FASCISMO NEOLIBERAL

Privatização da Sabesp: Tarcísio e o esquema neoliberal para abastecer a sanha do mercado

Entrega da Sabesp, uma das maiores empresas de saneamento do mundo, mostra que o fascismo bolsonarista e a privataria tucana se convergem quando se trata de atender aos interesses do sistema financeiro transnacional

Tarcísio Gomes de Freitas em leilão do patrimônio público na Bovespa.Créditos: Rogério Cassimiro/Governo do Estado de SP
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Aspirante a ocupar o posto de candidato da terceira via, o governador de São Paulo, Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), revela que quando se trata de implantação das políticas neoliberais o fascismo bolsonarista se converge com a privataria tucana para atender a sanha dos mesmos grupos que orbitam o sistema financeiro transnacional, o chamado "mercado" como adula a mídia cúmplice.

O esquema de drenagem de recursos e patrimônio público é semelhante ao levado a cabo anos antes por governos do PSDB no estado e na esfera federal, que dilapidou patrimônios como Vale do Rio Doce e Banespa, entre outros.

A única diferença é a violência usada pelos fascistas, como ocorreu com a Eletrobrás no apagar das luzes do governo Jair Bolsonaro (PL). Violência que é classificada como eficácia pelos agentes do mercado envolvidos no conluio lucrativo, que abastece campanhas eleitorais para implantação de novos governos privatistas - sejam eles democráticos ou não.

Após diversos roadshows com "investidores" em Nova York, patrocinados por bancos como BTG Pactual e Itaú, Tarcísio deve selar no próximo dia 18 de julho o destino da maior empresa pública de saneamento do país - e uma das maiores do mundo.

Criada em 1973 com a fusão de seis autarquias, a Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) atua em 375 municípios, fornecendo água para 28,4 milhões de pessoas e fazendo a coleta de esgoto para outras 25,2 milhões.

"A Sabesp é responsável por cerca de 30% do investimento em saneamento básico feito no Brasil. Para o período 2023-2027, planeja investir aproximadamente R$ 26,2 bilhões, com foco na ampliação da disponibilidade e segurança hídrica, sem prejuízo dos avanços conquistados nos índices de coleta e tratamento de esgotos", diz a empresa em seu site.

No entanto, por bem menos, a empresa deve passar às mãos do "mercado" por meio de um processo no mínimo duvidoso que resultará na transferência do controle da Sabesp para o grupo Equatorial Energia.

"Esse processo está repleto de suspeitas que em qualquer outro governo seriam altamente criticadas. Desde o início, Tarcísio se negou a apresentar de forma clara os estudos que justificassem a necessidade de privatização. Contratou uma organização que trabalhou sob claro viés do mercado, sem considerar a vantajosidade para o interesse público. A vitória da Equatorial nessa oferta de ações reforça essas suspeitas. Foi a única concorrente no processo, adquiriu as ações da Sabesp por R$ 67 cada, um valor substancialmente inferior ao valor de mercado, que fechou em R$ 74,97 em 28 de junho. Mais que isso, existe um estudo econômico-financeiro feito pelo Sintaema [Sindicato dos trabalhadores em água, esgoto e meio ambiente do estado de São Paulo], que avaliou as ações da Sabesp em R$ 85,58, ou seja, R$ 18 a mais por ação. Estamos diante de uma possível dilapidação do patrimônio do estado no montante de aproximadamente R$ 1,8 bilhão com essa venda", afirmou à Fórum o deputado Paulo Fiorilo, líder da Federação PT/PCdoB/PV na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp).

A bancada do PT na Alesp ainda entrou com representação no Ministério Público de São Paulo (MP-SP) sobre um suposto conflito de interesses, já que a presidenta do conselho de administração da Sabesp, Karla Bertocco, ocupou cargo no Conselho de Administração da Equatorial até dezembro de 2023, quando Tarcísio já impunha toque de caixa à privatização da companhia.

"Nesse momento, resta-nos esperar pelas ações diretas de inconstitucionalidade que tramitam no Tribunal de Justiça do Estado e no Supremo Tribunal Federal, impetradas pelo PT, que questionam, respectivamente, a inconstitucionalidade da Lei que permitiu a desestatização e um decreto do governador que trata da gestão das unidades regionais da água e esgoto (URAEs) no estado, o que poderia inviabilizar a privatização. Além disso, o processo pode ser atrasado na medida em que o Tribunal de Contas do Estado ou o Ministério Público considerem procedentes as representações feitas que tratam das irregularidades desse processo", diz Fiorilo, sobre as chances de, ao menos, postergar a entrega da Sabesp à sanha do mercado.

