto muitos afirmam que a Índia é a maior democracia do mundo, por seu número de eleitores e também por sua continuidade - é um dos raros países de terceiro mundo que nunca passaram por golpes de estado -, há quem enxergue uma escalada autoritária na Índia de Modi.
Primeiro-ministro desde 2014, o primeiro-ministro tem avançado uma agenda de censura, fechando jornais e ameaçando influenciadores da esquerda indiana.
O controle sobre o cinema também tem ficado mais rígido, e Modi tem usado do poder de estrelas de Bollywood - usualmente de casta alta - para aumentar sua influência sobre a população.
Do outro lado, aparelha o estamento público com uma milícia curiosa, o RSS, que defende a expulsão dos muçulmanos do território indiano e a criação de uma teocracia hindu na Índia, também conhecido com ideologia Hindutva.
O movimento RSS tem forte poder na política indiana e conseguiu eleger deputados e prefeitos sob a legenda do BJP.
Outra parte importante do discurso de Modi é o discurso anti-corrupção. Mesmo acumulando diversos escândalos no seio do seu governo, o líder do BJP tenta transformar o Congresso Nacional Indiano, histórico partido do país, em uma "legenda de corruptos".
No dia 4 de junho, a Índia pode dar o seu passo decisivo para se tornar uma autocracia eleitoral, aos moldes do governo Putin na Rússia, ou um tipo de Porfiriato. Até lá, é bom ficar de olho. Afinal, são as maiores eleições do mundo.