MASSACRE DE CIVIS

Jovem palestina denuncia violência na Cisjordânia e teme pela própria família

Maynara Nafe tem 21 anos e vive no Brasil. Ela deu entrevista para a imprensa brasileira em que falou sobre desespero dos entes queridos em meio ao conflito

A palestina Maynara Nafe.Créditos: Arquivo pessoal
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A palestina Maynara Nafe tem 21 anos e mora no Brasil, onde atua como secretária de juventude da Federação Árabe Palestina (Fepal). No último sábado (7) recebeu um telefonema da prima, que mora na Cisjordânia (enclave palestino), desesperada. “Me ligou chorando às 5 horas da manhã dizendo que não sabia como seria o dia de amanhã. Me disse que os bombardeios iriam começar”, relatou em entrevista ao portal Uol.

Naquele momento, o grupo islâmico-palestino Hamas já começava a chamada operação "Tempestade Al-Aqsa”, com o lançamento de foguetes e a invasão de grupos militarizados por terra em território israelense a partir da Faixa de Gaza, outro enclave palestino. Momentos mais tarde, os primeiros bombardeios contra Gaza seriam lançados pelo Estado de Israel. Mas do outro lado do país, a moça já sabia o que viria a seguir. E a prima, no Brasil, também conhece bem essa realidade.

“O risco de sair de casa é quase certeza de não voltar”, explica. “Não sei se amanhã minha família vai estar viva. Não sei se as pessoas vão estar vivas”, alerta.

Ela tem três tios e quatro primos que vivem na Cisjordânia e aponta que a violência do conflito iniciado em Gaza já se espalha pela região. Um dos tios também a contatou e disse que não tinha medo, pois se “deparava com a morte todos os dias”. Ele se referia às frequentes violações de direitos humanos do Estado de Israel na região.

A Cisjordânia, onde vivem seus familiares, está a mais de 90 km da Faixa de Gaza onde o conflito está concentrado. Mas apesar da distância, a violência repercute ali. Enquanto os números oficiais apontam 413 mortos em Gaza, na Cisjordânia já foram 7 os palestinos mortos em massacres desde o último sábado.

“A gente consegue perceber os bombardeio porque o ar muda, surge uma fumaça mais densa no céu. É possível ver as bombas atiradas. Conseguimos ficar sabendo mesmo se não tivéssemos acesso às notícias”, conta.

Maynara explica que a Faixa de Gaza está completamente cercada pelo Estado de Israel desde 2007. Ninguém pode entrar ou sair do território sem a autorização dos israelenses. Itens como chocolates, por exemplo, são proibidos de entrar. Ela avalia o regime ao qual os palestinos estão submetidos por Israel como um "sistema colonial".

"Tenho muita admiração pelos palestinos que vivem lá neste momento, sei o quanto é difícil ocupar a Palestina. Mas é um sentimento misto porque sabemos que corremos risco de vida o tempo todo," conclui.

O conflito

Na manhã deste sábado (7) o Hamas, grupo político islâmico-palestino considerado terrorista por uma série de países ocidentais por sua relação com o Irã e um passado de ações que valem o rótulo, empreendeu a chamada “Tempestade Al-Aqsa”, uma operação militar surpresa para agredir Israel, a quem alega estar intensificando as políticas de invasão da Faixa de Gaza. Como resposta, o governo israelense do premiê Benjamin Netanyahu lançou a operação “Espadas de Ferro”, que consiste no bombardeio da cidade de Gaza. Ao todo, o conflito já deixou pelo menos 1100 mortos.

O Hamas emitiu uma nota pública explicando a razão da sua operação. “O povo palestino e sua resistência estão a levar a cabo uma operação para defender o povo, a terra e os locais sagrados,” diz a nota.

O movimento acusa a ocupação israelense, lembrando que todo o território de Israel era controlado pelos palestinos antes de 1947, de estar impedindo o acesso à Mesquita de Al-Aqsa, em Jerusalém, importante templo para os palestinos muçulmanos. Além disso, o grupo também exige a liberação dos presos políticos palestinos e o fim da ocupação.

