O mecanismo que aproxima clientes e fornecedores de serviços através de aplicativos online chegou à produção musical. Criada em Portugal em 2020, a Musiversal funciona de maneira semelhante ao Uber ou Ifood. Vários músicos, técnicos de som e produtores estão cadastrados na plataforma. E um cliente que precisar de um violonista, baterista ou um técnico para mixar sua gravação, seja ela uma trilha, jingle ou composição própria, vai lá e contrata.
Os dois – cliente e músico e/ou engenheiro de áudio – se falam por videochamada e a gravação, que dura em média 50 minutos, é feita em tempo real. O resultado final é entregue na própria plataforma.
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A vantagem que a plataforma oferece, segundo André Miranda, fundador e CEO da Musiversal, é baratear “dramaticamente” o preço de uma gravação. Segundo estimativas, o preço final para se produzir uma trilha de áudio profissional, com músicos experientes e ótima qualidade cai cerca de dez vezes com relação ao mercado.
“A Musiversal tem potencial para ser o motor da indústria da produção musical a nível mundial. A prova é que vamos a caminho dos cem músicos contratados — full time e part time — e das cem mil sessões anuais. A Musiversal foi desenhada para gerar mais valor simultaneamente para os utilizadores e os músicos, sendo que, ao contrário da norma na ‘music tech industry’, o impacto que essa plataforma tem quando cresce é ter mais músicos e criadores de música ativos. Os músicos ganham acesso a rendimento fixo e os utilizadores ganham acesso a produção musical de alta qualidade a um preço dramaticamente mais acessível do que é possível hoje. A produção musical é uma indústria que vale bilhões de euros e a Musiversal é um modelo eficiente e escalável que vai permitir a essa indústria crescer ainda mais”, afirmou André Miranda ainda em 2021, quando a plataforma dava os primeiros passos.
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Para ser contratado
Para um músico ser contratado pela Musiversal, ele tem que passar por um processo de audição. Para tal, além de tocar bem o instrumento, ele precisa dominar as tecnologias e a comunicação com os clientes (veja mais adiante). Além disso, não há estilo musical predominante, o músico define o que grava.
O músico vai precisar também de um estúdio que atenda as necessidades do seu instrumento, além de boa conexão com a internet e isolamento acústico. Para que um leigo entenda melhor, um piano ou uma bateria necessitam de muito mais microfones do que uma flauta, por exemplo.
Já a conexão é para que o cliente acompanhe a gravação sem latência, o tempo em que é executada e transmitida a música. E, por falar em contato entre músico e cliente, outra exigência é que o artista fale inglês fluentemente, pois os Estados Unidos são o maior mercado da plataforma.
A remuneração
As semelhanças com o Uber ou Ifood ficam, no entanto, apenas na aproximação entre cliente e fornecedor e também na falta de vínculo empregatício. Os músicos não são funcionários da plataforma, não têm garantia alguma e têm que trabalhar com o seu próprio equipamento. Ou alugar um estúdio, mas daí, o negócio vai deixando de valer à pena.
No mais, é tudo muito diferente. A Musiversal paga os músicos de maneira fixa, tendo ou não gravação e o cliente cadastrado também paga por mês, como um sócio. De acordo com o site, o custo para um cliente é de US$ 199 por mês (R$ 1089,35 no câmbio de 18/09) por sessões remotas ilimitadas.
Já o pagamento do músico é mais variável. Depende tanto de um acordo prévio quanto do custo de vida do local em que ele se encontra. No Brasil, por exemplo, a remuneração gira em torno de U$ 13 por sessão. Se um músico faz 20 sessões por semana consegue garantir um ganho de U$ 260 semanais, o que resulta em U$ 1040 mensais (R$ 5.693,09 no câmbio de 18/09).
Segundo um instrumentista contratado pela Musiversal que preferiu não se identificar, trata-se de um trabalho fixo para músicos “que geralmente não teriam essa oportunidade de ter alguma previsibilidade no fim do mês, o que é inegável pra maioria dos músicos ao redor do mundo”. Além disso, ele revela que a Musiversal “é uma empresa muito pequena, o trato pessoal existe, além de um respeito pelo trabalho dos músicos”. “Eventuais problemas pessoais e questões da vida prática que possam impedir o trabalho dos músicos são atendidos e existe uma noção clara de que os músicos são a força motora do trabalho ali”, afirmou, ressaltando a diferença entre outros trabalhadores por aplicativo, que quando adoecem ou deixam de trabalhar por alguma razão, não ganham.
A competição
Já com relação à competição com o mercado de gravação, nosso personagem oculto acredita não haver este problema. “É um serviço muito específico para produtores e artistas que querem um tipo de gravação rápida. Sempre vai existir espaço para produtores/artistas que querem gravar ao vivo com músicos e técnicos da sua rede pessoal e gastar tempo com questões minuciosas relacionadas ao som, técnicas de gravação entre outros, além de obter a qualidade sonora que grandes estúdios podem oferecer.”
No final das contas, segundo ele, “a Musiversal só veio para atender uma demanda mais imediata que já existia no mercado”.
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