O caso de estupro envolvendo o técnico Cuca e ocorrido em 1987 em Berna, na Suíça, teve uma reviravolta após o Tribunal Regional de Berna-Mittelland anular a condenação do treinador em 28 de dezembro passado. A decisão, no entanto, não inocentou o treinador.
Em 22 de novembro a juíza do caso, Bettina Bochsler, concordou com a defesa de Cuca e entendeu que ele foi julgado agosto de 1989 a revelia pela Justiça suíça. Ou seja, sem qualquer representante legal. A defesa pedia um novo julgamento enquanto alegava ter reunido provas suficientes para provar que ele não abusou da jovem vítima, que então tinha 13 anos.
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Nesse contexto, o Ministério Público local entendeu que o novo julgamento não seria possível, uma vez que o crime já estaria prescrito, e recomendou a anulação da pena e a extinção do processo.
O caso tramitou até que em 28 de dezembro Bochsler acatou a recomendação dos procuradores, anulou a condenação de Cuca e ainda determinou o pagamento de 13 mil francos suíços, equivalente a R$ 75 mil, como indenização. Descontados os custos processuais, o treinador deverá receber em torno de R$ 55 mil. A decisão foi divulgada somente nesta quarta-feira (3).
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Ao contrário de inocentar Cuca, a decisão funciona como uma forma de reconhecer a falha da própria Justiça suíça na condução do caso e corrigi-la. Afinal de contas, conforme mandam as cartilhas dos direitos humanos, ninguém pode ser julgado a revelia.
Mesmo sem inocentá-lo, a decisão pode ser considerada uma vitória por Cuca, que teve a carreira interrompida em abril deste ano, quando chegou a ser contratado pelo Corinthians mas sofreu forte pressão da torcida, que pedia sua demissão por conta do episódio.
“Hoje entendo que deveria ter tratado desse assunto antes. Estou aliviado com o resultado e convicto de que os últimos oito meses, mesmo tendo sido emocionalmente difíceis, aconteceram no tempo certo e de Deus”, afirmou o treinador em nota oficial divulgada para a imprensa.
O Escândalo de Berna
Em julho de 1987, o então atacante Cuca, o ex-goleiro Eduardo, o ex-zagueiro Henrique e o ex-atacante Fernando foram presos em um hotel em Berna, na Suíça, durante uma excursão do Grêmio, clube que defendiam, ao país europeu. A acusação? Violência sexual contra pessoa vulnerável, que no caso era uma adolescente de 13 anos. A menina foi ao hotel pedir camisetas aos jogadores e acabou tragada ao quarto dos astros, onde o crime teria ocorrido.
Os quatro ficaram cerca de um mês presos no país europeu. Após intervenção diplomática, todos acabaram libertados e retornaram ao Brasil. Porém, dois anos depois, foram julgados e condenados - não à revelia como Cuca afirmou em sua recente defesa, mas defendidos por advogado contratado pelo Grêmio. Para Cuca, a pena foi de 15 meses de detenção, que prescreveu antes de ser cumprida.
Em março de 2021, depois de mais de três décadas de silêncio, Cuca resolveu falar sobre a questão polêmica, conhecida como o “escândalo de Berna”, em entrevista exclusiva para Marília Ruiz, colunista do UOL. “Eu preciso dar um basta nisso. Claro que essa história me incomoda demais. Não posso virar bandido depois de 34 anos. Resolvi juntar minha mulher e minhas duas filhas para falar desse caso de 12.400 dias atrás porque sou inocente”, declarou o técnico.
“Não fui julgado e culpado. Fui julgado à revelia, não estava mais no Grêmio quando houve esse julgamento com os outros rapazes. É uma coisa que eu tenho uma lembrança muito vaga, até porque não houve nada. Não houve estupro como falam, como dizem as coisas. Houve uma condenação por ter uma menor adentrado o quarto. Simplesmente isso. Não houve abuso sexual, [não houve] tentativa de abuso ou coisa assim”, garantiu.
Logo que assumiu o comando técnico do Corinthians em abril de de 2023, Cuca contestou as acusações que então voltaram a superfície: “Sou uma pessoa do bem, vivo numa família de mulheres, 90% da minha família são mulheres. Esse episódio de 1987 precisa ser explicado. Eu estava no Grêmio havia duas ou três semanas apenas, não conhecia ninguém. Eu jamais toquei numa mulher indevidamente ou inadequadamente. Sou um cara de cabeça e consciência tranquilas. Tenho a consciência tranquila”, ressaltou o técnico.
Logo a seguir, Willi Egloff, o advogado que defendeu a vítima à época, usou as redes sociais para desmentir Cuca. “A declaração do Alexi Stival [Cuca] é falsa. A garota o reconheceu como um dos estupradores. Ele foi condenado por relações sexuais com uma menor”, declarou o advogado que à época foi contratado pela família da vítima, tendo sido uma das poucas pessoas que teve acesso aos autos do processo. A Justiça da Suíça confirmou que os documentos referentes ao caso estão em sigilo por 110 anos.
Ao jornal Der Bund, da própria cidade de Berna, Egloff também afirmou que um exame realizado pelo Instituto de Medicina Legal da Universidade de Berna encontrou o sêmen do então jogador do Grêmio – e atual treinador do Corinthians – na vítima. Também confirmou que a adolescente tentou o suicídio após o estupro. O processo foi concluído em 1989 com a condenação dos quatro jogadores envolvidos.
Após nova repercussão do episódio que paralisou sua carreira, Cuca contratou advogados na Suíça para tentar limpar seu nome. Aparentemente deu certo. Mas apesar disso, ele dificilmente conseguirá voltar a treinar um grande clube brasileiro sem ter de lidar com protestos contra a sua presença.