Dois fatos gravíssimos que repercutem esta semana na Argentina expõem o ambiente autoritário que o país vive desde a chegada de Javier Milei à Casa Rosada. Na cidade de La Plata, a 50 Km de Buenos Aires, uma militante de direitos humanos – que não teve a identidade divulgada por motivos de segurança – foi torturada e estuprada em sua própria casa por apoiadores do presidente. Em Buenos Aires, a ativista Estela de Carlotto, presidenta da Associação das Avós da Praça de Maio, teve o telefone residencial invadido e durante entrevista que concedia a uma emissora de rádio, nesta sexta-feira (22), sons de discagem de números eram escutados a cada vez que ela falava, dificultando que sua voz fosse ouvida.
A militante, que é natural de Rosário, mas vive em La Plata, teve a casa arrombada e os dois agressores, que a esperaram entrar no apartamento, lhe disseram que não estavam lá para roubar, mas para matá-la. “Somos pagos para isso”, falaram os criminosos, de acordo com a denúncia feita à polícia. Os invasores deixaram na parede do quarto da vítima a inscrição “VLLC” (Viva la libertad, carajo!), o principal slogan de Milei.
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O caso ocorreu no dia 5 de março, mas foi divulgado apenas nesta semana. “Não fale nunca mais! Olhe o que está acontecendo com você por falar. Sabemos que você trabalha nos direitos humanos. Sabemos quem você é, não viemos roubar nada, sou pago para isso. Nós viemos para te matar”, foi o que os bandidos disseram, ainda segundo a denunciante, que faz parte da organização HIJOS (Filhos e Filhas pela Identidade e Justiça contra o Esquecimento e o Silêncio, em espanhol), que congrega famílias de desaparecidos políticos durante a última ditadura (1976-1983) na Argentina.
O vizinho que encontrou a mulher chorando viu os suspeitos saírem do edifício e já se sabe que eles passaram várias vezes pelo local antes de invadirem o apartamento da vítima. Um vídeo [assista abaixo] foi produzido para contar o caso e simular os momentos que antecederam o crime.
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No X, antigo Twitter, Milei conferiu seus “likes” a publicações negacionistas em relação ao ataque sofrido pela militante, dando aval a ataques dos seus apoiadores na rede social. O presidente diz que a história seria uma invenção para atacá-lo.
Senadora
A senadora peronista Juliana Di Tullio (União pela Pátria) também denunciou, na quarta-feira (20), que o seu telefone pessoal havia sido grampeado (“pinchado”, no jargão político argentino) pela Agência Federal de Inteligência (AFI).
“Olá, Agencia Afi. Espero que grampear meu telefone lhes sirva para algo mais que escutar minhas críticas ao governo”, disse a parlamentar em suas redes sociais.
Todos esses episódios ocorrem a poucos dias do 24 de março, data do golpe militar de 1976, ocasião em que sempre acontecem marchas de protesto para relembrar o infame fato.
A verborragia agressiva de Javier Milei, tal qual se viu no Brasil com Jair Bolsonaro, está se transformando em crimes reais e a violência política contra dissidentes tem crescido bastante. É muito sério o que está ocorrendo na Argentina.
Rogério Tomaz Jr. é jornalista e militante de direitos humanos.