INTEGRAÇÃO REGIONAL

Organizações de esquerda pedem que Lula reconheça vitória eleitoral de Maduro

Carta enviada ao presidente brasileiro também foi endereçada a Celso Amorim, mas deixou de fora o chanceler Mauro Vieira

Nicolás Maduro e Lula no Palácio do Planalto (29/5/23).Créditos: Ricardo Stucker (PR)
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Movimentos sociais, organizações e associações de esquerda enviaram uma carta ao presidente Lula na qual pedem que o governo brasileiro reconheça a vitória de Nicolás Maduro, do Partido Socialista Unido da Venezuela, nas eleições realizadas em julho.

A carta também foi endereçada a Celso Amorim, assessor especial de Lula, mas deixou de fora o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira.

No documento, os signatários destacam a importância de fortalecer os laços entre Brasil e Venezuela, argumentando que a integração regional é essencial para a estabilidade da América Latina.

A carta ressalta os princípios de soberania e autodeterminação dos povos, mencionando ações anteriores do governo Lula, como a renegociação do Acordo de Itaipu com o Paraguai e o apoio ao diálogo no Mercosul.

“Gostaríamos de ressaltar a importância da manutenção de boas relações de vizinhança entre o nosso país e a República Bolivariana da Venezuela, baseadas no respeito mútuo, na cooperação e na compreensão das complexidades internas de cada nação”, diz a carta.

Críticas à oposição venezuelana

O texto também faz críticas severas à oposição venezuelana, acusando-a de promover uma agenda desestabilizadora. Os signatários citam a apreensão de armas e a captura de pessoas ligadas a grupos extremistas como evidências de ameaças à estabilidade regional.

“A extrema direita venezuelana e seus aliados fora do país promovem uma agenda polarizadora e desestabilizadora, ameaçando não só a paz interna do país, mas também a estabilidade de toda a América Latina”, aponta o documento.

Contexto político

A carta surge em um momento de tensão entre Brasil e Venezuela. Apesar de declarações anteriores de Lula buscando um tom conciliatório, como em maio, durante a cúpula de líderes sul-americanos, a posição do governo brasileiro em vetar a entrada da Venezuela no BRICS foi vista como uma ruptura diplomática por Caracas. O Ministério das Relações Exteriores da Venezuela emitiu uma nota criticando a decisão como um gesto hostil.

Ainda assim, Lula tem adotado uma postura de distanciamento sobre a crise política venezuelana. Em entrevista recente, ele afirmou que Nicolás Maduro é um problema da Venezuela, não do Brasil, marcando uma diferença em relação à abordagem de governos anteriores.

Carta na íntegra

“CARTA AO PRESIDENTE DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, COMPANHEIRO LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA.

C.C.: COMPANHEIRO CELSO AMORIM, ASSESSOR-CHEFE DA ASSESSORIA ESPECIAL DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.

Estimado companheiro Presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, Com os mais respeitosos e cordiais cumprimentos, dirigimo-nos a Vossa Excelência para abordar uma questão de extrema relevância para as relações internacionais de nosso país e, em particular, para a estabilidade e harmonia na América Latina. Gostaríamos de ressaltar a importância da manutenção de boas relações de vizinhança entre o nosso país e a República Bolivariana da Venezuela, baseadas no respeito mútuo, na cooperação e na compreensão das complexidades internas de cada nação. Os princípios da soberania e da autodeterminação dos povos, consagrados na Constituição Federal de 1988 e na Carta das Nações Unidas, guiam a nossa política externa independente, uma conquista importante da nossa nação, sob vossa liderança.

