O Conselho Federal de Medicina (CFM) adotou uma nova resolução em que proíbe a realização de um método para interromper a gravidez, em casos de aborto legal, após 22 semanas de gestação.
O método, chamado de assistolia fetal, consiste na aplicação de uma injeção com produtos químicos que interrompem a atividade cardíaca do feto para, então, ser retirado do útero. A medida é recomendada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para casos de aborto legal após 20 semanas, pois evita, entre outras coisas, que o feto seja expulso ainda com sinais vitais antes de ser retirado do útero.
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No Brasil, esse é o único procedimento permitido para realização do aborto após a 22º semana. A proibição do método foi aprovada no dia 21 de março e divulgada no Diário Oficial desta quarta-feira (3).
O CFM alega ter utilizado a Constituição Federal, a Declaração Universal dos Direitos Humanos e outras convenções sobre direito à vida para justificar o veto ao procedimento.
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Vítimas de estupro são impedidas de realizar aborto legal
O veto ao procedimento foi criticado por entidades como a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo), que afirmou ter recebido ao menos quatro relatos de mulheres e crianças vítimas de estupro que tiveram o aborto legal negado devido à nova resolução.
Um desses casos é de uma menina de 12 anos, que está grávida de 27 semanas e tem a permissão judicial para o procedimento, mas os médicos temem sofrer represálias do CFM.
"Estamos recebendo várias queixas de médicos, do Amazonas ao Nordeste, de meninas que estão chegando com gestações mais avançadas para interrupção da gravidez e os médicos não estão sabendo o que fazer porque se sentem proibidos pelo CFM", conta o presidente da comissão de violência sexual e interrupção da gestação prevista em lei da Febrasgo, Rosires Pereira, à Folha de S. Paulo.
O presidente ainda acrescentou que a comissão está sugerindo que os médicos entrem em contato com Defensorias Públicas e Ministérios Públicos das suas regiões para obter amparo judicial.
Outro caso relatado por Rosires é de uma mulher que foi vítima de estupro e mantida prisioneira por um traficante. Somente após a prisão do abusador é que ela pôde buscar o aborto legal, já com 24 semanas de gestação.
"Essa mulher tem direito de interromper a gravidez ou não tem? Onde estão os direitos humanos? A gente tem que proteger essas mulheres", afirma.
MPF cobra explicações
Ainda na quarta-feira (3), o Ministério Público Federal (MPF) cobrou explicações do CFM sobre o veto ao procedimento. O órgão quer saber a fundamentação técnica e legal que levou o conselho a proibir a assistolia fetal após 22 semanas, visto que a legislação brasileira não determina prazo para interromper a gravidez em casos de aborto legal.
O documento foi assinado por procuradores da República de São Paulo e do Rio Grande do Sul e estabelece o prazo de cinco dias para retorno do CFM.
Deputada apresenta projeto para suspender resolução
A deputada federal Erika Hilton (PSOL-SP) apresentou um Projeto de Decreto Legislativo, na Câmara dos Deputados, para suspender a resolução do CFM.
"Esse novo ataque de extremistas e fundamentalistas ao direito das mulheres e pessoas que gestam sobre seu próprio corpo é um absurdo completo, e não podemos nos calar ou permitir esses avanços", afirmou em publicação no X (antigo Twitter).