Dar vida a Maria José, ou Zezé, surgiu de forma completamente inesperada para a atriz juiz-forana Pri Helena. “A história me trouxe desafios que iam além da interpretação. Quando recebi o convite para o teste, foi um momento inesperado. Lembro que a produtora de elenco, Letícia Navieira, encontrou uma cena minha em uma plataforma e, do nada, recebi a mensagem para participar do teste. Eu nem sabia que estava sendo considerada!”, conta ela.
Uma das personagens que acompanha a filha de Fernanda Montenegro, Fernanda Torres (Eunice Paiva, no filme) ao longo de quase toda a história, Zezé, empregada da casa, atua como um importante braço direito de Eunice e suas filhas no regime militar. A personagem é baseada na vida real, assim como Eunice.
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“O processo de construção foi imersivo e revolucionário. A Zezé é uma personagem que está ali, ao lado de Eunice Paiva, uma mulher que teve a vida atravessada pela ditadura assim como muitas outras. Ela é o apoio essencial para aquela família diante de todas as atrocidades que acometeram os Paivas”, ressalta.
A advogada e ativista Paiva dedicou sua vida à luta pelos direitos humanos, especialmente após a morte de seu marido, Rubens Paiva, durante a ditadura militar. Sua busca incansável por justiça e verdade se tornou um símbolo da resistência contra a opressão. Eunice também foi pioneira na defesa dos direitos indígenas e contribuiu ativamente para a elaboração da Constituição de 1988.
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Cinquenta anos após o desaparecimento de Rubens Paiva na ditadura, o Brasil revisita a história do ex-deputado em três frentes. No cinema, o filme 'Ainda Estou Aqui', lançado no dia 7 de novembro, retrata o impacto da perda na família de Paiva. Paralelamente, o governo reabriu a investigação sobre o caso, enquanto a busca por justiça segue sem um desfecho. A denúncia, apresentada há dez anos, encontra-se paralisada no Supremo Tribunal Federal, sob a relatoria do ministro Alexandre de Moraes. Três dos cinco militares acusados já faleceram, mas o processo permanece estagnado, sem perspectivas de avanço.
Essa inércia judicial está diretamente relacionada à controvérsia em torno da Lei da Anistia, que concede perdão tanto a perseguidos políticos quanto a agentes do Estado que cometeram crimes durante o governo militar. No cerne da questão está a possibilidade de punir crimes cometidos durante a ditadura e a disposição da sociedade em enfrentar esse passado violento. Este é o ponto central de 'Ainda Estou Aqui'. O filme, que mostra a luta de Eunice Paiva, interpretada por Fernanda Torres, para reconstruir sua vida após o desaparecimento do marido, reflete a necessidade de confrontar um período sombrio da nossa história.
“O nosso papel como cineasta, escritor, roteirista, pessoa das artes é falar aquilo que os vencidos não conseguem falar”, declarou Marcelo Rubens Paiva.
Sororidade
Para Helena, a figura de Zezé é um pilar na vida de Eunice. “É marcada pela sororidade entre essas duas mulheres. Zezé está lá, vivendo os impactos da ditadura ao lado da família Paiva. O apoio emocional e prático que ela oferece constrói uma parceria entre essas duas mulheres, ambas enfrentando a violência da época de formas diferentes”, revela a atriz, que também é diretora e roteirista, responsável por filmes como "Cyclone" e "Cadê minha filha, Bob?".
"Ainda Estou Aqui" é a adaptação cinematográfica da autobiografia de Marcelo Rubens Paiva, lançada em 2015. Com Fernanda Torres no papel principal, o filme conta a história de Eunice Paiva, vivida também por Fernanda Montenegro em outra fase da vida. Selton Mello completa o elenco principal.
Já com data de estreia no Brasil, em janeiro de 2025, o filme foi o principal destaque no 81º Festival de Cinema de Veneza, levando o Leão de Ouro, prêmio de Melhor Roteiro. “"Ainda Estou Aqui" vai trazer ainda mais visibilidade para o cinema brasileiro e também para todos os envolvidos nesse projeto”, comenta Pri Helena à Fórum.
“A repercussão internacional, a ovação de dez minutos, foram momentos que me marcaram profundamente. É o reconhecimento do cinema brasileiro e da nossa capacidade de contar histórias que transcendem as fronteiras”
Um marco na carreira
Com a estreia na novela das 19h da Globo e a participação na segunda temporada de "Os Outros", a atriz afirma que está vivendo um momento de grande ascensão profissional. Para alcançar esse patamar, ela destaca que precisou acreditar em seu potencial e contar com o reconhecimento e apoio de outras pessoas para que pudesse viver da arte.
“O que me impulsiona é a paixão por contar histórias. Desde pequena, o teatro me pegou, e quando subi no palco pela primeira vez, senti que era o meu lugar. Houve um momento em que percebi que atuar era mais do que um ofício, era uma necessidade de expressão”
A peça "O Triciclo", encenada em um festival de teatro que não existe mais em Juiz de Fora, foi um marco em sua vida, despertando uma nova percepção sobre si mesma. Mesmo com as dificuldades enfrentadas como artista, Pri Helena decidiu prosseguir.
Em busca de aprimorar seus conhecimentos, mudou-se para o Rio de Janeiro em 2017, onde estudou na Escola de Teatro Martins Penna e na Casa das Artes de Laranjeiras. Na cidade, co-fundou o Grilla, um coletivo feminista que explora a interface entre teatro e audiovisual. Foi através desse trabalho que foi descoberta por uma produtora de elenco de Walter Salles.
“Essa força teimosa que me faz levantar e continuar. A atuação é o que me faz sentir viva, e cada personagem que interpreto me ensina algo novo sobre a vida, sobre o mundo”
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