Neste contexto, vimos respeitosamente solicitar que o governo brasileiro reconheça a legitimidade da reeleição do Presidente Nicolás Maduro, ocorrida de acordo com os processos internos da Venezuela. O próprio candidato da oposição, Edmundo González, reconheceu os resultados e a institucionalidade venezuelana ao acatar a decisão da Sala Eleitoral do Supremo Tribunal de Justiça, argumentando que acata a decisão “por se tratar de uma resolução do máximo tribunal da República”, conforme consta na carta assinada pelo senhor González que veio à público em 18 de setembro. O reconhecimento dessa eleição não apenas reafirma nosso compromisso com o respeito à soberania venezuelana, mas também fortalece os laços de amizade e cooperação que historicamente unem nossas duas nações. A política externa brasileira de seu governo, altiva e ativa, tem como um de seus mais importantes eixos a Integração Regional em nossa região, como uma das condições essenciais para uma inserção mais soberana no contexto mundial, conforme o documento Consenso de Brasília, aprovado pelos países sul-americanos por iniciativa de seu governo em maio de 2023.

Neste sentido, aplaudimos as muitas iniciativas de seu governo e declarações da Presidência no sentido de ter compreensão e empatia pelas necessidades dos nossos vizinhos, como o oferecimento ao Uruguai da possibilidade de construir um possível acordo Mercosul-China em substituição ao acordo Uruguai-China, cujas negociações avançavam em janeiro de 2023. Ou a postura empática e de diálogo com relação à renovação do Acordo da Itaipu Binacional com o governo do Paraguai.

Em nossa opinião, relações diplomáticas, de abertura ao diálogo, sincero, empático e direto com o governo da Venezuela, especialmente nesse momento crítico pós-eleitoral, assim como com outros países de nossa região, é essencial para construir de maneira mais estrutural, institucional e permanente a Integração Regional.

Além disso, é necessário considerar os riscos que a ascensão de movimentos extremistas na Venezuela representa para toda a região. A mais recente apreensão por parte das autoridades venezuelanas, de 400 fuzis de uso exclusivo dos Estados Unidos e 6 pessoas, evidencia o caráter anti-democrático e terrorista de alguns setores da oposição venezuelana e dos Estados Unidos. Entre estas pessoas estão venezuelanos recrutados pelo Centro Nacional de Inteligência espanhol e um militar da ativa da Marinha dos Estados Unidos, Wilbert Joseph Castañeda Gómez.

A extrema direita venezuelana e seus aliados fora do país, promovem uma agenda polarizadora e desestabilizadora, ameaçando não só a paz interna do país, mas também a estabilidade de toda a América Latina. Esta situação pode ter reflexos negativos em nosso próprio país, gerando tensões que poderiam ser evitadas por meio de uma ação do Brasil pautada no diálogo e no respeito às escolhas legítimas do povo venezuelano.

Ao reconhecer a reeleição de Nicolás Maduro, o Brasil não apenas reafirma seu compromisso com os princípios de soberania e autodeterminação, mas também envia uma mensagem clara de apoio à paz e à estabilidade regional, promovendo o fortalecimento da integração latino-americana em um momento de grandes desafios globais. Agradecendo a atenção de Vossa Excelência, reafirmamos o nosso compromisso com a democracia, o progresso social, a soberania brasileira e a integração regional.”

Organizações populares que assinaram a carta:

Afronte – Movimento Nacional de Juventude

Associação Brasileira de Imprensa (ABI), Comissão de Relações Internacionais

Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, ABJD

Centro Brasileiro de Solidariedade Aos Povos e Luta Pela Paz, CEBRAPAZ

Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, CTB

Confederação Nacional das Associações de Moradores, CONAM

Federação Árabe Palestina do Brasil, FEPAL

Instituto Brasil Palestina, IBRASPAL

Levante Popular da Juventude

Marcha Mundial das Mulheres, MMM

Movimento Brasil Popular, MBP

Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos, MTD

Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MST

Movimento pela Soberania Popular na Mineração, MAM

União Brasileira de Mulheres, UBM

União Brasileira dos Estudantes Secundaristas, UBES

União da Juventude Socialista, UJS

União de Negros pela Igualdade, UNEGRO

União Nacional LGBT, UNALGBT

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