Em dezembro de 2023, o presidente Lula (PT) sancionou a lei que torna o dia 20 de novembro, em que se celebra o Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra, um feriado em todo o Brasil. A data visa exaltar a luta contra o racismo, bem como a contribuição da população negra na construção do país.
No entanto, alguns setores da sociedade brasileira insistem em não reconhecer a necessidade de uma série de reparações históricas com a população negra brasileira e, dessa maneira, negam que haja racismo no Brasil. Este é o caso do prefeito de Dilermando de Aguiar, Claiton Ilha (MDB), que baixou um decreto cancelando o feriado do Dia da Consciência Negra.
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Como justificativa, o prefeito Claiton Ilha argumentou que a data é discriminatória por colocar no centro da discussão a questão racial. Também afirmou que as ações políticas devem focar no combate à pobreza, sem distinção entre brancos e negros.
"Se nós começarmos a discutir a cor, nós vamos estar discriminando também. Nós temos que dar condições a todos [...] Eu não vejo racismo em Dilermando de Aguiar, não vejo mesmo, tanto que não temos nenhum crime racial em Dilermando de Aguiar. Mas nós temos muitos pobres, e é para os pobres que a gente deve trabalhar, independente da cor [...] A gente pensou nisso; se nós pensamos errado, não sei, a gente está aqui para se desculpar", declarou o prefeito Claiton Ilha.
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O argumento utilizado pelo prefeito de Dilermando de Aguiar é um clássico discurso usado no Brasil desde os primeiros anos da República, no qual setores negam que haja um problema racial no país e afirmam que a pobreza atinge a todos por igual. Essa tese foi derrubada por uma série de estudos ao longo do século XX e no começo do século XXI.
Justiça mantém feriado da Consciência Negra
A juíza titular da Comarca de São Pedro do Sul, Walkyria Cabral, revogou a decisão do prefeito de Dilermando de Aguiar, que havia baixado um decreto cancelando o feriado da Consciência Negra, determinando que a data fosse mantida nesta quarta-feira (20).
O prefeito Claiton Ilha havia transferido a celebração do Dia Nacional de Zumbi dos Palmares e da Consciência Negra para 23 de dezembro.
Em sua decisão, a magistrada declarou: “Não cabe ao gestor municipal, por meio de decreto, alterar a data de um feriado nacional estabelecido em lei federal, sob pena de violação ao princípio da hierarquia das normas e da repartição constitucional de competências… A transferência do feriado para data próxima ao Natal (23/12) esvazia por completo o significado histórico e social da data comemorativa, que visa justamente promover a reflexão sobre a consciência negra e o combate ao racismo estrutural ainda presente em nossa sociedade.”
A juíza também rebateu a afirmação do prefeito de que não há racismo em Dilermando de Aguiar: “As declarações do prefeito municipal à imprensa, negando a existência de racismo no município, apenas reforçam a importância de se manter a data comemorativa em seu dia próprio, como forma de conscientização e educação sobre as questões raciais.”
Dessa maneira, a juíza Walkyria Cabral afirmou que o prefeito Claiton Ilha reproduz o mito da democracia racial: “Ao afirmar que ‘não vê racismo’ em seu município e tentar reduzir a questão racial a uma dimensão meramente econômica (‘temos muitos pobres’), o prefeito reproduz o mito da democracia racial e ignora que o racismo se manifesta de formas muito mais sutis e enraizadas do que apenas através de crimes raciais explícitos.”
A juíza continua: “Tal postura, vinda justamente de um gestor público, apenas reforça a necessidade de manutenção de datas como o Dia da Consciência Negra, que servem justamente para promover a reflexão, o debate e a conscientização sobre as diversas faces do racismo e a importância de seu enfrentamento por toda a sociedade.”
Por fim, a magistrada concluiu: “O perigo de dano, por sua vez, é evidente e atual, considerando que o feriado está previsto para amanhã, dia 20 de novembro. A não concessão da tutela de urgência esvaziaria por completo a finalidade da data comemorativa neste ano.”