Privataria

Fundada em 1999, em meio à privataria levada a cabo por Fernando Henrique Cardoso (PSDB) na Presidência, o grupo Equatorial avançou sobre as privatizações do setor elétrico e atualmente opera a distribuição de energia em 7 concessionárias nos estados do Maranhão, Pará, Piauí, Alagoas, Rio Grande do Sul, Amapá e Goiás, atendendo mais de 10 milhões de clientes nessas regiões.

A empresa é considerada uma das piores - e mais lucrativas - concessionárias de serviços públicos do país, acumulando processos desencadeados pelo Ministério Público nos Estados onde atua.

Em São Paulo, como acionista referencial, a Equatorial se comprometeu a adquirir 15% do capital da Sabesp pelo valor de R$ 6,9 bilhões. O percentual é menor do que os 18% que ficarão com o Estado - que atualmente é dono mais de 50% das ações.

No entanto, para vender a companhia estatal, Tarcísio se comprometeu a entregar para a Equatorial o direito de indicar o CEO da Sabesp, além do presidente e de três dos nove membros do Conselho de Administração. O Estado vai indicar outros três e o mesmo número será de conselheiros "independentes", representantes de sócios minoritários.

Sem contar com os quase R$ 7 bi em caixa, a Equatorial contratou bancos para vender ações das concessionárias de energia, em um sistema chamado empréstimo-ponte, para levantar R$ 5 bi para o pagamento da Sabesp.

Para isso, a empresa já apresentou o "modelo de negócios" da cartilha neoliberal que levará adiante: demissões e distribuição de dividendos aos fundos que aportarem o dinheiro para a compra de ações. 

Sem experiência no setor de saneamento - o grupo controla há dois apenas uma empresa do setor que atende a 16 municípios do Amapá -, a Equatorial pretende replicar o modelo de gestão nas concessionárias de energia, que gerou uma explosão nas faturas de luz para os consumidores.

Na declaração aos investidores - o chamado disclaimer -, a Equatorial promete a demissão de funcionários, com programas  "voluntários", reestruturação de times e estabelecimento de uma cultura voltada a resultados.

No setor de energia, boa parte das equipes, especialmente de manutenção, foram terceirizadas, causando o sucateamento do atendimento à população.

Além disso, a empresa promete uma política de remuneração dos fundos investidores que chegará à distribuição de 100% dos dividendos até 2030.

Daniel Dantas e Paulo Guedes

Por fim, a privatização da Sabesp traz de volta ao cenário figuras que mostram a cara desavergonhada em meio ao seleto grupo de agentes do sistema financeiro que aumentam seus lucros com a entrega do patrimônio público.

Com longa ficha criminal e preso por corrupção por duas vezes em 2008 na lendária operação Satiagraha, o banqueiro Daniel Dantas, dono do Opportunity, é um dos principais acionistas do grupo Equatorial.

Além do Opportunity, o grupo tem como acionista o fundo BlackRock, que acumula mais de 10 trilhões de dólares em ativos no mundo e financia guerras, como a da Ucrânia contra a Rússia. 

Se fosse um país, a BlackRock seria o terceiro mais rico do planeta, apenas atrás do PIB da China e dos EUA.

Durante o governo Bolsonaro, a BlackRock comprou participações na Eletrobrás, além da Cemig, Light e outras empresas de energia brasileiras. 

E por falar em Bolsonaro, um antigo super ministro, ao que tudo indica, atua nos bastidores para consolidar a venda da Sabesp.

Fundador do banco BTG Pactual, que financiou os roadshows de Tarcísio nos EUA, Paulo Guedes tem pupilos no Conselho de Administração da Equatorial.

Em 2005, o grupo foi comprado pelo PCP Latin America Power Fund Ltda, um fundo de private equity pertencente a ex-sócios do Banco Pactual, dando início ao período mais agressivo de aquisição das concessões.

Ex-sócio do Pactual, Carlos Augusto Leone Piani foi CEO da empresa e agora preside o Conselho de Administração.

Atualmente, o Conselho da Equatorial conta ainda com Guilherme Mexias Aché, vice-presidente, que atuou como chefe da área de análise de empresas de Guedes no Banco Pactual entre 1993 e 1998; e Luis Henrique de Moura Gonçalves, que também trabalhou no Pactual.

Com a privatização da maior empresa de saneamento do país, Tarcísio finalmente tira o coturno para calçar o sapatênis e sinaliza ao mercado e à mídia liberal que pode caminhar como o candidato da terceira via em 2026.

A entrega da Sabesp revela que o fascismo bolsonarista e a privataria tucana são faces da mesma moeda, que tem peso de ouro entre os grupos que atuam na órbita do sistema financeiro.

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