Na Tempestade Al-Aqsa, o Hamas lançou uma série de mísseis e foguetes contra o território hoje controlado por Israel. Cerca de 2 mil combatentes também derrubaram muros, checkpoints e tomaram bases da IDL (Israeli Defense Forces), adentrando o território. De acordo com informações do lado israelense, atiradores palestinos estariam realizando massacres e fazendo reféns em 22 localidades no sul do país.

De acordo com as autoridades israelenses, o ataque – que é o maior desde a Guerra do Yom Kippur, quando forças árabes invadiram o país há 50 anos – já deixou pelo menos 700 mortos e 2000 feridos.

Já a resposta de Israel, que bombardeou até mesmo hospitais na Faixa de Gaza, deixou 420 mortos no lado palestino, além de milhares feridos e desabrigados.

A ONG Médicos Sem Fronteiras que atua na Faixa de Gaza denunciou os bombardeios a hospitais, equipamentos de saúde e a morte médicos e enfermeiros. Entre as instituições afetadas, estão o Hospital Indonésio e o Hospital Nasser, ambos na cidade de Gaza.

“Pedimos a todas as partes que respeitem as infraestruturas de saúde, que precisam continuar sendo um santuário para as pessoas que estão em busca de tratamento”, diz a Médicos Sem Fronteiras em nota.

Hezbollah entra em cena

A tensão aumentou ainda mais na manhã deste domingo por conta de uma intervenção do Hezbollah, organização política e paramilitar islâmica do Líbano, que lançou mísseis contra três posições militares israelenses e uma região denominada Fazendas de Sheeba, território reivindicado pelos libaneses ocupado por Israel desde 1967. O ataque do Hezbollah, segundo o próprio grupo, se deu em "solidariedade" ao povo palestino. 

Forças militares israelenses, então, responderam à investida do Hezbollah com ataques ao Sul do Líbano utilizando mísseis e drones. O governo israelense também tenta evacuar as localidades da fronteira norte, com o Líbano.

Declaração de guerra

Neste domingo (8) o premiê Benjamin Netanyahu anunciou que o país está oficialmente em guerra, ao contrário do anúncio de sábado de “estado de guerra”, e autorizou as operações militares correspondentes.

“A guerra que foi imposta ao Estado de Israel em um ataque terrorista assassino da Faixa de Gaza começou na manhã de ontem”, diz o comunicado do Gabinete de Segurança de Israel, explicando o anúncio.

A declaração veio em momento que as autoridades sanitárias de Israel apontavam 700 mortos e 2,2 mil feridos, dentre os quais 365 estariam em estado grave. Do lado palestino, até o momento, foram 413 mortes confirmadas na Faixa de Gaza e 7 na Cisjordânia.

Com a declaração de guerra, o Estado de Israel pode fazer uma ampla mobilização de reservistas, lembrando que a sociedade israelense é altamente militarizada e que todos os seus cidadãos, ou quase todos, em algum momento fazem o serviço militar e concluem o período indo para a reserva.

Nesse contexto, as autoridades israelenses preparam a evacuação de 24 localidades do sul do país que fazem fronteira ou estão perto da Faixa de Gaza, o epicentro da atuação do Hamas que agora sofre com bombardeios. Com população de quase 2 milhões de habitantes, a cidade de Gaza já registrou pelo menos 20 mil desabrigados após os ataques.

Nesta manhã as forças israelenses anunciaram a destruição de uma série de instalações do Hamas em Gaza, através dos bombardeios aéreos. A sede de inteligência do Hamas, além de dois bancos e instalações militares teriam sido destruídos.

A comunidade internacional acompanha com atenção e preocupação a escalada do conflito. O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, conversou com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin "Bibi" Netanyahu, e ofereceu "apoio total" ao país para dar resposta ao ataque do Hamas. O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, por sua vez, se disse "chocado" com a investida da organização islâmica-palestina e anunciou que "não poupará esforços para evitar a escalada do conflito, inclusive no exercício da Presidência do Conselho de Segurança da ONU".