A tentativa de se "livrar" da Petrobras, incluindo a empresa no plano de privatizações a pouco mais de 4 meses para as eleições e manobrando a base no Congresso para acelerar o processo, mostra que Jair Bolsonaro (PL) está "emparedado" entre a busca por votos, forçando a redução de preços dos combustíveis, e os interesses dos acionistas de Nova York, que faturaram mais de R$ 100 bilhões com dividendos frutos da política de paridade dos preços adotada pela estatal brasileira, que puxa as altas constantes da gasolina e do diesel nas bombas. A análise é de William Nozaki, coordenador técnico do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep) e professor da Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fespsp).
"Bolsonaro está emparedado entre os interesses dos eleitores que precisam de combustível mais barato e os interesses dos acionistas da Petrobras que, para maximizar os seus ganhos, desejam combustível mais caro", disse Nozaki à Fórum.
Te podría interesar
Para o pesquisador do Ineep, o presidente busca ganhar tempo para espaçar as altas constantes dos combustíveis diante das pesquisas que apontam possível vitória de Lula (PT) no primeiro turno e, ao mesmo tempo, acalmar agentes do sistema financeiro, que pressionam pelos reajustes.
"A intenção agora é passar um recado favorável ao mercado financeiro enquanto tenta diminuir a velocidade dos reajustes para não perder mais eleitores", afirma.
Te podría interesar
Nozaki não acredita na privatização antes das eleições, em outubro, mas alerta que a venda da Petrobras deve ser concretizada em caso de reeleição de Bolsonaro que, segundo o pesquisador, não tem "capacidade cognitiva para compreender a complexidade da indústria de óleo e gás".
"O presidente não tem interesse, competência técnica e capacidade cognitiva para compreender a complexidade da indústria de óleo e gás, para ele vender a Petrobras significa simplesmente se livrar de um problema".
Leia a entrevista na íntegra:
Fórum: Qual o significado prático da inclusão da Petrobras na carteira do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) do Ministério da Economia?
William Nozaki: Trata-se de uma tentativa de demonstrar à base neoliberal do governo o seu compromisso com as privatizações. O objetivo é ganhar tempo e acalmar o mercado que exige e espera novas elevações nos preços dos combustíveis.
Fórum: Há possibilidade de um processo relâmpago de privatização da empresa faltando 4 meses para as eleições?
William Nozaki: Não há nenhuma vedação jurídica que impeça desinvestimentos em período eleitoral. No entanto, o cenário de incerteza política e econômica dificulta a construção de um consenso sobre a modelagem técnica e deixa possíveis investidores interessados em compasso de espera. Uma operação como essa é muito complexa, se for feita de maneira açodada pode provocar muitos danos para a segurança energética do país. Um processo relâmpago de privatização é bastante improvável, embora devamos ter toda a atenção para o ímpeto de destruição e butim que move os presidentes da República e da Câmara.
Fórum: Qual é a real intenção de Bolsonaro ao buscar acelerar o processo de privatização da Petrobras em meio ao processo eleitoral?
William Nozaki: Bolsonaro está emparedado entre os interesses dos eleitores que precisam de combustível mais barato e os interesses dos acionistas da Petrobras que, para maximizar os seus ganhos, desejam combustível mais caro. Sem conseguir mediar esses interesses contraditórios e sem dar uma resposta efetiva para a inflação de combustíveis, Bolsonaro terceirizou sua responsabilidade para o cenário externo, depois para os governadores, na sequência para a direção da Petrobras, Bolsonaro provocou uma sequência de turbulências na empresa com indicações indevidas e trocas assoberbadas na direção a fim de ganhar tempo e atrasar os reajustes impostos pela PPI que ele próprio e a equipe econômica defendem. A intenção agora é passar um recado favorável ao mercado financeiro enquanto tenta diminuir a velocidade dos reajustes para não perder mais eleitores.
Fórum: A Petrobras pode ser privatizada em um eventual segundo mandato de Bolsonaro? Quais os riscos disso acontecer?
William Nozaki: Em um segundo mandato, Bolsonaro pode sim tentar privatizar a Petrobras. O presidente não tem interesse, competência técnica e capacidade cognitiva para compreender a complexidade da indústria de óleo e gás, para ele vender a Petrobras significa simplesmente se livrar de um problema. E para o centrão que o apoia essa venda, é vista apenas como uma boa oportunidade para realizar negócios com setores empresariais privados. O risco é de elevação dos preços dos combustíveis, desabastecimento no mercado de derivados e de exposição à insegurança energética.