CRÔNICA

Chegando em Bremen – Por Esther Rapoport

"O burro, o cão, o gato e o galo resolveram ir para Bremen porque foram considerados velhos e inúteis por seus patrões..."

A cidade de Bremen.Créditos: Wikimedia Commons
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O burro, o cão, o gato e o galo resolveram ir para Bremen porque foram considerados velhos e inúteis por seus patrões... Na dita “terceira idade”, os 4 protagonistas do conto “Os Músicos de Bremen” queriam seguir trabalhando e encantando as pessoas.

Como eu!

Então vamos para Bremen! Quer dizer, vou para Bremen!

Por que Bremen? Porque consegui emprego em uma empresa aérea que tem escritório lá e precisa de gente falando português, vejam só!

Falando inglês e mais espanhol, italiano e português, posso trabalhar em Bremen sem entender nem 3 palavras na língua de Goethe.

A cidade é bonitinha. Além de um belo meio-centro medieval e outro meio barroco, tem a própria história dos Músicos de Bremen, reinterpretada pelos Irmãos Grimm.

Vocês lembram? O burro, o cão, o gato e o galo, que viviam em vilarejos do norte da Alemanha, envelheceram e foram abandonados por seus donos porque não conseguiam mais dar conta do recado: carregar os sacos de farinha, caçar as lebres, caçar ratos e o último ia virar canja. Assim, largados no mundo, o burro sugeriu irem para a cidade de Bremen e lá se tornarem artistas. No caminho, eles encontraram um grupo de ladrões escondidos numa casa. Combinados, o cão subiu nas costas do burro, o gato na do cão, e o galo bateu asas no topo da pirâmide, fazendo muito barulho. Foram confundidos com um monstro e os ladrões, assustados, fugiram da casa, deixando para o grupo de idosos um lugar para passarem o resto de suas velhices, confortavelmente.

O burro, o cão, o gato e o galo de Bremen

Moral da história... hummm... aí vem a parte que eu gosto: desde a Idade Média, Bremen fazia parte da “Liga Hanseática”, uma aliança de cidades mercantis na costa do Mar do Norte e do Mar Báltico, alemãs e não alemãs que, diferente dos territórios vizinhos que viviam ainda dentro do rigor do sistema feudal, tinham economias dinâmicas, viviam do comércio e o contato constante com outros povos abria espaço para novas ideias, tinham mais liberdade e por isso cresceram e prosperaram. Até hoje, Bremen é uma cidade-estado dentro da república alemã e se chama oficialmente: Cidade Hanseática Livre de Bremen (Freie Hansestadt Bremen, assim como Hamburgo: Freie und Hansestadt Hamburg).

No conto, a escolha de Bremen como destino é emblemática: um local de liberdade e autonomia, sem as amarras da autoridade feudal. Lá não mandavam os nobres nem obedeciam os vassalos.

Essas personagens representam as classes sociais da época: os donos dos animais eram os senhores feudais, proprietários das terras, e os animais eram os trabalhadores rurais, submetidos ao regime de servidão. E Bremen era o paraíso!

Mas tem um detalhe: os bichos nunca chegaram a Bremen, porque se instalaram na casa dos ladrões, no meio do caminho.

Eu não, eu vou chegar lá, com ou sem apartamento, vou estacionar minha mala em algum canto da cidade e, para ter boa sorte, vou tocar as patas da escultura em bronze do burro cantor, que fica no centro da cidade. Mas tem que tocar as duas patas do burro ao mesmo tempo, senão o povo de Bremen vai dizer que tem um burro cumprimentando outro...

Abraços!

*Esther Rapoport é graduada em História pela Universidade de São Paulo, mas se dedicou nos últimos 40 anos à indústria do Turismo, tendo trabalhado em diversas empresas do setor além de oferecer palestras e cursos para profissionais do turismo e viajantes curiosos, interessados em ampliar seu repertorio sobre a História dos mais variados destinos do planeta. Mora atualmente na Alemanha

**Este artigo não reflete, necessariamente, a opinião da Fórum