O município de Bonito, em Mato Grosso do Sul, ostenta o título de destino turístico mais famoso do estado. Mas, por trás do sucesso milionário, esconde-se uma realidade preocupante: a devastação desenfreada do solo para dar lugar à monocultura de soja e milho. Essa prática insustentável, além de colocar em risco a biodiversidade da região, também ameaça os frágeis recursos hídricos da Serra da Bodoquena, segundo informações do portal Campo Grande News.
Dados da Fundação Neotrópica do Brasil revelaram uma grande presença de agrotóxicos. Águas verde-azuis do Rio Formoso foram contaminadas com simazina, enquanto o Rio Verde apresentou vestígios desse mesmo herbicida. O Rio do Peixe, por sua vez, registrou a presença de tiametoxan. Em áreas urbanas, o Córrego Bonito, afluente do Rio Formoso, mostrou sinais de fipronil e carbendazim, destacando a disseminação dessas substâncias tóxicas em ambientes aquáticos cruciais para a região.
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O avanço da soja em Bonito é impulsionado pelo alto valor do grão no mercado internacional, o que o torna líder nas exportações de Mato Grosso do Sul, gerando US$ 2,3 bilhões apenas entre janeiro e junho deste ano. Parte dessa riqueza passa pelo município, mas a monocultura da soja também traz consigo sérios riscos ambientais.
A área plantada com soja no município disparou nos últimos anos, de acordo com dados do Sistema de Informação Geográfica do Agronegócio de Mato Grosso do Sul (Siga-MS). Na safra 2022/2023, a soja ocupou 70.430 hectares, um aumento significativo em relação à safra 2019/2020, quando a área era de 55.516 hectares. Esse crescimento representa um aumento de 27% em apenas três anos.
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Formoso: o rio mais disputado
Em contraste com os rios de leito seco, o Rio Formoso é um dos únicos leitos com águas abundantes (embora a pesca seja proibida) e correnteza forte entre a vegetação. No entanto, quando se trata dos impactos ambientais em Bonito, lidera em termos de exploração. Em fevereiro, a operação Carga Máxima distribuiu R$ 1 milhão em multas por irregularidades ambientais às margens do Formoso. As multas variaram desde um balneário superlotado até um morador que captava água do rio para consumo.
O que gera controvérsia é a disparidade nas penalidades. Enquanto as multas aplicadas aos pequenos negócios ainda estão em fase de debate administrativo, as sanções relacionadas ao caso mais alarmante de dano ambiental em Bonito, a lama que invadiu o Rio da Prata em 2018, foram anuladas pelo Poder Judiciário.
Foram arquivadas 12 ações que somavam R$ 16,8 milhões contra fazendas denunciadas por crimes ambientais em Bonito. Em vez disso, foi firmado um acordo de R$ 3,2 milhões entre o poder público e os fazendeiros, reduzindo o valor original em 80%. Desse montante, 56% serão pagos pelo governo estadual e pelas prefeituras, ou seja, com recursos públicos, de acordo com o portal.
Expansão imobiliária
O Ministério Público de Mato Grosso do Sul (MPMS) colocou um freio no "Sonho dos Lagos", como é divulgado o loteamento Solar dos Lagos I e II, em Bonito. O empreendimento, famoso por ostentar "lagos cristalinos e cachoeiras deslumbrantes", além de ter abrigado uma sucuri de seis metros, foi barrado até que a regularização ambiental seja concluída.
De acordo com a promotoria, o Solar dos Lagos descumpre a exigência de ter rede de esgoto, uma infraestrutura essencial para evitar a contaminação dos recursos hídricos da região. Diante da irregularidade, a prefeitura acatou a recomendação do MPMS e se absteve de autorizar a supressão de árvores, a emissão do guia para recolhimento do ITBI (Imposto sobre a Transmissão de Bens Imóveis) e a concessão de alvarás para construção nos empreendimentos.
Em nota oficial, a Terras Empreendimentos Imobiliários Spe 04 Ltda, responsável pelo Solar dos Lagos 2, declarou "não ter conhecimento da ação do Ministério Público" e afirmou que o loteamento "é absolutamente regular".
Nota da Prefeitura
A prefeitura foi questionada sobre o levantamento que detectou a presença de agrotóxicos, mas foi informada de que não há um sistema oficial de monitoramento por parte do poder público para acompanhar essa situação. Veja:
“Bonito ainda não possui uma metodologia ou uma rotina de monitoramento de agrotóxicos nos recursos hídricos do município como um todo. Como Bonito ainda não municipalizou o licenciamento, tudo que compreende a área rural é competência do Imasul, que tem o monitoramento nos atrativos e em alguns cursos d’água”.