“Toda palestina é refugiada. Independente da sua descendência, independente se você nasceu na Palestina ou não, porque essa realidade, ela atravessa gerações”, conta Jannath Abujazar, brasileira-palestina de 22 anos de idade à Fórum.
Filha de palestinos de Gaza, a jovem nascida no Brasil já perdeu 14 familiares por bombardeios israelenses na região. Através de suas redes sociais, ela relata a dor de experienciar o conflito à distância.
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A mãe de Jannath veio para o Brasil há duas décadas. Teve dois filhos na Palestina e outros dois aqui, incluindo a própria entrevistada. Por muitas vezes, familiares tentaram convencer a matriarca a voltar à região do conflito, mas ela se recusou e optou por viver no Brasil. Mas essa escolha não veio sem perdas.
Segundo a jovem, sua mãe perdeu por anos contatos com seus familiares e, nos últimos dias, vive em constante sofrimento por conta de sua família. Isso porque Jannath não conta tudo sobre o que está acontecendo com os Abujazar no Norte de Gaza.
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“Salvar a vida dos filhos, ou voltar para Palestina e lutar pela causa e ter sua família? Ela tava sozinha aqui. Meu pai abandonou a gente, então ela estava sozinha num país que ela não sabia nada. Por essas e outras, a gente tem poupado um pouco ela, porque como que você vai explicar pra sua mãe?”, afirma ela à Fórum.
“A minha mãe é uma pessoa cheia de problemas de saúde. Nesse ano ela desenvolveu mais um, que é um problema cardíaco. Ela vê o Jornal Nacional, vê que tem muita gente morrendo. Ela fica preocupada, tenta ligar pros irmãos dela, mas tudo que a gente sabe são as informações que eles passam pra gente. A gente não conta pra ela, porque é realmente muito triste”, relatou.
“Tem sido horrível”
“A primeira atualização que a gente teve de morte, foram 8 pessoas da família. Dias depois, a gente recebeu uma nova atualização, de que 14 pessoas da família já morreram nos bombardeios, e é simplesmente horrível”, conta. “Por mais que você tenta segurar, você começa a chorar, porque é um dos seus, sabe?”, desabafou.
Os membros da família Abujazar que moravam na região norte da Faixa de Gaza tiveram que fugir após Israel ordenar a evacuação para bombardeios, assim como outros 1 milhão de palestinos.
"Depois da ordem de evacuação, boa parte da família fugiu. A família foi toda separada. Eu tenho uma tia chamada Ahmal, ela achou um desaforo Israel expulsá-la da própria casa e falou que nem que ela tenha que morrer ela vai ficar ali", afirmou.
A região norte da Faixa de Gaza tem sido o principal alvo dos ataques israelenses, mas cidades mais ao sul - como Rafah, onde vive sua família paterna - também têm sido alvos de bombardeios do IDF.
"Israel mandou evacuar e não parou de bombardear o sul. Então muitos palestinos que fugiram pro Sul estão voltando para suas casas ao norte. Porque mesmo que eles morram eles preferem morrer com dignidade na própria casa do que ficar fugindo e ser explodido de qualquer jeito", lamenta.
Como militante da causa palestina, a dor é dupla. “Não só como palestino, como o povo palestino morrendo, mas é a sua família morrendo, e você fica muito mal, muito, muito mal”, afirma.
Jannath elogiou a postura brasileira pelas tentativas de pausa humanitária na ONU. “Eu estou me sentindo muito acolhida pelo Brasil e pelo governo brasileiro de fazer algumas coisas, de mandar ajuda humanitária, de tentar propor resoluções. Apesar de a gente saber que os Estados Unidos vai vetar tudo, é bom ver que as pessoas estão tentando se movimentar”, se referindo à tentativa de resolução do Brasil no Conselho de Segurança.
Sensação de impotência
Ela também relata uma forte sensação de impotência. Diversos amigos a questionam sobre como fazer para enviar recursos para a Palestina, mas ela também não tem uma resposta simples.
“A gente não pode fazer nada, e eu acho que isso é o que mais machuca. Você sentir que é incapaz, que não importa o que você faça, Israel não vai parar. Os números tendem a subir a cada notícia, a cada ligação, a cada áudio, a cada mensagem. É desesperador”, completa.
Ela afirma que sua principal arma tem sido as redes sociais, onde expõe fatos sobre o genocídio contra os palestinos e o regime de apartheid de Israel.
“A forma que eu tento, e eu falo pros meus amigos fazerem também - tem muita gente me apoiando - é compartilhar alguma coisa da Palestina, falar que a Globo tá mentindo, não sei, dá teu jeito, dá teus pulos, sabe?”, brinca.
“Infelizmente essa é a única forma, a única coisa que tem pra gente fazer. Nossa função aqui, como pessoas incapazes de fazer alguma coisa de fato, é propagar essas notícias”, completa.
Por fim, relata que, apesar das dores do conflito, tem sentido que não está sozinha. “Você começa a se sentir acolhido no sentido de que parece que você não tá falando com a parede, parece que você não tá falando sozinha, que tem alguém te ouvindo, sabe?”, completa a jovem palestina, que seguirá na luta das ideias.