A cidade de Bonito, no Mato Grosso do Sul, se tornará o centro do cinema sul-americano com o Bonito CineSur até o dia 27 de julho, com a exibição de 42 filmes. A programação do festival inclui 20 longas brasileiros e 18 internacionais, com 30 desses filmes selecionados para as mostras competitivas. O evento traz uma agenda de exibições, atividades e homenagens.
O objetivo é trazer a riqueza do cinema sul-americano, além de denunciar a crise ambiental no país através de produções audiovisuais de impacto. A segunda edição do Bonito CineSur é uma realização da Associação Amigos do Cinema e da Cultura, em parceria com o Ministério da Cultura (Governo Federal), com a emenda parlamentar do deputado Vander Loubet. Conta com patrocínio do Banco do Brasil, Agência Nacional do Cinema (Ancine), Correios, Caixa Econômica Federal e apoio da Fundação de Turismo de Mato Grosso do Sul (FUNDTUR), Secretaria de Estado de Turismo, Esporte e Cultura (SETESC) - Governo do Mato Grosso do Sul.
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Em entrevista à Fórum, o diretor do evento, o produtor Nilson Rodrigues, diz que o Bonito CineSur se prepara para ser um marco na história do cinema sul-americano. De acordo com o idealizador, "o festival se propõe a ser um espaço de encontro da produção sul-americana, apresentando sua diversidade cinematográfica, possibilitando encontros de realizadores e discutindo caminhos para superar as barreiras que impendem de conhecermos o cinema e o audiovisual que é feito no nosso continente", afirma.
Para ele, o cinema e o audiovisual têm muitas obras que refletem e propõem discussões sobre as questões ambientais. “São diversos temas ambientais abordados países sul-americanos, que compõem um painel diversificado dos desafios do setor. E Bonito é um bom lugar pra termos a linguagem audiovisual somada ao urgente e necessário debate sobre a responsabilidade que todos devemos ter com o ambiente em que vivemos.”
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Cinema ativista
Jorge Bodanzky, cineasta que mostrou o Brasil escondido pela ditadura militar entre 1964 e 1985 em nove produções e que coleciona diversos longas voltados para a questão ambiental há 50 anos, está entre os homenageados da edição. À Fórum, ele reforçou a importância da abordagem do meio ambiente no cinema e ativismo no audiovisual.
“O meu cinema sempre foi um cinema ativista, utilizado por cineclubes, pastorais da igreja, movimentos de defesa da Amazônia, como um propósito de discussão política. E hoje, mais do que nunca, o audiovisual tem um objetivo ativista”
O último trabalho realizado por ele, intitulado ‘Amazônia Nova Minamata’, foi exibido no Festival de Bonito no ano passado. O filme aborda o envenenamento por mercúrio dos rios da Amazônia. Hoje, ele está desenvolvendo um projeto para exibir o filme em aldeias indígenas e parques nacionais afetados pelo envenenamento por mercúrio originado do garimpo.
O longa ‘O Terceiro Milênio’ é de 1980, referente ao período do regime militar, foi escolhido para ser exibido no festival este ano. O objetivo do filme era acompanhar a campanha eleitoral de um senador que se candidatou ao governo do estado do Amazonas na época. Embora o filme tenha uma abordagem política, a questão ambiental, embora não fosse o foco principal, já estava presente, segundo o cineasta.
“A questão ambiental não estava assim tão em primeiro plano como ela está hoje, mas ela era presente, porque os projetos de ocupação da Amazônia, desde a época do período militar praticamente até hoje, em princípio não mudaram, não levando em consideração o saber local, as populações locais, são projetos que vem de fora pra dentro. Estradas, queimadas, gado, madeira. Agora, a questão do garimpo, o mercúrio, todos esses modelos de desenvolvimento ou projetos de desenvolvimento implicam diretamente com a questão ambiental. Como o meu filme, desde o início, há 50 anos atrás, com Iracema, a gente abordou esses problemas, a questão ambiental estava presente. Não com esse nome, não se falava em meio ambiente, mas se falava em ocupação. O que é a mesma coisa”
Selva Trágica, longa estrelado pelo ator Reginaldo Faria e dirigido por seu irmão Roberto Farias (1932-2018), faz uma denúncia sobre o trabalho escravo em grandes propriedades rurais no Brasil e já foi exibido no CineSur. Além de seu papel no filme, o ator tem uma carreira extensa no cinema e na televisão, com participações em obras como Assalto ao Trem Pagador (1962), Pra Frente, Brasil (1982) e O Clone (2001), entre outras.
“Naquela época estávamos todos voltados para o recado que gostaríamos de passar com Selva Trágica. O mais impactante seria a luta contra a exploração do homem pelo homem. Os que trabalhavam na erva mate eram severamente castigados se tentassem fugir. O que recebiam não supria o valor de suas despesas. Isso ficou bem nítido e refletido na obra de Roberto Farias que, pelo tratamento primoroso através da fotografia em preto e branco, nos remetia também ao universo de Akira Kurozawa, embora com temas diferentes”, destaca Faria.
“Mas como em cinema existe essa porta para os criadores, por que não abri-la? Os festivais são o ponto de encontro, a troca de ideias e de valores culturais”
O festival é de suma importância, tendo em vista que o município de Bonito é conhecido por ser um dos pontos turísticos mais famosos do estado e ao mesmo tempo pela intensa atividade agropecuária que vem prejudicando rios da região. Uma matéria da Fórum mostrou que a devastação desenfreada do solo dá lugar à monocultura de soja e milho, colocando em risco a biodiversidade e os recursos hídricos da Serra da Bodoquena.
Uma grande presença de agrotóxicos foi encontrada pela Fundação Neotrópica do Brasil. Águas verde-azuis do Rio Formoso foram contaminadas com simazina, enquanto o Rio Verde apresentou vestígios desse mesmo herbicida. O Rio do Peixe, por sua vez, registrou a presença de tiametoxan. Em áreas urbanas, o Córrego Bonito, afluente do Rio Formoso, mostrou sinais de fipronil e carbendazim, destacando a disseminação dessas substâncias tóxicas em ambientes aquáticos cruciais para a região. Leia mais nesta reportagem da Fórum.