EX-ATLETAS REACIONÁRIOS

Por que ex-atletas reacionários vão para as redes destilar ódio?

Renato Portaluppi, Nenê Hilário, Emerson Fittipaldi, Nelson Piquet, Ana Paula Henkel entre outros namoram com o fascismo, por Por Francisco Fernandes Ladeira

Nelson Piquet no Rolls Royce da Presidência da República.Créditos: Reprodução/Twitter
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Por Francisco Fernandes Ladeira*

Encerrar a carreira esportiva nem sempre é tarefa fácil para um atleta profissional. Alguns encaram com naturalidade o final precoce de suas atividades (geralmente antes dos 40 anos). Já outros parecem não assimilar a ideia de que não atuarão mais em gramados, quadras, piscinas ou pistas mundo afora e que ficarão distantes dos holofotes da mídia.  

Sendo assim, devido a impossibilidade de não se destacarem por seus dotes esportivos, muitos atletas buscam outras formas de estar em evidência junto ao grande público, como, por exemplo, por meio de postagens polêmicas nas redes sociais e declarações sobre questões políticas.

Tratam-se dos ex-atletas reacionários.

A ex-jogadora de voleibol, Ana Paula Henkel, cansada de perder para Cuba, nos anos 90, quando atuava pela seleção brasileira, deve ter tomado asco a tudo que remeta à esquerda e ao socialismo. Em sua militância ultradireitista nas redes sociais e nos tempos de Jovem Pan, Ana Paula se destacou por seu ódio ao PT, propagandear a moralista e seletiva campanha anticorrupção, espalhar fake news sobre a pandemia da Covid-19, defender o Estado mínimo e atacar movimentos de minorias.

Não por acaso, em 2020, a voleibolista foi processada por homofobia (por ter chamado um assessor de imprensa de “bicha brega”. Dois anos depois, ela fez comentários transfóbicos no Instagram, após a nadadora trans Lia Thomas vencer uma competição universitária em Atlanta, nos Estados Unidos.

O anti-petistmo de Ana Paula também é compartilhado pelo tricampeão de Fórmula 1, Nelson Piquet. Conforme relatou o próprio filho do piloto, durante evento ligado ao automobilismo brasileiro, Piquet tinha o hábito de falar vários palavrões quando Lula, então em seus dois primeiros mandatos, aparecia na televisão. Recentemente, Piquet afirmou que o atual chefe do Executivo Federal tem que “estar no cemitério”.

Trata-se do (rancoroso) preconceito da classe média contra o presidente que colocou em prática políticas direcionadas para os estratos menos favorecidos da população.

Ferrenho apoiador de Jair Bolsonaro, Piquet recebeu 6 milhões de reais do governo do ex-capitão (por meio de um contrato, sem licitação, entre sua empresa Autotrac e o Inmet), foi “motorista” do “mito” em um ato antidemocrático (realizado em 7 de setembro de 2021) e responsável por guardar em sua fazenda joias e outros presentes recebidos por Bolsonaro enquanto presidente da República (para que tais itens não fossem entregues para o acervo da União). Típico exemplo do “cidadão de bem”.

Tudo isso sem falar no recente caso de racismo de Piquet contra seu colega de profissão Lewis Hamilton.

Já o também campeão da Fórmula 1, Emerson Fittipaldi, que atualmente ocupa os noticiários por causa de suas dívidas estratosféricas, foi candidato (derrotado) ao senado italiano pelo controverso partido de extrema direita Fratelli d'Italia, no ano passado. Na ocasião, o ex-piloto declarou: “Quero mudar a imagem fascista que Bolsonaro tem na Europa”.

Decerto, é até esperado que nomes como Nelson Piquet e Emerson Fittipaldi se posicionem de forma favorável aos interesses de sua classe social. No entanto, o que leva ex-atletas de origem proletária a apoiarem a direita política?

O grande Paulo Freire já dizia: “quando a educação não é libertadora, o sonho do oprimido é ser o opressor”. São os casos dos ex-atletas, de origem pobre, filiados a partidos conservadores (representantes dos interesses da elite econômica): Acelino “Popó” Freitas (PRB), Márcia Fu (União Brasil) e Wanderlei Silva (Progressistas).

Por sua vez, o ex-jogador de basquete, Nenê Hilário (que, ainda na ativa como esportista, fez uma postagem em suas redes sociais insuflando a golpista empreitada bolsonarista contra o STF), na campanha presidencial de 2022 gravou um vídeo com uma bandeira do Brasil, em que dizia que o país tinha “oportunidade de continuar crescendo” com Bolsonaro.

Não obstante, nosso esporte mais popular, o futebol, também têm seus ex-atletas reacionários.

O senador Romário foi favorável ao golpe de 2016. Renato Portaluppi, atual treinador do Grêmio, já declarou que quem não apoia Sergio Moro e Bolsonaro é contra o Brasil. Felipe Melo, do Fluminense, “ex-atleta em atividade”, é um conhecido militante bolsonarista; caminho também seguido por Rivaldo, Marcelinho Carioca, Ronaldinho Gaúcho, Marcos, Edmundo, Robinho, Kleber Gladiador e Fabrício Manini (que atuou como zagueiro por Ceará e Fortaleza).

Manini, inclusive, chegou a escrever no Instagram: “Depois do resultado do primeiro turno das eleições [de 2022], espero que todos eleitores do Bolsonaro, assim como eu sou, quando encontrar alguém passando fome ou pedindo algum alimento, não ajude. Passe com o carro por cima da cabeça, para o país não ter mais despesas com esses vermes”.

Evidentemente, o universo dos ex-atletas não é habitado apenas por indivíduos reacionários. Joanna Maranhão, Ana Moser, Juninho Pernambucano, André Arantes, Casagrande, Raí, Paulo César Caju e Reinaldo, entre tantos outros, são alguns exemplos de posturas críticas frente à realidade e engajamento social.

O que este breve texto tentou demonstrar é que muitos esportistas, ao se preocuparem apenas com o desenvolvimento de suas habilidades físicas, não se atentaram em também “exercitar” o órgão mais importante do sistema nervoso humano, que controla o corpo todo: o cérebro.

*Francisco Fernandes Ladeira é doutorando em Geografia pela Unicamp. Autor, entre outros livros, de A ideologia dos noticiários internacionais (CRV).