GUERRA CULTURAL

Quem é Aleksandr Dugin, o Olavo de Carvalho de Putin

Além de influenciar a política externa da Rússia, o “Rasputin de Vladimir Putin” também serve de inspiração às lideranças neofascistas da Europa e EUA

Dugin, o Rasputin de Vladimir Putin.Créditos: Reprodução/ redes sociais
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O filósofo e teórico Aleksandr Dugin, apontado como "guru" do presidente russo Vladimir Putin, é o criador da Quarta Teoria Política, onde propõe a superação das teorias políticas da modernidade: o liberalismo, o comunismo e o fascismo. 

Filho de um ex-militar de alta patente da União Soviética (URSS), o trabalho teórico de Dugin é um encontro de Orientalismo, hermetismo, teologia e Relações Internacionais. Além da influência sobre o governo de Putin, as teses de Dugin também influenciam os partidos de extrema direita como o Vox (Espanha), Frente Nacional (França) e A Liga (Itália). 

A esquerda europeia e a oposição russa à Vladimir Putin classificam Dugin como o "Rasputin de Putin", em alusão ao místico russo que exerceu forte influência na dinastia Romanov, a última a controlar o Império russo que caiu para dar lugar a União Soviética. 

Guru do neofascismo 

A teoria de Dugin é tida como a principal base teórica dos movimentos contemporâneos que defendem o euro-asianismo em contraponto à hegemonia política e cultural imposta pelo Ocidente. 

Neste aspecto, as teses do teórico russo estão próximas das ideias defendidas pela extrema direita brasileira, principalmente a ala olavista, aquela que se inspira nos textos de Olavo de Carvalho: há uma guerra cultural em curso e o principal inimigo é o "globalismo" defendido pelos EUA. 

Por sua vez, o euro-asianismo defendido por Dugin está no centro da política internacional defendida por Vladimir Putin e é ela que justifica a atual guerra da Rússia contra a Ucrânia: retomar os territórios da "Grande Mãe Rússia" e estabelecer uma guerra cultural contra o Ocidente e, além disso, deixar que os povos e suas culturas locais determinem os seus modos de vidas. 

A proposta de Dugin coloca o povo no centro da história, e não o indivíduo ou o Estado. É neste neste contexto que entra a ideia do euro-asianismo e a Rússia, a partir de sua política de expansão como influência histórica do povo russo, aqui não importa se pertencentes a outros países: a zona de influência deve ser exercida pela Rússia.

Todavia, a ideia de um povo, sua cultura e sua autodeterminação para controlar a política e sua identidade está no centro das teses neoliberais de Hayek: ao Estado cabe apenas regular a economia, às tradições cuidar de todo o resto, como educação, cultura e saúde. 

Ainda que Dugin coloque a sua tese em confronto com o “globalismo”, ela vai ao encontro da raiz neoliberal e dos agrupamentos neofascistas. Um estudo da Fundação Rosa Luxemburgo aponta para este cruzamento teórico. 

Os assessores do Putin podem negar, mas, como se vê, as teses de Dugin estão no DNA da política internacional do governo de Vladimir Putin. Mas a esfera de influência do teórico vai além do território russo e chega até o Brasil. 

 

O Rasputin de Vladimir Putin desembarca no Brasil 


O nome de Aleksandr Dugin pode ser estranho aos ouvidos da maioria dos brasileiros, mas ele já circula em alguns espaços acadêmicos do país e até centro de estudos sobre as suas teorias já estiveram em atividade. 

Em entrevista à Folha em 2014, Dugin afirmou que a Ucrânia é "Estado criado artificialmente". À época, ele esteve no Brasil para participar de um seminário sobre o filósofo Julius Evola (1898-1974), que é considerado um dos teóricos do neofascismo italiano. 

A filósofa Flávia Virgínia, que é filha do cantor Djavan, comandava o Centro de Estudo da Multipolaridade, espaço que era destinado a estudar e a discutir outra tese de Dugin, a da Multipolaridade: é preciso criar polos alternativos de poder no Mundo para além do Ocidente.  Atualmente o centro está desativado.  

Há outras organizações no Brasil que inspiram nas teses de Dugin: uma delas é a Nova Resistência (NR), criada em 2015 no Rio de Janeiro e que reúne cerca de 250 militantes em grupos espalhados pelo Brasil.

 

O Povo contra o liberalismo? 


Alekansdr Dugin acredita em uma aliança entre os países europeus para  a construção de um "populismo total" que destrua o liberalismo e se afaste do nacionalismo xenófobo e racista. 

Ainda que os seguidores e estudiosos da obra de Aleksandr Dugin digam que ele não é um extremista, mas um conservador que defende as "tradições do povo", as suas teses são a base do discurso da extrema direita de toda a Europa. 

Além disso, o livro "Patriotas Indignados" (Alizanza Editorial, 2019) revela que Aleksandr Dugin manteve estreitas relações com o partido neofascista da Hungria Jobbik e com Nikos Michalokiakos, fundador do partido neonazista Aurora Dourada na Grécia. 


A Teoria da Multipolaridade 

 

Provavelmente a Tese da Multipolaridade seja aquela que mais encontra ressonância na extrema direita brasileira e na estadunidense. Não à toa, Dugin ficou feliz quando Donald Trump venceu as eleições em 2016 e classificou tal fato como um dos principais momentos da história recente. 

Para Dugin e seu séquito, a chegada de Trump e sua trupe neofascista ao poder era o início de um novo tempo, mas que tempo novo é esse? 

O século XXI, segundo a multipolaridade defendida por Dugin, é aquele que será marcado pelo fim da hegemonia cultural do Ocidente (representada pelo liberalismo dos Estado Unidos e União Europeia), mas quem e o que vai ocupar o lugar do “globalismo”? É aqui que entra a Rússía e a política internacional de Putin com inspiração nas teses de Dugin: expansão, mas sem impor a cultura aos povos, estes se autodeterminam, ainda que influenciados pelo poder da “Mãe Rússia”. 

Por fim, as teses de Aleksandr Dugin são uma grande colcha de retalho que envolve orientalismo, nacionalismo e autodeterminação dos povos, mas, quando tais teorias colocam que o Estado deve ser superado e em seu lugar “o povo” deve estar na condução do todo, fica claro que faltam partes e, até este momento, todos os grupos políticos que têm adotado as teses de Dugin são de cunho neofascista e que defende um Estado liberal, racista e controlador.