INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL

Livros escritos por ChatGPT circulam na Amazon brasileira, aponta pesquisa

Mais de 50 obras criadas com uso da Inteligência Artificial foram identificadas na plataforma

Amazon brasileira vende livros produzidos por Inteligência Artificial.Créditos: Pixabay
Escrito en TECNOLOGIA el

Uma pesquisa, realizada pelo Núcleo Jornalismo, descobriu dezenas de livros escritos pela Inteligência Artificial (IA) do ChatGPT sendo vendidos na Amazon brasileira. Entre produções físicas e digitais, o cenário evidencia o começo da era de coautoria entre IA e humanos, e o risco de um “spam literário” na plataforma de venda.

Segundo apuração, foram identificados: 

  • 59 livros produzidos pelo chat da OpenIA;
  • Desse total, 52 informam o uso da IA para gerar o texto e colocam a coautoria com  “Inteligência Artificial” ou “ChatGPT”;
  • 3 produções foram atribuídos ao MidJourney, uma IA de produção de imagens;
  • 4 não informaram o uso, mas foram descobertos através de checagem no Youtube.

Dentre os temas, estão livros infantis, autoajuda, ficção e até imitações de autores renomados. Alguns livros têm como conteúdo a metanarrativa, onde o ChatGPT investiga sua própria natureza. 

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Debate

Em julho deste ano, empresas que lideram o desenvolvimento da Inteligência Artificial, como a Amazon, assinaram um termo de compromisso com a Casa Branca dos Estados Unidos. Nele, prometeram usar a tecnologia de forma responsável. 

Dentre as normas do acordo, ficou determinado o uso de uma marca d’água para informar aos usuários quando o conteúdo das plataformas foi gerado pela IA.

Método de investigação

Para descobrir a aplicação da Inteligência Artificial na produção literária, o Núcleo analisou seções de autoria e coautoria, e referências indiretas através de autores que documentam o processo de criação da publicação gerada por IA.

Outro método usado foi a pesquisa de tutoriais no YouTube e TikTok que ensinam o processo de criação de livros físicos e digitais com ferramentas de Inteligência Artificial. O foco da produção é a venda dos textos em plataformas de comércio eletrônico, como a própria Amazon.

Muitos desses vídeos continham conteúdo duvidoso como expectativa de renda. Segundo o Núcleo, algumas pessoas afirmam ser capazes de gerar uma renda de até R$ 1.500 por hora com a criação de e-books com IA.

Também há vídeos com entusiastas da tecnologia, que demonstram experimentos com ChatGPT e MidJourney. Como exemplo, a pesquisa destaca o vídeo do canal Wesley Paulino, que postou um vídeo criando a obra “Deusa da Floresta”, atualmente à venda na Amazon. O autor não informa o uso da IA na produção da obra. 

Através disso, a pesquisa também descobriu a origem do livro “O Caminho da Abundância: 10 Segredos Bíblicos para a Independência Financeira”, do canal Dinheiro Com Você — Por William Ribeiro.

Perigos 

Algumas situações alertam para o uso não regulamentado da Inteligência Artificial na produção de livros. Recentemente, a empresa brasileira Novo Século enfrentou uma polêmica por não avisar que a capa de uma edição de Alice no País das Maravilhas usou arte criada com IA.

Já no exterior, o New York Times denunciou que a Amazon está sofrendo uma inundação de guias turísticos falsos que dão dicas genéricas e potencialmente perigosas

Em junho de 2023, a revista The Atlantic alertou que livros de colorir, stickers, canecas e camisetas feitos por IA estão criando uma onda de spam no Etsy. A plataforma foi criada para vender artesanatos e peças originais.

Segundo o Núcleo, os livros de colorir devem ser a principal tendência nesta técnica de criação de conteúdo através do uso da Inteligência Artificial. A plataforma observou 46 novos livros desse tipo em 30 dias na Amazon. Porém, não há identificação da IA na produção, então não foram contabilizados na pesquisa.

Em outro caso, a Amazon resolveu remover livros suspeitos de usar a IA para desenvolver uma escrita parecida com a autora americana Jane Friedman.

No Brasil

Na Amazon brasileira, o Núcleo encontrou um livro escrito de forma parecida ao estilo de Clarice Lispector. A obra é vendida a R$ 5,99 e disponibilizada gratuitamente no Kindle Unlimited, um serviço de assinatura de e-books da plataforma.

Outra preocupação, compartilhada por autores influentes, são os spams. Alguns afirmam que o volume de livros gerados por IA está causando uma pressão sobre a Amazon, principalmente para autores independentes.  

Esses conteúdos, segundo os autores, se transformam em uma “fazenda de cliques” (click farm, no inglês). O termo se refere à produção em massa e questionável de conteúdo artificial para aumentar a audiência. 

Estados Unidos

Nos dias 26 e 27 de junho, a seção de romances adultos na Amazon estadunidense sofreu uma inundação de obras geradas por IA. Em pouco tempo, a lista de mais vendidos foi preenchida por dezenas desses títulos. 

A empresa respondeu retirando alguns dos títulos do ranking. Porém, na seção de tecnologia da VICE, empresa de mídia digital, eles continuaram à venda, segundo o Motherboard.  

Em resposta ao Motherboard, um porta-voz da Amazon afirmou que, além de possuir diretrizes claras de conteúdo, a empresa também investiga qualquer preocupação levantada e “investe consideravelmente” em recursos para garantir uma experiência de compra confiável, protegendo tanto clientes quanto autores de potenciais abusos.

Posicionamento da Amazon

Sem compartilhar as diretrizes específicas, a dúvida sobre como o problema será tratado e como consumidores serão orientados permanece. Também não há uma resposta se os livros criados com IA continuarão nas plataformas e se os criadores devem comunicar abertamente que a obra foi gerada pela tecnologia. 

Em resposta ao Núcleo, a Amazon Brasil comunicou que, no que se refere ao uso da plataforma de publicação Kindle Direct Publishing, “todos os livros na Amazon.com.br devem seguir nossas diretrizes de conteúdo, incluindo a conformidade com os direitos de propriedade intelectual e todas as outras leis aplicáveis”.

Sobre denúncia, não há informações sobre como os usuários podem reportar queixas. Para os consumidores que adquirirem tais livros, a política de reembolso permanece sem esclarecimentos.

*Com informações da Núcleo Jornalismo